O Estranho na Selva: Como Um Homem Salvou um Menino à Beira da Morte

O vento cortava o cânion como uma faca, uivando através das rochas vermelhas e pinheiros de pinhão do norte do Arizona. A neve caíra mais pesada do que o habitual naquele fevereiro, cobrindo o deserto com um silêncio mais adequado a cemitérios do que a seres vivos. Coyotes se mantinham em suas tocas. Até os pássaros haviam silenciado.

Boon Mallister estava acostumado ao silêncio. Ele vivia sozinho há quase uma década, desde a guerra, a febre e todas as coisas que ele nunca falava. Ele tinha seu rebanho, seu cachorro Rufus e a estrutura teimosa que chamava de casa, uma cabana de dois cômodos com um fogão enferrujado e paredes improvisadas. Não precisava de mais nada, nem de ninguém. Isso era o que ele se dizia.

Mas na manhã do dia mais frio do ano, enquanto Boon preparava sua mula para uma viagem à cidade, ele viu algo estranho perto da cerca de sua casa. Inicialmente, pensou que fosse um fardo de pele de animal levado pelo vento. Mas não se movia como tecido. Estava muito imóvel, muito moldado. Boon apertou os olhos, desceu da varanda e caminhou pela neve, seus passos estalando sobre o gelo.

Não era um fardo. Era uma criança. Um menino não mais velho do que dez ou onze anos, enrolado em uma bola apertada. Suas roupas estavam rasgadas e finas, seus pés descalços e roxos de frio, sua pele bronzeada, seus cabelos negros e emaranhados, e seus lábios mal se moviam. Boon caiu de joelhos, afastando a neve do rosto do menino.

“Ei,” disse ele, com voz rouca. “Você está vivo?”

O menino se mexeu. Suas pálpebras se abriram. Ele olhou para cima não com medo, mas com algo bem pior: resignação.

“Por favor,” sussurrou o menino, com voz rouca. “Por favor, não deixe eu morrer aqui fora. Eu posso ser um bom filho para você.”

Essas palavras acertaram Boon como uma bala no peito. Ele não hesitou. Pegou o menino nos braços, mais leve que um saco de aveia, e o carregou para dentro da cabana. Boon alimentou o fogo até que ele rugisse, então embrulhou o menino com todos os cobertores que possuía. Ele não fez perguntas de imediato, não pressionou, apenas aqueceu o caldo sobre o fogo e ficou perto do menino até que a cor começasse a voltar às suas bochechas.

O menino tremeu violentamente por horas antes de finalmente adormecer, enrolado na cama velha de Boon, com Rufus observando da esquina com olhos cautelosos. Quando o menino acordou, estava escuro do lado de fora. A neve ainda caía em finas cortinas.

Boon lhe deu uma xícara de água morna. O menino bebeu com mãos trêmulas.

“Nome?” Boon perguntou.

O menino olhou para cima, cauteloso.

“Tomas,” disse ele. “Tomas Gray.”

Boon assentiu com a cabeça.

“Você é Apache?” Tomas hesitou antes de acenar com a cabeça.

“Minha mãe era.”

Boon não pressionou. Em vez disso, perguntou: “Onde está sua família?”

Tomas olhou para baixo.

“Eles se foram.”

“Todos eles?”

O menino acenou com a cabeça, os olhos se enchendo de lágrimas.

“Tentamos cruzar a trilha alta depois das chuvas. Minha mãe disse que tínhamos que continuar, mas minha irmã ficou doente. Depois meu tio foi embora. Depois minha mãe…” Ele não terminou.

A mandíbula de Boon se contraiu.

“E seu pai?”

Tomas olhou fixo para ele.

“Não tenho pai. Nunca tive.”

Boon resmungou, recostando-se. Foi a primeira vez em muito tempo que ele não soube o que dizer.

Nos dias seguintes, uma rotina estranha se estabeleceu para Boon. Ele estava acostumado com o silêncio, com a solidão. Acordava antes do amanhecer, alimentava os animais, consertava cercas sozinho, depois comia no escuro, com apenas Rufus como companhia. Mas agora havia Tomas. O menino o seguia por toda parte, ajudava a cortar lenha, carregava baldes, alimentava as galinhas. Ele não falava muito, mas quando o fazia, sempre com respeito, sua voz suave e observadora.

Boon notou que Tomas andava com uma leve coxeadura.

“Está machucado?” ele perguntou.

Uma noite, Tomas deu de ombros.

“Só de dormir nas pedras por muito tempo.”

Boon não perguntou mais. Mas naquela noite, ele colocou um cobertor extra na cama e colocou uma bota gasta perto da lareira para Tomas encontrar. Tomas não disse “obrigado”, mas Boon viu o sorriso de Tomas quando ele pensou que ninguém estava olhando.

No quinto dia, Boon preparou sua mula novamente. A neve havia diminuído. Os suprimentos estavam baixos.

“Vou à cidade,” ele disse.

Tomas olhou da lareira. “Posso ir?”

Boon balançou a cabeça. “Muito longe, muito frio, e você não está pronto.”

O rosto do menino caiu, mas ele não discutiu.

Boon hesitou.

“Eu trago algo para você.”

“O quê?”

Boon apenas olhou para ele.

“Você verá.”

Dois dias depois, Boon voltou com café, farinha, sal e um pequeno pacote embrulhado em papel pardo. Ele entregou para Tomas sem dizer uma palavra. Dentro estava uma camisa de lã simples, pequena e costurada de forma rude. Não era muito, mas para Tomas era como se fosse ouro. Ele a vestiu imediatamente, seu sorriso largo e completo.

“Serve,” sussurrou ele.

Boon resmungou.

“Não é perfeita, mas vai te manter aquecido.”

Tomas ficou em pé, com os ombros mais retos do que Boon jamais os viu.

“Obrigado,” disse ele suavemente.

Boon assentiu. “Não mencione isso.”

Naquela noite, Tomas ficou ao lado do fogo muito depois de Boon ter ido dormir. Ele olhava as chamas, passando os dedos sobre o tecido da camisa. Não era o calor que o comovia, mas o que aquilo representava. Ele estava visto, reconhecido, cuidado. Ele se deitou na cama e sussurrou para o teto: “Eu posso ser bom. Eu prometo. Só me deixe ficar.”

Lá fora, o vento havia acalmado. O deserto dormia sob seu manto congelado e, na pequena cabana, pela primeira vez em anos, tanto o homem quanto o menino sonhavam com algo novo.

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