Em uma manhã seca e cortante de 1873, Anna Whitmore sabia que estava sendo punida, mas os moradores de Cedar Ridge chamavam isso de caridade. A varanda da pensão, com seu piso de madeira envelhecida, parecia um palco, e ela era a atriz principal de uma peça que nunca pediu para entrar. Olhares curiosos espreitavam dela dos vitrines das lojas, das cortinas de renda e até das janelas poeirentas do saloon. Todos queriam vê-la partir. A viúva sem filhos, um fardo demais para a família, uma vergonha para a sociedade respeitável.
Sua mala de carpete estava ao lado das botas, o cabo desgastado pelo nervosismo de suas mãos. Dentro da mala, estavam vestidos remendados tantas vezes que pareciam cobertores, uma Bíblia gasta e algumas pequenas relíquias que haviam pertencido ao seu falecido marido. Tudo o que possuía cabia ali, e ainda assim, aquilo parecia mais pesado do que ferro.
“Melhor entrar, Martha”, sua cunhada insistiu novamente. Sua voz não era impiedosa, mas carregava aquela ponta de pena que Anna já havia aprendido a odiar.
Não, Anna respondeu com firmeza. “Vou esperar aqui.”
Seu irmão Samuel se aproximou, mas não olhava nos olhos dela. “Você entende? Isso é para o melhor. Martha está grávida de novo. Já são quatro bocas para alimentar.”
“Eu entendo”, Anna cortou-o. Sua voz não vacilou. Anos de fofocas a haviam endurecido. Ela era estéril, maldita, uma vergonha. Conhecia bem as palavras que usavam quando achavam que ela não podia ouvir.
Samuel endireitou o casaco. “Monroe é um bom homem. Perdeu a família há anos. Precisa de alguém para cuidar da casa.”
Anna quase deu uma risada amarga diante da cruel ironia. Jack Monroe, o recluso que ia à cidade duas vezes por ano para pegar mantimentos e saía antes que alguém pudesse sequer ver seu rosto completo. O homem que havia se enterrado em um rancho a 20 quilômetros de distância, depois de perder sua esposa e filho para a febre. Ele não precisava de uma governanta. Precisava esquecer.
E ela, bem, era a solução deles para esse problema. As senhoras da igreja tinham sido astutas. Mandar a viúva sem filhos para o ermitão do rancho, haviam sussurrado. Dois desajustados escondidos onde ninguém precisaria olhar para eles.
Anna olhou para o mercadinho. Mrs. Henderson e Mrs. Clark estavam lá, ombro a ombro, cochichando por trás de luvas elegantes. Viraram-se rapidamente quando perceberam que ela as observava, mas Anna ainda pôde ver os sorrisos pequenos e satisfeitos. “Elas não lhe contaram, não é?”, ela perguntou suavemente, seus olhos fixos em Samuel.
Samuel pigarreou. “Não é relevante. O homem precisa de uma governanta, e você precisa de um teto. Simples assim.”
“Simples assim”, respondeu Anna, com a dor de saber que aquele simples acordo era a sentença que ela estava cumprindo.
O som das rodas do vagão interrompeu o silêncio pesado. Pete Sullivan apareceu, seu rosto impassível, parando em frente à pensão. Ele inclinou o chapéu, mas evitou olhar nos olhos dela. Ele também estava ali para assistir à piada.
“Bom dia, Miss Anna”, Pete disse. Anna ergueu o queixo e subiu no vagão. Sua coluna permaneceu ereta, mesmo que a humilhação a pressionasse como um saco de pedras.
Enquanto o vagão começava a se mover, ela ouviu uma voz pequena atrás dela. “Mãe, por que a Miss Anna está indo embora?”, perguntou o jovem Tommy Henderson.
“Ela está indo para onde pertence”, foi a resposta, palavras que seguiram Anna pela rua empoeirada, passando pela igreja onde ela um dia se imaginou como uma noiva esperançosa, passando pelo cemitério onde seu marido estava enterrado.
Quando Cedar Ridge ficou para trás, ela se sentiu despida, como as árvores tortas da pradaria. A viagem foi longa, e a chuva logo a molhou por completo, transformando o caminho em lama. Pete a deixou em um portão, e antes de partir, olhou-a pela primeira vez naquele dia, seus olhos mais suaves.
“Tem certeza disso, Miss Anna?”, ele perguntou. “Posso contar para os outros que você foi para o leste.”
“Não tenho ninguém no leste”, Anna respondeu, apertando a mala com mais força. “Obrigado, Pete. Mas aqui é onde eu preciso estar.”
Ele assentiu, estalou a língua e seguiu embora, deixando-a sozinha na lama, com sua mala e um baú pesado demais para carregar.
A caminhada até o rancho foi interminável. A grama roçou suas saias, e o céu parecia pesar sobre ela, carregado com o cheiro da terra molhada. Quando o rancho finalmente apareceu à vista, Anna estava encharcada. A casa erguia-se da pradaria como um fantasma, suas paredes de tronco cinzas pela idade. O celeiro se inclinava contra o horizonte, e a fumaça que saía da chaminé parecia um suspiro solitário.
Ela subiu na varanda, e antes que pudesse bater, a porta se abriu. Jack Monroe, um homem alto e de ombros largos, estava ali. Seu cabelo escuro estava salpicado de fios grisalhos. Seus olhos, de um cinza metálico, a pararam no lugar. “Você é a mulher da cidade”, ele disse, sua voz plana.
“Anna Whitmore”, ela respondeu, erguendo o queixo, com a água escorrendo de seus cabelos. Ele a observou de cima a baixo, sem expressão.
“Está atrasada. Onde está o seu baú?”
“Lá no portão. Está muito pesado.”
Sem mais palavras, ele passou por ela e foi até o portão, retornando minutos depois, o baú apoiado em um ombro como se fosse leve. Colocou-o no chão com cuidado e disse:
“Melhor entrar. A tempestade não acabou.”
Dentro da casa, o cheiro de poeira e solidão preenchia o ar. Jack apontou para um corredor estreito. “O seu quarto é no final. Era o quarto de costura da minha esposa. Limpei ontem.”
Anna parou, seu coração apertado. “Obrigada”, ela murmurou. Ele não respondeu, apenas se ocupou com o fogão.
Sozinha no quarto, Anna trocou de roupas, o colchão era estreito, e a janela dava para a pradaria sem fim. Era um quarto vazio de sonhos de uma mulher, agora destinado ao exílio de outra.
À noite, ela ficou na cozinha, lavando os pratos em silêncio. Jack voltou de fora, com o cheiro de chuva grudado nele. Ele se encostou na porta.
“Precisamos ser claros”, disse ele. “Isso não é casamento. Eu preciso de ajuda. Você precisa de um teto. Isso é tudo.”
“Eu entendo”, respondeu Anna, sua voz firme.
Ele a observou por um momento, os olhos cinzentos fixos nela. “Então estamos de acordo.”
Mais tarde, quando a noite caiu e a tempestade rugiu lá fora, Anna se deitou na cama, ouvindo o vento nas telhas. O que a cidade pensava que tinha acabado com ela, que a havia enterrado em vergonha ao lado de um homem que não tinha mais nada a oferecer, não sabia que a tempestade tinha outro poder. Um poder que mudaria tudo.
E, ali, no silêncio do rancho, algo frágil se formava entre os dois. Uma trégua silenciosa, um entendimento crescente de que as feridas podiam cicatrizar e que, juntos, poderiam descobrir um novo começo.