Cole estava em sua varanda enquanto o crepúsculo sangrava sobre as planícies cobertas de neve do território de Montana. Véspera de Natal. Um vento amargo entoava um hino solitário, chicoteando os flocos de neve contra a madeira gasta de sua cabana. Era um lugar sólido. Bons ossos, mas cheio de fantasmas.

Três anos desde que Anna morreu, apanhada no fogo cruzado de uma vida que ele tentara enterrar ali. Três anos de silêncio, o único som sendo o crepitar da lareira e o movimento inquieto de seu cavalo no celeiro. Ele era um pistoleiro tentando esquecer a sensação de uma pistola em sua mão; um homem cujo nome já fora sussurrado com medo desde saloons empoeirados até passagens nas altas montanhas.
Agora, ele era apenas um homem assombrado por cômodos vazios.
O anúncio pregado no poste do armazém geral fora um impulso prático e desesperado. Um “carregamento de mão de obra” do leste, leiloado ao maior lance. Era uma transação cruel, mas a solidão era uma crueldade própria, um veneno lento. Ele precisava de outra batida de coração na casa, uma presença para lutar contra o silêncio.
Ele cavalgou até a pequena cidade de Bitterroot. Tochas lançavam uma luz bruxuleante e infernal sobre a plataforma improvisada no centro da cidade. Uma pequena multidão se reunira, batendo os pés contra o frio. No centro da plataforma, uma fila de pessoas tremia, e no final da fila, uma jovem chinesa.
Ela estava acorrentada nos pulsos e tornozelos, o ferro destacando-se contra suas roupas finas de algodão. A multidão vaiava, atirando insultos como pedras. Cole sentiu uma raiva fria familiar apertar em seu estômago. O lance estava baixo, tingido de desprezo.
“O que alguém vai fazer com isso?”, zombou um homem. “Ela nem é grande o suficiente para o trabalho da fazenda!”
Cole observou a mulher. Ela permanecia impossivelmente imóvel, a cabeça erguida, o olhar fixo em algum ponto distante. Ela não estava implorando ou chorando. Ela estava suportando.
“Vinte dólares.”
A voz de Cole cortou os murmúrios, áspera pelo desuso. A multidão se virou, surpresa. Flint, um rancheiro brutal, sorriu com desdém. “Olha só o que temos aqui. O fantasma de Bitterroot, veio comprar um presente de Natal.”
“Vinte e cinco.”
Cole não olhou para ele. “Cinquenta.”
Um suspiro percorreu a multidão. Os olhos de Flint se estreitaram. Isso não era mais sobre a mulher. Era um desafio.
“Cinquenta e cinco.”
“Cem,” disse Cole, sua voz plana e final. O número pairou no ar congelado. Flint encarou, seu orgulho lutando contra sua carteira, e finalmente balançou a cabeça com uma risada enojada. “É todo seu, pistoleiro! Aproveite seu brinquedo quebrado!”
“Vendido!”
Cole subiu na plataforma, entregando o dinheiro. Ele ignorou os sussurros. Ele parou diante da mulher cujo nome ele nem sabia. Um guarda destrancou suas correntes, que caíram na neve com um baque surdo. Pela primeira vez, ela olhou para ele.
Quando ela levantou a cabeça, a luz da tocha atingiu seu rosto. O lado esquerdo era impecável, suave como porcelana. Mas o lado direito, em sua bochecha, logo abaixo do olho, era uma marca. Um símbolo cruel e intrincado, gravado a fogo em sua pele, uma marca de propriedade.
Cole prendeu a respiração. Ele congelou. Ele não estava olhando para uma “carga”. Ele estava olhando para uma sobrevivente. Seus olhos, escuros e profundos, não continham nenhum pedido de piedade, apenas uma dignidade desafiadora e exausta. Ele viu neles o reflexo de um homem que ele não queria mais ser.
Ele simplesmente acenou com a cabeça em direção ao seu cavalo. “Vamos.”
Ela o seguiu sem dizer uma palavra. O som de risadas zombeteiras os seguiu para dentro da tempestade crescente, uma canção de Natal cruel no vento cortante.
A cabana estava quente. Ela parou no centro da sala principal, uma figura pequena e imóvel, observando tudo: a poeira na lareira, o chão sujo.
“Pode se aquecer perto do fogo”, ofereceu ele, sem jeito.
Ela se moveu em direção à lareira, as costas retas como uma vara.
“Tem um quarto”, ele começou, pigarreando. “Lá em cima, o quarto principal…”
“Eu ficarei com o quarto menor”, ela interrompeu. Sua voz era baixa, com um sotaque musical, mas as palavras eram claras e precisas. Ela apontou para um pequeno depósito perto da cozinha. “Aquele está bom.”
“Isso não é um quarto de verdade. Você deveria ficar com a cama.”
Ela finalmente se virou para encará-lo, a marca em sua bochecha vívida à luz do fogo. “Sejamos claros, senhor. O senhor comprou meu trabalho. Vou cozinhar, limpar e remendar. Nada mais é esperado ou oferecido. Um quarto pequeno é suficiente para uma serva.”
Suas palavras eram um muro construído de dura experiência. Cole sentiu uma pontada de vergonha. Ele havia comprado ela. A verdade feia disso estava entre eles.
O jantar foi carne seca e pão duro, amolecidos em um ensopado. Ela cozinhou com uma competência silenciosa. Eles comeram em silêncio.
“Qual é o seu nome?”, ele finalmente perguntou.
“Mai,” ela disse, sem levantar os olhos.
“Cole.”
O silêncio voltou, mais pesado. Mais tarde, ele se deitou em sua própria cama – a cama de Anna – ouvindo os pequenos sons da presença de uma estranha. “O que foi que eu fiz?”, ele sussurrou na escuridão.
Em seu quartinho, Mai tocou a marca na bochecha. Outro mestre, outra jaula. Mas este era diferente. Ele não tinha sido cruel. Ele a olhava com algo que ela não conseguia nomear. Confusão. Piedade. Não importava. Ela sobreviveria.
Os dias se transformaram em uma semana. A nevasca passou. Mai transformou a cabana. O cheiro de poeira foi substituído pelo aroma de pão fresco. Cole se viu ouvindo o suave farfalhar de seus movimentos; pequenos sons que quebravam o silêncio sufocante.
Uma manhã, ele entrou e encontrou o casaco de inverno que rasgara na cerca. A costura estava reparada com pontos minúsculos e perfeitos.
“Minha mãe me ensinou a costurar”, ela disse baixinho, do fogão. A primeira palavra que ela ofereceu sem ser perguntada.
“A minha também”, ele respondeu. Uma ponte pequena e frágil foi construída entre eles.
Uma semana depois do Natal, eles tiveram que ir à cidade. Enquanto amarravam a carroça, a cidade ficou quieta. Cabeças se viraram. Sussurros os seguiram. Do lado de dentro, dois jovens riam atrás de uma pilha de barris.
Quando estavam carregando a carroça, Flint bloqueou o caminho. “Aproveitando sua compra, pistoleiro?” Seu sorriso era um corte de navalha. Ele inclinou o chapéu para Mai com cortesia zombeteira. “Surpreso que ele a deixe sair à luz do dia. Ruim para os negócios, um rosto desses.”
Mai não reagiu.
“Diga-me, Cole”, Flint continuou, aproximando-se. “Ela grita em uma língua que você entende? Ou essa marca no rosto dela é para mantê-la quieta?”
A mão de Cole instintivamente foi para o quadril, onde seu coldre costumava ficar. O movimento era antigo, familiar e aterrorizante. Ele se conteve, cerrando os punhos. Ele estava tentando ser um homem diferente.
O passeio de volta para casa foi um longo silêncio. Cole havia ficado parado e deixado aquele homem insultá-la.
“O senhor não precisa me defender”, a voz baixa dela quebrou a tensão.
“Talvez eu tenha que defender a mim mesmo”, disse ele, as palavras arrancadas dele.
Ela olhou para ele então, realmente olhou. Havia uma rachadura no muro de certeza dela sobre ele.
Na manhã seguinte, Flint e dois de seus homens cavalgaram para o quintal. “Cole!”, Flint gritou. “Vim a negócios. Eu lhe dou 200 por ela. O dobro do que você pagou.”
Mai congelou, a mão ainda no varal.
Cole saiu do celeiro. “Ela não está à venda.”
Flint riu. “Tudo está à venda. Você é um pistoleiro, não um rancheiro. Que utilidade ela tem para você? Você foi covarde demais para defendê-la na cidade. Você tem vergonha dela.”
“Saia da minha terra, Flint.”
“Ou o quê? Vai me matar de tanto falar?” Flint zombou. “Você não é o homem que costumava ser.” Seus homens se espalharam, as mãos nos coldres.
Mai olhou para Cole, os olhos arregalados de medo. Ela esperava que ele falhasse novamente, que a negociasse.
Algo dentro de Cole quebrou. O homem quieto que ele tentava ser era uma mentira.
Ele deu um passo lento para frente. “O último homem que me chamou de covarde”, disse Cole, sua voz caindo para um tom perigosamente baixo que silenciou o vento, “está enterrado em uma colina perto de Wichita.”
O sorriso de Flint vacilou. Pela primeira vez, ele viu o fantasma que havia zombado.
“Você tem três segundos para sair daqui”, continuou Cole, “antes que eu o lembre por que as pessoas costumavam trancar suas portas quando ouviam meu nome.”
Flint hesitou, olhando para a certeza fria nos olhos de Cole. Ele não viu blefe. Xingando, ele montou de volta em seu cavalo. “Isso não acabou, pistoleiro!”
O quintal ficou em silêncio. Mai o encarava. Ele a havia defendido. Ele a havia escolhido.
Ele caminhou até ela. “Você está segura aqui.”
Ela procurou em seu rosto. “Por quê?”, ela sussurrou.
“Porque esta é a sua casa”, disse ele, e as palavras pareceram mais verdadeiras do que qualquer coisa que ele dissera em três anos.
O degelo da primavera chegou tarde, mas transformou a terra. Eles plantaram um jardim juntos, trabalhando lado a lado.
Uma noite, sentados na varanda, um silêncio confortável havia crescido entre eles. Por impulso, ela encostou a cabeça no ombro dele. Cole ficou absolutamente imóvel. Ele podia sentir o leve cheiro de sabão e fumaça de madeira em seus cabelos.
Lentamente, hesitante, ele levantou a mão e tocou o rosto dela, o polegar traçando suavemente a borda da marca na bochecha dela. Ela se encolheu, um tremor quase imperceptível.
“Sinto muito”, ele murmurou.
“É uma parte de mim”, ela disse.
“Não é quem você é”, respondeu ele. Ele se inclinou, os fantasmas de seus passados surgindo entre eles. Ele viu o medo nos olhos dela, e ela viu o medo nos dele. Ela se afastou ligeiramente. “Está tarde.”
Na manhã seguinte, a distância havia retornado.
Cole cavalgou até o túmulo de Anna. “Sinto muito, Anna”, ele finalmente disse. “Achei que honrar você significava ficar sozinho para sempre. Mas isso não é viver. É só esperar para morrer.” Ele respirou fundo. “Acho que estou me apaixonando por ela. E isso me apavora.”
Não foi uma traição. Foi uma permissão.
Ele voltou para o rancho. Mas a cabana estava vazia.
Um terror frio o dominou. Sobre a mesa da cozinha, uma pilha de roupas remendadas e uma pequena bolsa de couro. Ao lado, um bilhete: Obrigada por sua bondade. Não posso ser um fantasma na casa de outra pessoa. Não serei a causa do seu medo.
Ela se foi. Ele havia hesitado, e ela confundira seu medo com rejeição.
Ele a encontrou na cidade, preparando-se para embarcar na diligência. A cidade inteira observava. Flint estava encostado na varanda do hotel, um sorriso triunfante.
Cole parou na frente dela. “Mai.”
“Não há mais nada a dizer.”
“Claro que há”, disse ele, sua voz ecoando pela rua. “Eu fui um covarde. Eu estava com medo de sentir qualquer coisa de novo, porque não queria perder. Mas perder você por um dia foi pior do que os últimos três anos sozinho.”
Flint riu alto. “Ouçam o pistoleiro implorando por sua propriedade!”
Cole se virou lentamente. “Ela não é minha propriedade. Ela é minha esposa.”
Um suspiro coletivo percorreu os espectadores. A cabeça de Mai disparou para cima, os olhos arregalados.
“Vocês não são casados”, zombou Flint.
“Há a minha palavra”, disse Cole. Sua mão, finalmente, repousou naturalmente sobre o coldre. “E aqui, isso é lei suficiente. Se você ou qualquer outra pessoa tiver algum problema com isso, diga agora.”
Flint olhou para a mão de Cole, para a calma mortal em seu rosto. Ele viu o homem sobre quem apenas ouvira histórias. Ele não disse nada.
Cole se virou de volta para Mai. “Não estou pedindo para você ser uma serva. Estou pedindo para você construir uma vida comigo. Por favor, volte para casa.” Ele estendeu a mão.
Lágrimas escorriam pelo rosto dela, lavando a poeira e a dor. Lentamente, ela colocou a mão na dele.
Juntos, eles se viraram e caminharam para a carroça, deixando a cidade silenciosa e a diligência para trás.
Naquela noite, na varanda da cabana que agora era verdadeiramente o lar deles, Cole passou o braço pelos ombros dela. “No próximo ano”, disse ele, “vamos criar galinhas.”
Mai se inclinou contra ele. “Talvez uma criança”, ela disse baixinho.
“Você se arrepende?”, ela perguntou, traçando a costura da camisa dele. “Aquele dia no leilão.”
Cole ficou quieto por um momento. “Todos os dias”, disse ele. Ela enrijeceu. Ele se virou para ela. “Eu me arrependo de todos os dias que desperdicei antes disso. Eu deveria ter te encontrado mais cedo.”
Ele a beijou então, um beijo que falava de nevascas superadas e futuros plantados. O pistoleiro finalmente encontrou uma razão para baixar suas armas, e a mulher acorrentada finalmente encontrou um lugar para ser livre.