O lustre de cristal brilhava como estrelas caindo do teto do Hotel Grand Royale. A festa da Vartek estava no auge — executivos, investidores, champanhe e música clássica preenchiam o salão. No canto, Ethan Blackwood, o CEO mais jovem da história da empresa, observava tudo. De terno preto impecável, olhos azuis cortantes e expressão fria, ele parecia mais uma estátua grega irritada do que um empresário celebrando um grande acordo.
A Vartek acabara de fechar um contrato milionário com um parceiro brasileiro. Mas Ethan não sabia relaxar. Confiava em poucos, especialmente nos funcionários de base. Enquanto circulava o salão, notou algo estranho.
Emma Thompson, a empregada recém-contratada, caminhava com uma bandeja de doces. Tinha olhos castanhos calorosos, sorriso fácil e movimentos leves. Mas o que chamou sua atenção foi a forma como ela se aproximava da mesa onde ele deixara, por descuido, a versão em português do contrato confidencial. Emma olhava o documento como se o estivesse… lendo?
Ethan se aproximou, a voz gelada.
— O que você está fazendo?
Emma se virou, rindo como se tivesse sido pega roubando um doce.
— Só estava dando uma olhadinha, chefe. Parece um romance brasileiro. Tem um ricaço que se apaixona por uma faxineira?
Alguns convidados riram. Ethan não. Tomou o contrato das mãos dela com raiva contida.
— Isso não é brincadeira. Quem você pensa que é? Você é só uma empregada.
Mas Emma manteve o sorriso.
— Só curiosidade. “Contrato de parceria”, certo? Ou será “contrato de amor”?
Ele parou. Ela realmente acabara de traduzir?
— Você fala português? — perguntou com desdém. — Se conseguir traduzir esse contrato, o meu salário é seu.
O salão explodiu em risadas. Mas Emma não recuou.
— Fechado. E quero uma máquina de sorvete no depósito da lavanderia. De morango, com cobertura de chocolate.
Mais gargalhadas. Mas Ethan, no fundo, começou a se preocupar. Emma parecia realmente entender o documento. E ele não era fácil.
Quando a festa acabou, Ethan, sem pensar muito, mandou levá-la para sua mansão.
— Quer traduzir? Vai ser sob minha supervisão.
Emma entrou em casa como se estivesse voltando de um turno de trabalho. Cumprimentou o gato cinzento de Ethan — apelidado por ela de “Google Translate” — e se instalou na sala. Espalhou papéis, lápis coloridos e notas adesivas por todo lado. Ethan apenas a observava, dividido entre ceticismo e fascínio.
Durante a madrugada, Emma traduziu cláusula por cláusula. Ao chegar na cláusula 8, seus olhos se arregalaram.
— Transferência total de tecnologia… se houver violação? Mas violação de quê? Isso é uma armadilha.
Rapidamente, enviou uma foto para Lisa, sua amiga linguista em Nova York.
— Isso é grave, Lisa. Podem tirar tudo da Vartek se interpretarem do jeito errado.
Lisa confirmou. Era uma cilada legal mascarada em linguagem vaga. Se Ethan assinasse, perderia tudo.
Na manhã seguinte, Emma entrou na sala de reuniões da Vartek ainda com o uniforme de empregada e papéis cor-de-rosa fluorescentes nas mãos.
— Bom dia. Hoje vou explicar por que esse contrato é uma bomba — disse, diante dos sócios incrédulos.
Desenhou um lobo travestido de ovelha no quadro. Explicou como cláusulas vagas permitiam a quebra do acordo com base em qualquer erro mínimo. Propôs alterações. Ethan assistia em silêncio, engolindo o orgulho. Ela não estava brincando. Ela salvou sua empresa.
Naquela noite, ele a chamou para conversar.
— Por que nunca defendeu seu nome? Você era uma das melhores. Eu vi tudo. Seu histórico em Harvard, os artigos, a bolsa… e a queda.
Emma respirou fundo.
— Eu tentei. Mas quando você é jovem, mulher e sem conexões, ninguém ouve. Acabei limpando pisos porque era o único emprego que não exigia diploma nem checagem de antecedentes.
Ethan se calou. Pela primeira vez, viu quem Emma realmente era.
— Você merece mais.
Semanas depois, ela recebeu um envelope de Harvard. Sua inocência havia sido oficialmente reconhecida. E, naquela mesma manhã, Ethan colocou sobre sua mesa um novo contrato. Um com apenas duas cláusulas.
Contrato de Amor – Primeira Versão:
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Parte A, Ethan Blackwood, compromete-se a fazer Parte B, Emma Thompson, feliz para sempre, mesmo que precise aprender a desenhar memes.
Parte A ouvirá Parte B, mesmo que ela reclame de sorvete ou xingue o Google Translate.
Emma sorriu.
— Faltou a cláusula 3: Parte A deve comprar uma máquina de sorvete. De morango.
Ele assinou com um sorriso sincero.
— Feito.
E assim, entre papéis cor-de-rosa, cláusulas improvisadas e um gato ciumento, nasceu o amor mais improvável do mundo corporativo — com validade eterna e cobertura de chocolate.