Vincent Cain não estava tendo um dia bom. O tipo de dia em que tudo o que podia dar errado, dava. Duas cargas atrasadas. Uma família rival avançando em seu território. Seu tenente de maior confiança questionando suas decisões. Ele precisava de ar.
Por isso, fez algo que raramente fazia: caminhou sozinho. Sem guarda-costas, sem motorista. Apenas Vincent Cain nas ruas desertas do distrito dos armazéns às 23h. O ar frio da noite atingia seu rosto.
Então, ele ouviu. Um som fraco, desesperado.
Ruídos de alguém lutando para respirar.
Vincent parou, seus instintos entrando em alerta máximo. Cada nervo em seu corpo lhe dizia para continuar andando. Ele construiu seu império sobre uma regra: nunca se envolva com a polícia. Policiais significavam problemas, perguntas, investigações.
Mas o som ficou mais fraco. Ele virou a esquina de um beco estreito.
Foi quando a viu.
Uma mulher em uniforme policial, caída contra uma lixeira como uma boneca de pano descartada. Seu rosto estava pálido demais. Uma poça de sangue se formava sob ela. Ela havia sido espancada, e sua mão estava pressionada fracamente contra o lado do corpo, onde o sangue escapava por entre os dedos.
Vincent deveria ir embora. Policiais morriam o tempo todo nesta cidade. Não era problema dele.
Mas algo sobre como ela parecia, tão quebrada e sozinha, o fez hesitar.
Os olhos da mulher se agitaram. Seus lábios se moveram. “Ajuda…”
A palavra saiu como um sussurro. A cabeça dela se inclinou em direção a ele e, por uma fração de segundo, seus olhos se encontraram. Ela não estava implorando; havia uma aceitação em seu olhar, como se soubesse que estava morrendo.
E, de alguma forma, isso tornou tudo pior.
Vincent amaldiçoou baixinho. Ele se ajoelhou ao lado dela, seus sapatos caros mergulhando no sangue dela.
“Ei,” disse Vincent, com a voz rouca. “Consegue me ouvir?”
Os olhos da mulher se arregalaram. O medo brilhou em seu rosto quando ela o reconheceu. Mesmo meio morta, ela sabia quem ele era. Vincent Cain, o chefe da família Cain, o homem que a polícia tentava prender há anos.
“Não,” ela engasgou, tentando se afastar. Sua mão procurou seu coldre vazio.
“Relaxe,” disse Vincent bruscamente. “Não estou aqui para terminar o serviço.”
“Você… Você é Vincent Cain.”
“Sim,” ele rosnou. “E você está morrendo. Então, a menos que queira que seus últimos momentos sejam sangrando em um beco, vai me deixar ajudar.”
Ela tentou balançar a cabeça, mas o movimento a fez gemer. Sangue borbulhou no canto de sua boca. “Não posso… confiar em você.”
Vincent riu amargamente. “Senhorita, se eu quisesse você morta, você já estaria. Tenho coisas melhores a fazer.” Ele pressionou a mão sobre a dela, aplicando pressão na ferida.
“Quem fez isso com você?” Vincent exigiu.
Seus olhos se encheram de lágrimas, mas não de dor. De algo mais sombrio. “Meu… meu próprio parceiro.”

As palavras atingiram Vincent como um soco.
“Armadilha,” ela sussurrou, sua voz falhando. “Policiais corruptos… eu estava investigando… eles descobriram. Tentaram me silenciar.”
A mente de Vincent disparou. Uma policial investigando corrupção, traída pelos seus, deixada para morrer.
“Quantos?” Vincent perguntou urgentemente.
Ela tentou responder, mas seus olhos começaram a revirar.
“Não.” Vincent segurou o rosto dela. “Fique comigo. Você não vai morrer ainda.”
Seus lábios se moveram, mas nenhum som saiu. Ela estava se apagando.
Vincent fechou os olhos. Pensou em todas as razões pelas quais deveria ir embora. E então, pensou em algo mais. Sua irmã mais nova, Isabella, morta aos 19 anos porque policiais corruptos no bolso de alguém fecharam os olhos para os traficantes que venderam a droga que a matou.
Os olhos de Vincent se abriram, uma fúria queimando através dele.
Ele a pegou nos braços. Ela estava leve demais.
“Você não vai morrer esta noite,” disse Vincent, com os dentes cerrados. “Não assim.”
Ele a carregou para fora do beco. Ele não podia levá-la a um hospital. Muitas perguntas. Mas ele conhecia alguém – um médico que lhe devia favores.
Enquanto ele se movia pelas ruas, a mão da mulher de repente agarrou sua jaqueta. Seus olhos se abriram uma última vez. “Por quê?” ela sussurrou.
“Porque alguém deveria ter ajudado minha irmã,” disse Vincent, sombrio. “E ninguém ajudou.”
A casa segura na Quinta Avenida parecia um armazém abandonado por fora, mas por dentro era uma instalação médica de última geração. Marcus, seu tenente, estava andando de um lado para o outro.
“Chefe, o que diabos… é uma policial!”
“Ela está morrendo,” Vincent retrucou. “Dr. Chin, conserte-a. Agora.”
O Dr. Chin, um homem mais velho cujas dívidas de jogo Vincent havia pago, foi trabalhar. “Três costelas quebradas, pulmão perfurado, hemorragia interna,” murmurou o médico. “Ela tem sorte de estar viva.”
Horas depois, ela acordou. Confusão, depois pânico, depois raiva.
“Onde estou? Você! Vincent Cain!”
“Seus colegas a deixaram para morrer,” disse Vincent, sem rodeios. “E eu não gosto de ver execuções em becos. Mesmo de policiais.”
Seu rosto empalideceu com a memória. “Meu parceiro… Rodriguez. Ele… ele atirou em mim. Disse que eu deveria ter cuidado da minha própria vida.”
“O que você estava investigando?”
“Corrupção. Propinas. Evidências de policiais recebendo dinheiro de traficantes… de pessoas como você.”
“E você chegou perto demais,” concluiu Vincent.
Ela assentiu. “Eu tinha nomes, datas, registros de transações. Eu ia entregar tudo.”
“Então, o que agora?” ela perguntou, exausta. “Vai me usar como refém? Me matar antes que eu possa falar?”
Vincent se inclinou para mais perto, sua voz intensa. “Agora, você se cura. Você recupera suas forças. E então, você e eu… vamos derrubar todos os policiais corruptos desta cidade. Juntos.”
Ela riu, um som amargo e doloroso. “Você é louco. Você é um criminoso. Eu sou uma policial. Estamos em lados opostos.”
“Estamos?” Vincent desafiou. “Porque de onde estou, o seu lado tentou te matar e o meu lado salvou sua vida. Então talvez seja hora de parar de pensar em lados e começar a pensar no que é certo.”
Ela o estudou, o conflito claro em seu rosto. “Meu nome é Sarah. Detetive Sarah Martinez.”
“Bom, Detetive Martinez,” disse Vincent. “Bem-vinda ao único lugar na cidade onde os policiais corruptos não podem tocar em você.”
Três dias depois, Sarah estava mais forte. As notícias da polícia eram frias: “Detetive Sarah Martinez, desaparecida, presumida morta.” Caso encerrado.
“Eles nem estão me procurando,” disse ela, amargamente.
Foi quando Marcus invadiu a sala, pálido. “Chefe, temos um problema. Estamos cercados.”
Não eram apenas os capangas de Rodriguez. Eram vinte viaturas. Quarenta policiais.
“Eles vão invadir,” disse Sarah, seu sangue gelando. “Matar todo mundo e culpar um tiroteio.”
Vincent pegou um megafone e subiu em uma passarela, visível para todos. Sarah, hesitante, foi ao seu lado.
“Meu nome é Vincent Cain!” ele gritou. “E estou aqui para expor o maior escândalo de corrupção da história desta cidade! Todo policial aí embaixo, pergunte-se: você sabe com quem está trabalhando?”
Ele ergueu um pen drive. “Isto contém prova! Registros bancários, gravações de 15 policiais recebendo propina. Incluindo o homem dando ordens a vocês agora, Tenente Rodriguez!”
O caos se instalou entre os policiais. Foi quando a Capitã Helen Morrison abriu caminho. 28 anos na força, uma reputação de ser incorruptível.
“Martinez,” disse ela, chocada ao vê-la. “Você está viva.”
“Sim, senhora,” gritou Sarah, sua voz ganhando força. “E tudo o que Cain disse é verdade. Rodriguez e seis outros tentaram me executar três dias atrás porque descobri que eles estavam recebendo dinheiro de criminosos.”
O rosto de Rodriguez ficou vermelho. “Ela está mentindo! É uma armadilha!”
Morrison não hesitou. “Assuntos Internos, prendam Rodriguez e sua unidade. Agora!”
Um dos policiais corruptos entrou em pânico e atirou. O caos explodiu. Tiros ecoaram. Vincent puxou Sarah de volta para a segurança do armazém.
Quando a poeira baixou, os policiais corruptos estavam algemados. Morrison chamou o FBI.
A agente Torres, do FBI, assumiu o comando. “Sr. Cain, Sra. Martinez. Precisaremos de tudo o que têm.”
Sarah entregou seu próprio dossiê, que os homens de Vincent haviam recuperado de seu apartamento. “Três anos de trabalho,” disse ela.
“Vamos proteger vocês,” garantiu Torres. “Ninguém toca em vocês.”
Enquanto Rodriguez era levado, gritando ameaças, Sarah sentiu algo que não sentia há anos. Esperança.
Ela olhou para Vincent. “Obrigada,” ela disse baixinho.
“Ainda não agradeça,” respondeu ele. “As pessoas no topo, as que Rodriguez estava protegendo… elas não vão cair em silêncio.”
Três semanas depois, a cidade explodiu. Quinze policiais presos. Três vereadores indiciados. Dois juízes enfrentando acusações federais. A cidade estava sendo limpa.
Sarah, agora promovida a Tenente Martinez, saiu da delegacia. Vincent estava esperando, encostado em seu carro.
“Você veio,” disse ela, surpresa.
“Descobri que devia a você um adeus apropriado.”
“O que agora?” ela perguntou. “Voltando ao seu império?”
Vincent sorriu sem humor. “Na verdade, estou me aposentando. Acontece que expor a corrupção é péssimo para os negócios. E, honestamente, estou cansado.”
“Para onde você vai?”
“Algo diferente. Algo que não envolva balas e traição.”
Sarah o estudou. “Cain…”
“Michael,” ele a corrigiu suavemente. “Meu nome verdadeiro é Michael Grant. Se vou recomeçar, devo começar com a verdade.”
Ela estendeu a mão. “Então, adeus, Michael Grant. E obrigada.”
Ele apertou a mão dela, mas a puxou para um abraço inesperado. Breve, mas genuíno. “Cuide-se, Sarah. Faça esta cidade valer a pena.”
Ela o observou ir embora. Um criminoso que se tornou um aliado. Um inimigo que se tornou um amigo.
Em algum lugar do outro lado da cidade, Michael Grant olhava para o império que estava desmantelando, uma foto de sua irmã Isabella sobre a mesa.
A justiça nem sempre vem do sistema. Às vezes, ela vem de pessoas corajosas o suficiente para lutar por ela, independentemente do lado da lei em que estejam.