Novembro de 1944, A Cordilheira dos Apeninos, Itália. Do seu posto de observação fortificado, o major alemão Rudolp Krammer observava, através da névoa gelada os movimentos de uma nova divisão inimiga. Brasileiros, seu oficial de inteligência, havia relatado, com um tom que mal escondia o desprezo.
Tropas tropicais, músicos e dançarinos de carnaval brincando de ser soldados. Krammer, um veterano endurecido pela Frente Oriental, ajustou o foco de seus binóculos. Eram os homens da força expedicionária brasileira, a FEBE, a única nação sul-americana a enviar tropas para a Europa. Uma curiosidade exótica enviada para atacar a posição defensiva mais temida e impenetrável da Alemanha em toda a Itália, a linha gótica.

A propaganda da Vermart havia preparado os soldados alemães para esperar uma piada. As teorias raciais nazistas que formavam o alicerce de sua visão de mundo, declaravam que povos de raças mistas, como os brasileiros, eram inerentemente inferiores em combate. Faltava-lhes a disciplina pruciana, a resiliência ariana e a coragem necessária para um combate sustentado.
O que o major Kamer não sabia, o que nenhum alemão naquelas montanhas poderia imaginar, era que aqueles homens marchando em sua direção haviam enfrentado desafios únicos. Eles haviam superado o complexo de viralata de sua própria nação, treinado com recursos limitados e agora serviam sob o peso de uma descrença quase universal.
Eles carregavam um fardo mais pesado que suas mochilas. o peso de provar que uma nação inteira não era o que o mundo pensava que era. Em poucas semanas, o major Kamer enviaria uma mensagem urgente ao quartel general do marechal de campo Kesselring. Uma mensagem que forçaria o Alando alemão a reavaliar tudo o que acreditavam sobre aqueles soldados do outro lado do mundo.
Os alemães zombaram da chegada dos brasileiros, mas a zombaria morreria congelada nas encostas de Monte Castelo. Esta é a história de como os pracinhas brasileiros, os café com leite do fronte italiano, se transformaram de objeto de piada no martelo obstinado que ajudou a quebrar a espinha dorsal da defesa alemã.
Se você não quer perder histórias como esta que a história oficial muitas vezes esquece, inscreva-se no canal. Ajude-nos a mudar isso. A força expedicionária brasileira foi ativada em meio a um turbilhão de ceticismo. No cenário global, o Brasil era visto como um gigante adormecido, conhecido por café e carnaval, não por proesas militares.
A decisão do presidente Getúlio Vargas de se juntar aos aliados e enviar tropas foi vista por muitos, inclusive dentro do próprio Brasil, como um delírio perigoso. A divisão era um retrato fiel do Brasil, composta por jovens brancos, negros e mestiços vindos de todos os cantos do país, do gaúcho do sul ao sertanejo do Nordeste.
Mas essa diversidade, que era a força cultural do Brasil, era vista como uma fraqueza militar pelos ideólogos nazistas. Um relatório da inteligência alemã de outubro de 1944 afirmava: “A unidade brasileira é composta por elementos racialmente mistos e de moral duvidosa. Espera-se que eles demonstrem pouca eficácia em combate, especialmente em condições adversas.
O treinamento no Brasil foi apressado e inadequado para o tipo de guerra que os esperava. Os pracinhas treinaram sob o sol do Rio de Janeiro para lutar no inverno mais rigoroso da Europa em 50 anos. Receberam uniformes e equipamentos americanos, mas muitos nunca haviam visto neve na vida. O general Mascarenhas de Morais, comandante da FEB, escreveu em seu diário sobre a imensa preocupação com a falta de preparo de seus homens para o frio extremo e a guerra de montanha.
Mas o Brasil estava enviando seus filhos para o matadouro. Ao chegarem em Nápolis, em julho de 1944, a recepção de seus próprios aliados não foi muito melhor. Muitos comandantes americanos viam a FEB com desconfiança, uma força inexperiente que poderia se tornar um fardo. foram designados para o V exército americano sob o comando do general Mark Clark e enviados para a tarefa mais sangrenta e frustrante de todo o fronte italiano.
Romper a linha gótica. Essa linha era a obra prima defensiva do marechal Castle Ring. Centenas de quilômetros de casamatas de concreto, ninhos de metralhadoras, campos minados e posições de artilharia cravados no terreno montanhoso. Era uma fortaleza natural, aprimorada pela engenharia alemã. E a joia da coroa desse setor era um complexo de montanhas que dominava o vale do rio Reno.
O seu nome se tornaria uma cicatriz eterna na memória do exército brasileiro, Monte Castelo. Quem controlasse Monte Castelo controlava o acesso ao norte da Itália. Os alemães sabiam disso. O major Kammer, comandando as forças do 23 do regimento de granadeiros, havia supervisionado pessoalmente a construção das defesas.
Trincheiras profundas, bkers com paredes de 1 m de espessura, morteiros posicionados em abrigos invisíveis. A própria montanha era uma arma. As encostas íngremmes e rochosas forçavam qualquer atacante a se expor. Uma única metralhadora MG42, bem posicionada podia varrer um batalhão inteiro. O tenente alemão Franz Weber escreveu para sua esposa: “Os americanos nos enviaram seus aliados tropicais para nos atacar.
Eles morrerão de frio antes mesmo de ouvirem o primeiro tiro. Subir esta montanha sob fogo é impossível. Não consigo imaginar como poderiam avançar. A confiança alemã era absoluta, alimentada por uma ideologia que o cegava para a realidade. Eles posicionaram suas forças, acreditando que os brasileiros iriam entrar em pânico e fugir ao primeiro sinal de resistência séria.
Era um erro de cálculo que lhes custaria muito caro. O primeiro ataque brasileiro a Monte Castelo ocorreu em 24 de novembro de 1944. Foi um desastre. O planejamento americano foi falho, a artilharia de apoio foi insuficiente e o mais fatal de tudo, os pracinhas não tinham experiência nem equipamento para aquele tipo de terreno.
Eles atacaram durante o dia, subindo as encostas abertas sob uma chuva torrencial de morteiros e fogo de metralhadoras alemãs. MG42, apelidados de Lourdinha pelos brasileiros, por causa do som rápido e contínuo, rasgavam o ar. Os homens avançavam pela lama gelada, vendo seus companheiros caírem um a um. A falta de comunicação transformou o ataque em um caos.
Unidades se perderam na névoa. Ordens não chegaram. Ao final do dia, a FEB havia sofrido centenas de baixas e não havia conquistado um único metro da montanha. Para o comando alemão, aquilo foi a confirmação de tudo o que eles acreditavam. O major Krammer relatou ao seu superior: “O ataque brasileiro foi repelido com facilidade.
As tropas inimigas demonstraram bravura imprudente, mas nenhuma habilidade tática. Recuaram em desordem. Como previsto, não são uma força de combate séria. Um segundo ataque, cinco dias depois teve o mesmo resultado sangrento e um terceiro em 12 de dezembro foi ainda pior. A cada tentativa, a montanha parecia zombar dos brasileiros, cobrando um preço terrível por sua audácia.
O moral da tropa despencou. O frio, a humidade constante, o pé de trincheira e a visão de seus amigos morrendo, por nada começaram a corroer a determinação dos pracinhas. A piada alemã parecia ter se tornado uma trágica verdade, mas a arrogância alemã e a aparente confirmação de seus preconceitos os levaram a um erro crucial.
Eles continuaram a subestimar a resiliência de seus oponentes. Eles não entendiam a natureza do soldado brasileiro. Não era a disciplina cega do soldado prano. Era algo diferente, uma teimosia, uma capacidade de improvisar e, acima de tudo, uma raiva que crescia a cada derrota. A cada amigo perdido, o desejo de tomar aquela maldita montanha deixava de ser uma ordem e se tornava uma questão de honra.
Eles iriam aprender a lutar naquela guerra, uma lição que seria paga com sangue brasileiro. Durante os meses seguintes, a FEB passou por uma transformação brutal. Novos oficiais mais experientes assumiram. O treinamento mudou, focando em ataques noturnos, patrulhas de reconhecimento e táticas de pequenas unidades. Os pracinhas aprenderam a usar a noite e a névoa a seu favor.
Eles se tornaram fantasmas nas montanhas, conduzindo ataques de sondagem, emboscadas, coletando informações sobre as posições alemãs com uma audácia que começou a perturbar a confiança dos defensores. Enquanto isso, a lenda de Monte Castelo crescia, tornou-se uma obsessão para o V exército. A montanha tinha que cair. Em fevereiro de 1945, um novo plano foi traçado, desta vez muito mais robusto.
A FEB não a atacaria sozinha, teria o apoio massivo da artilharia aliada e crucialmente o apoio da lendária de divisão de montanha americana. especialistas em combate ao pino que atacariam picos vizinhos para dividir as defesas alemãs. 21 de fevereiro de 1945, 05:30 da manhã, o céu sobre os apeninos explodiu em um pandemônio de fogo e aço.
Milhares de projéteis de artilharia caíram sobre Monte Castelo por quase 2 horas. Era a preparação que os brasileiros nunca tiveram em suas primeiras tentativas. Quando o bombardeio cessou, um silêncio assustador tomou conta do vale. E então os pracinhas do primeiro batalhão, comandados pelo então tenente coronel Euclides Zenóbio da Costa, começaram a subir.
Desta vez não havia hesitação, não havia caos. Eles avançavam em silêncio, usando as crateras das bombas como cobertura, movendo-se com uma determinação fria e letal. As metralhadoras alemãs sobreviventes abriram fogo, mas os brasileiros não recuaram. Eles responderam com suas próprias metralhadoras e morteiros em uma dança de fogo e manobra que haviam aprendido da maneira mais difícil.
O sargento Max Wolf, filho, um dos heróis da FEB, liderou seu pelotão através de um campo minado, sob fogo intenso. Homens caíam, mas eles não paravam. Eles subiam um passo de cada vez, movidos por uma fúria contida. Quando chegaram as primeiras trincheiras alemãs, a luta se tornou um combate corpo a corpo brutal, travado com granadas, baionetas e paz de entrincheiramento.
Os alemães, esperando a mesma tropa desorganizada de novembro ficaram chocados. Aqueles não eram os dançarinos de carnaval que sua propaganda descrevia. Aqueles eram soldados endurecidos, movidos por uma vingança fria. Eles lutavam com uma ferocidade que os alemães não esperavam. O tenente Franz Weber, que antes zombava dos brasileiros, escreveu em seu diário após ser capturado: “Nós os matamos, mas eles continuavam vindo.

Nós os rechaçamos, mas eles atacavam de novo.” Estes eram os soldados fracos que nossa inteligência descreveu. Eles lutavam como demônios. Começamos a entender que as teorias raciais eram mentiras, mas aprenderam essa verdade tarde demais. Ao final da tarde de 21 de fevereiro, após quase 12 horas de combate ininterrupto, o impensável aconteceu.
Uma bandeira verde e amarela foi asteada no cume de Monte Castelo. A montanha havia caído. A queda de Monte Castelo enviou ondas de choque através do comando alemão. O major Kammer, em seu relatório final sobre a batalha, escreveu com uma honestidade brutal: “A posição foi perdida não por falta de coragem de nossos homens, mas pela determinação sobrehumana do inimigo.
A avaliação inicial sobre as tropas brasileiras foi um erro catastrófico. Eles aceitaram baixas que quebrariam a maioria das unidades de elite e continuaram avançando. A vitória teve um custo devastador. A campanha para tomar a montanha, desde as primeiras tentativas em novembro custou a FEB mais de 400 mortos e milhares de feridos.
Batalhões inteiros foram reduzidos a meras sombras de si mesmos, mas as perdas alemãs foram diferentes. Eles não perderam apenas homens, eles perderam uma posição estratégica que jamais poderiam recuperar. A linha gótica na Itália tinha uma ferida aberta pela qual os aliados iriam sangrar o exército alemão até a morte.
A conquista de Monte Castelo foi o ponto de virada para a FEBE. O desprezo de seus aliados americanos se transformou em admiração. A divisão brasileira, que antes era vista como um problema, agora era considerada uma força de assalto confiável e tenaz. Eles continuaram a avançar, conquistando cidades como Montese, Zoca e Caste Novo, empurrando os alemães para o Vale do Pó e forçando a rendição de uma divisão inteira, a 148 divisão de infantaria alemã, juntamente com remanescentes de uma divisão fascista italiana. Um oficial alemão de
alta patente, capturado em abril de 1945, disse durante seu interrogatório: “Nós fomos informados de que os brasileiros correriam ao primeiro tiro. Em vez disso, eles subiram montanhas sob um fogo que deveria ter detido qualquer ataque. Eu lutei contra divisões da guarda soviética na Frente Oriental. Os brasileiros lutaram com a mesma tenacidade, talvez até com mais.
porque parecia que eles tinham algo a provar para o mundo inteiro. Com a linha gótica rompida, a ofensiva da primavera dos aliados avançou rapidamente, culminando na rendição incondicional das forças alemãs na Itália em 2 de maio de 1945. Mas o significado mais profundo da jornada dos pracinhas transcendeu a vitória militar.
Eles haviam destruído o mito da inferioridade racial, não com discursos, mas com sangue, coragem e sacrifício. Provaram que quando uma nação é subestimada, sua capacidade de surpreender pode se tornar sua maior arma. O reconhecimento veio, ainda que de forma contida. O general Mark Clark, em sua avaliação final, admitiu: “A força expedicionária brasileira cumpriu todas as missões que lhe foram atribuídas e o fez com galhardia e competência.
O marechal Kesselring, em suas memórias do pós-guerra, foi ainda mais direto. Os brasileiros eram uma força aguerrida e corajosa. Nossas avaliações de inteligência, baseadas em teorias raciais estavam completamente erradas. Os pracinhas voltaram para um Brasil que os recebeu como heróis, mas que rapidamente tentou esquecer os horrores e as lições da guerra.
Muitos lutaram para se readaptar a uma vida civil em um país que, embora não tivesse as leis de segregação do Zeó, ainda era profundamente desigual. Eles haviam lutado pela democracia no exterior apenas para ver essa mesma democracia ser frágil em sua própria terra. Ainda assim, o legado perdurou. A experiência da FEB ajudou a profissionalizar e modernizar o exército brasileiro.
Mais importante, ela inseriu na alma da nação uma nova autoconfiança. Os pracinhas provaram para o mundo e principalmente para si mesmos, que o brasileiro não era apenas o homem cordial e pacífico, mas que o Brasil era uma nação capaz de feitos heróicos. Hoje Monte Castelo é um lugar silencioso, um monumento com os nomes dos pracinhas mortos em combate se ergue contra o vento frio da montanha.
A inscrição é simples, mas poderosa. Aos heróis brasileiros mortos pela liberdade. A história da FEB em Monte Castelo é, em última análise, sobre a dignidade humana e a recusa em aceitar as limitações impostas pelo preconceito. Aqueles jovens subiram à montanhas carregando não apenas suas armas, mas as aspirações de uma nação inteira que exigia o respeito do mundo.
Os alemães zombaram da chegada dos soldados brasileiros, mas a zombaria morreu nas encostas daquela montanha, abafada pelo som da coragem de homens que se recusaram a desistir, se recusaram a quebrar e se recusaram a aceitar o julgamento de qualquer um sobre valor, exceto o seu próprio. Disseram-lhes que eram fracos, deram-lhes a tarefa mais impossível.
Esperava-se que eles falhassem. Em vez disso, eles tomaram a montanha, romperam a linha e mudaram a história. Os alemães riram, os pracinhas tiveram a última palavra. M.