O pai a entregou a um rancheiro como uma ‘piada cruel’… Mas congelou de terror ao ouvir o verdadeiro nome dela.

A risada no salão de Lorde Wei era tão cortante e fria quanto o vento de inverno que sacudia os estandartes de seda lá fora. Era um som cruel, afiado pelo privilégio e pelo desdém, e tudo aquilo era direcionado à sua própria filha.

Leanne estava diante do trono, com a cabeça baixa. Não por reverência, mas para esconder a profunda marca de nascença carmesim que florescia no lado esquerdo de seu rosto, uma sombra permanente que se estendia da têmpora até o maxilar. Para a corte opulenta, aquilo era a marca de uma maldição, uma piada divina que a tornava inútil, uma mercadoria sem valor de casamento.

Hoje, seu pai decidira completar a piada.

Diante dela estava um estrangeiro, um homem conhecido apenas como Kale, o rancheiro que havia comprado a inútil extensão de terra rochosa que fazia fronteira com a província ocidental de Wei. Ele era um gigante de homem, seu rosto uma paisagem de velhas cicatrizes e solidão, seus olhos da cor de um mar tempestuoso. Ele era um pária por escolha, um homem que falava a língua deles com um sotaque gutural e preferia a companhia de seus cavalos à de qualquer ser humano. Aos olhos da corte, ele era um bruto, mal podendo ser chamado de homem.

— Como pagamento pelos impostos territoriais que você, surpreendentemente, conseguiu produzir — anunciou Lorde Wei, sua voz gotejando uma magnanimidade teatral —, concedo-lhe um presente. Uma esposa.

Ele gesticulou para Leanne, um movimento rápido de pulso, como se descartasse um pedaço de lixo.

— Ela é, como você pode ver, defeituosa. Mas é de sangue nobre. Trará caráter à sua humilde propriedade.

A corte rugiu em risadas. A piada era perfeita: a nobre amaldiçoada casada com a besta estrangeira. Um fim adequado para ambos.

As mãos de Leanne, escondidas nas mangas largas de seu vestido, tremiam. Ela aprendera há muito tempo que lágrimas apenas convidavam a mais escárnio. Ela sentiu o olhar de Kale sobre ela, pesado e ilegível. Preparou-se para a mesma repulsa que via em todos os outros rostos, a pena que, de alguma forma, era pior do que o ódio.

Mas ele não falou. Ele simplesmente caminhou para frente, suas botas de couro gastas silenciosas no mármore polido. Parou diante dela, tão perto que ela podia sentir o cheiro de terra e pinho que emanava dele. Ele se ajoelhou. Não em súplica a Lorde Wei, mas para encontrar o olhar abaixado dela.

Seus olhos, ela viu agora, não eram tempestuosos, mas profundos como poços antigos, e pela primeira vez, ela não viu julgamento neles. Ele estendeu uma mão grande e calejada. Era um gesto simples, honesto, um mundo distante das intrigas e crueldades da corte.

Após uma vida inteira recuando do toque, ela se viu colocando lentamente sua mão pequena e trêmula na dele. O aperto dele era firme, porém gentil, uma promessa silenciosa de algo que ela não ousava nomear.


A jornada para o rancho foi silenciosa, conduzida no lombo de um cavalo robusto e peludo. Leanne cavalgava atrás de Kale, suas mãos agarradas à lã áspera da túnica dele, a bochecha pressionada contra a parede sólida de suas costas.

A gaiola dourada do palácio de seu pai encolheu atrás deles, substituída por colinas áridas e um céu que parecia se estender até o infinito. O mundo ficou mais quieto, mais simples. O ar era limpo, agudo com o cheiro de sálvia selvagem e poeira. Quando chegaram, o sol estava se pondo, pintando a paisagem desolada em tons de laranja queimado e roxo.

O rancho não era uma grande propriedade, mas uma casa pequena e robusta construída de pedra e madeira escura, com um celeiro próximo e um curral abrigando um punhado de cavalos. Era humilde, isolado e, para Leanne, parecia o lugar mais seguro da terra.

Kale desmontou e virou-se para ajudá-la a descer, suas mãos abrangendo a cintura dela com uma facilidade desconcertante. Ele a soltou no momento em que os pés dela tocaram o chão.

Por dentro, a casa era espartana, mas imaculadamente limpa. Uma lareira de pedra dominava uma parede. Uma mesa rústica e duas cadeiras ficavam no centro da sala, e uma pequena alcova abrigava uma cama simples com uma colcha remendada.

Ele gesticulou para a cama. — Aquilo é seu — disse ele, sua voz um estrondo baixo. Então apontou para uma pilha de peles perto da lareira. — Eu dormirei aqui.

Ele esperava medo, lágrimas, o chilique de uma nobre. Leanne apenas assentiu, seus olhos arregalados absorvendo a quietude do espaço.

Naquela noite, ele preparou uma refeição simples de guisado e pão duro. Comeram em silêncio, os únicos sons sendo o crepitar do fogo e o sussurro do vento lá fora. Ele não a pressionou para falar. Não olhou fixamente para sua marca. Seu olhar encontrava o dela por um momento e, respeitosamente, se desviava.

Quando terminaram, ele pegou a tigela dela, lavou-a e retirou-se para suas peles, virando as costas para lhe dar privacidade. Leanne deitou-se na cama pequena, a colcha áspera contra a pele, e ouviu o som constante da respiração dele misturando-se com o fogo.

Pela primeira vez em sua vida, ninguém estava rindo. Ninguém sussurrava por trás das mãos. O silêncio não estava vazio; estava preenchido com um respeito palpável e não dito. Ali, naquele lugar desolado, com aquele homem silencioso e marcado, a vergonha que fora sua companheira constante começou, pela primeira vez, a afrouxar seu aperto.


Os dias se fundiram em uma rotina tranquila. Kale levantava-se antes do sol para cuidar dos cavalos, e Leanne acordava com o cheiro de fumaça de lenha e chá sendo preparado. Ele nunca exigia nada dela. Simplesmente deixava uma porção de comida na mesa e ia para o trabalho.

Lenta e hesitantemente, ela começou a tornar a pequena casa sua. Varreu o chão de pedra até brilhar, remendou os pontos gastos na túnica dele com fios que desenrolou de seu próprio vestido luxuoso e inútil, e aprendeu os ritmos da lareira, mantendo o fogo vivo. Ela encontrou uma paz estranha nessas tarefas simples e significativas.

Certa tarde, enquanto observava uma cerca perto da casa, sentiu um puxão agudo e olhou para baixo para ver que um pequeno botão de jade, intrincadamente esculpido, havia se soltado da manga de sua capa de viagem e caído na poeira espessa. Ela procurou por ele, os dedos peneirando a terra, mas havia desaparecido. Uma última peça minúscula de sua vida antiga engolida por esta nova.

Sentiu uma pontada de perda, não pelo palácio, mas pela memória da costureira que o pregara, a única pessoa na casa de seu pai que lhe mostrara um pingo de bondade. Ela não disse nada a Kale.

Alguns dias depois, encontrou o botão sobre a mesa, ao lado de seu chá matinal. Estava limpo e polido, a pedra verde reluzindo. Kale estava lá fora, de costas para a casa, cuidando de um cavalo, mas ela sabia. Ele vira sua aflição, procurara pelo botão depois que ela desistira e o devolvera sem uma palavra.

Ela o pegou, o frescor da pedra um conforto na palma da mão. Não era mais apenas um botão. Era uma mensagem: Eu vejo você. Eu vejo suas pequenas tristezas.

A comunicação deles era uma linguagem de gestos. Ele deixava uma flor silvestre resistente no peitoril da janela para ela. Ela garantia que o odre de água dele estivesse cheio antes de ele sair para o dia.

Ele começou a falar mais. Não em longas conversas, mas em declarações curtas e diretas sobre a terra, o tempo, os cavalos. Disse-lhe os nomes deles: Fantasma, Sombra e Brasa. Mostrou-lhe como escovar os pelos até brilharem, suas mãos grandes guiando as dela com uma gentileza surpreendente.

Ela aprendeu que a paisagem do rosto dele não era de crueldade, mas de dificuldades sobrevividas. Sua marca de nascença, que definira toda a sua existência, parecia ser algo que ele nem sequer via. Ele olhava para os olhos dela, para as mãos dela, para a maneira como ela se movia. Ele olhava para ela.

Cuma noite, uma tempestade repentina chegou, e uma rajada feroz de vento abriu a porta, apagando a única lâmpada e mergulhando o quarto na escuridão. Leanne arfou. Um medo primitivo do escuro, instilado por anos sendo trancada em seus quartos como punição, a dominou.

Antes que o medo pudesse criar raízes, ela sentiu a presença dele ao seu lado, uma sombra sólida e calmante. Ele não a tocou, mas sua voz foi uma âncora baixa na escuridão rugidora. — Eu estou aqui. Você está segura. E naquele momento, ela acreditou nele.


A paz frágil do mundo deles foi estilhaçada pela chegada de três cavaleiros. Não eram viajantes perdidos. Moviam-se com a arrogância de capangas contratados, suas roupas empoeiradas, mas bem feitas, os olhos frios e predadores.

Eles frearam os cavalos diante da pequena casa. O líder, um homem com uma cicatriz irregular no lábio, desmontou com um sorriso de escárnio.

— Kale, o estrangeiro — gritou ele, a voz carregada de desprezo. — Sua sorte acabou. Lorde Wei vendeu sua dívida ao Barão Fong. Esta terra é dele agora. Você tem até o pôr do sol para pegar suas coisas e sumir.

Kale emergiu do celeiro. Sua expressão era ilegível, as mãos vazias, mas mantidas soltas ao lado do corpo. — Esta terra está paga — afirmou ele, a voz um estrondo baixo e perigoso.

O homem riu, um som áspero. — O imposto era uma ninharia. O preço real é o que o Barão diz que é. E ele quer você fora.

Seus olhos deslizaram por Kale e pousaram em Leanne, que estava congelada na porta da casa. O sorriso dele se alargou. — Ora, o que temos aqui? A pequena maldição de Wei. Ouvi a piada. Não achei que ela duraria uma semana com alguém como você. — Ele deu um passo em direção a ela, o olhar demorando-se em seu rosto marcado com uma alegria invasiva. — Talvez a levemos como entrada para o Barão. Ele aprecia curiosidades.

Naquele instante, Kale se moveu.

Não foi a investida desajeitada de um bruto, mas a violência rápida e econômica de um guerreiro treinado. Ele fechou a distância em duas passadas silenciosas. O primeiro homem viu o golpe chegando, mas foi lento demais. O punho de Kale conectou-se com a mandíbula dele com um estalo nauseante.

Os outros dois, ainda montados, procuraram suas armas, mas Kale já estava sobre eles. Agarrou a perna do segundo cavaleiro e o arrancou da sela, o corpo atingindo a terra batida com um grunhido. O terceiro esporeou o cavalo, sacando uma espada curta, mas Kale agarrou um poste de cerca descartado, a madeira gemendo em seu aperto.

Ele se movia com uma graça brutal que Leanne nunca imaginara. Um redemoinho de fúria controlada. Ele não era apenas um rancheiro. Era algo inteiramente diferente, forjado em um fogo muito mais duro.

A luta foi curta e selvagem. Kale desarmou o terceiro homem e mandou ele e seu cavalo fugirem para as colinas. Os outros dois jaziam gemendo no chão. Ele ficou sobre eles, o peito arfando, um olhar sombrio nos olhos que ela nunca vira antes.

— Voltem para o seu Barão — rosnou ele, a voz um rugido. — Digam a ele que esta terra não é dele. E digam que se ele enviar alguém perto dela novamente, eu os mandarei de volta em pedaços.

Ele chutou as espadas para longe e observou enquanto eles cambaleavam até ficarem de pé, ajudavam o líder a montar e partiam, deixando uma nuvem de poeira e ameaças no ar.

Kale voltou-se para ela. Havia um corte profundo em seu antebraço, sangrando lentamente. Seus olhos encontraram os dela, e neles ela não viu orgulho na vitória, mas uma dor profunda e azeda, como se a violência tivesse lhe custado um pedaço da paz que ele construíra com tanto cuidado.

Leanne rasgou uma tira da bainha de sua melhor camisa de seda restante, o tecido macio um contraste gritante com a tarefa sombria. Ela guiou Kale para dentro, empurrando-o gentilmente para uma cadeira. Ele se submeteu sem uma palavra, o corpo rígido com as consequências da luta.

O silêncio na pequena casa estava denso com coisas não ditas. Ela se ajoelhou diante dele, mergulhando a seda em uma tigela de água morna. Quando começou a limpar o corte no braço dele, ele estremeceu — não pela dor da ferida, mas pelo toque dela. A pele dele estava quente sob os dedos dela.

Era a primeira vez que ela o tocava verdadeiramente com tal propósito, tal intimidade. Suas mãos, geralmente tão hesitantes, estavam firmes. O mundo se estreitou à ferida, ao gotejar constante da água avermelhada, ao músculo tenso do antebraço dele.

— Você era um soldado — disse ela, a voz mal um sussurro.

Não era uma pergunta. A maneira como ele se movera, a eficiência letal… não era o trabalho de um simples rancheiro.

Ele observou o rosto dela, o olhar intenso. Após um longo momento, deu um único aceno lento. — Há muito tempo. Em uma guerra que não escolhi, por um rei que não respeitava. — A voz dele era rouca pelo desuso, pesada de memória. — Eu deixei isso para trás. Ou tentei.

Quando ela terminou de limpar a ferida, seus dedos roçaram os dele, e uma corrente passou entre eles. Ela olhou para cima. As muralhas que ele mantinha ao redor de si pareceram desmoronar por um momento, e ela viu uma solidão profunda em suas profundezas, uma tristeza que espelhava a dela.

— Por que você me defendeu? — perguntou ela. — Eles insultaram você. — Fui insultada a minha vida inteira — respondeu ela. — Ninguém nunca lutou por mim.

Ele estendeu a mão, a mão não ferida movendo-se lentamente, como se lhe desse tempo para se afastar. — Ele não lutou.

Os dedos dele, calejados e ásperos, traçaram gentilmente a borda da marca de nascença na bochecha dela. Era um toque desprovido de pena ou repulsa. Era um toque de aceitação simples e surpreendente.

— As palavras deles são pedras — disse ele, baixo e feroz. — Eles as estavam jogando em você. Eu não permitirei isso. Não aqui.

Ele deixou a mão cair, mas o calor do toque permaneceu na pele dela, uma carícia fantasma mais real do que qualquer insulto que ela já suportara. Naquele momento, ajoelhada no chão de sua casa humilde, com o cheiro de sangue e chuva no ar, Leanne sabia que não era mais apenas uma pária dada como uma piada cruel. Ela estava em casa, e aquele homem, aquele soldado silencioso e marcado, era seu santuário.


O Barão Fong não era homem de aceitar derrotas. Humilhado, ele enviou não capangas, mas um especialista: um homem conhecido apenas como “A Sombra”, um caçador de recompensas famoso por seu intelecto cruel.

O ataque começou com terror psicológico. Um corvo morto na porta. A água do poço envenenada. Símbolos estranhos esculpidos nas árvores — símbolos que Kale reconheceu dos cantos mais escuros de sua guerra passada.

Certa noite, o celeiro foi incendiado. O confronto entre Kale e a Sombra foi uma dança mortal ao luar. Facas brilharam. Leanne assistiu da casa, segurando o botão de jade como uma oração. Kale venceu, mas o caçador, antes de fugir sangrando para a escuridão, deixou uma última gota de veneno:

— O Barão não vai parar. Mas não é só ele que você deve temer, Kale, o “Açougueiro de Black Ridge”. Imagine o que esta nobrezinha pensaria se soubesse quantos do povo dela morreram na sua lâmina.

Kale ficou imóvel enquanto o homem desaparecia. Ele olhou para Leanne, o rosto desolado. O rancho não era mais seguro. Era um alvo.

Eles partiram sob a cobertura da escuridão, rumo aos cânions inóspitos que marcavam a fronteira das terras áridas.

Não ficaram sozinhos por muito tempo. Encontraram outros despossuídos pelo Barão Fong: um velho fazendeiro e sua esposa, um jovem casal com um filho doente. Uma comunidade de quebrados começou a se formar ao redor deles. Eles olhavam para Kale em busca de proteção, mas olhavam para Leanne em busca de algo mais.

Ela os organizou. Usando as habilidades administrativas que fora forçada a aprender no palácio, ela racionou suprimentos e dirigiu a construção de um acampamento defensável em um cânion sem saída. A mulher com a “maldição” tornou-se uma líder. Sua marca de nascença tornou-se um emblema de desafio. Kale observava com admiração silenciosa: a garota tímida se fora; em seu lugar estava uma rainha dos esquecidos.


A existência dessa comunidade rebelde era um insulto intolerável para o Barão Fong. Ele reuniu um exército privado de 50 homens. Simultaneamente, rumores de uma “bruxa amaldiçoada” liderando uma rebelião chegaram a Lorde Wei. Movido por fúria e curiosidade mórbida, ele partiu com sua guarda de elite.

As duas forças convergiram no cânion.

Dentro, os párias se prepararam. Não eram soldados, mas tinham a terra como aliada. Quando o exército do Barão atacou, foram recebidos por avalanches de pedras e flechas. Kale era um redemoinho de morte no coração da defesa, lutando não apenas por sua vida, mas por sua alma.

Então, a comitiva de Lorde Wei apareceu no cume. Assumindo que tudo aquilo era a revolta camponesa, Wei ordenou a carga. O cânion virou um matadouro de três vias.

Em meio à carnificina, Lorde Wei avistou a figura no alto de uma saliência rochosa, dirigindo os defensores. Ele viu a marca carmesim.

— Então! — ele berrou. — A filha amaldiçoada brinca de ser rainha de mendigos. Eu deveria ter afogado você ao nascer!

Leanne não recuou. O desprezo dele não tinha mais poder.

Lá embaixo, Kale viu uma ameaça se aproximando da saliência. Desesperado para avisá-la, ele gritou o nome que a ouvira sussurrar em sonhos, o nome que ela quase esquecera.

Enleanne! Para a esquerda!

Ao som daquele nome, Lorde Wei congelou. A zombaria desapareceu, substituída por choque absoluto.

Enleanne. Lótus Pacífica. Não era o nome dado à sua filha. Era o nome de sua primeira esposa, a mulher que ele adorara além da razão, a mulher que morrera no parto. Ele banira a criança porque a marca de nascença, em sua mente enlutada, era a marca monstruosa que roubara seu amor. Ele apagara o nome da mãe do palácio.

Ele olhou para a mulher na saliência. Pela primeira vez, não viu uma maldição. Viu os olhos de sua esposa, o espírito desafiador de sua esposa. A fundação de seu ódio, construída sobre duas décadas de luto amargo, desmoronou em pó.

A inação de Lorde Wei foi a ruína dos atacantes. Seus guardas hesitaram. Os homens do Barão, pegos entre dois fogos, quebraram e fugiram.

Os párias haviam vencido.

Kale subiu até o lado de Leanne. Abaixo deles, Lorde Wei desmontou e caminhou através dos corpos como um homem em um sonho. Ele parou na base da rocha, parecendo velho e vazio.

— Enleanne — ele sussurrou, uma confissão dolorosa.

Leanne olhou para ele. Sua expressão não era de triunfo, mas de uma paz vasta e cansada. — Esse era o nome da minha mãe — disse ela, sua voz clara no ar silencioso. — Você tirou isso de mim. Tirou tudo. Mas você não pode ter isto. Não pode ter este lugar ou estas pessoas.

Ela gesticulou para a comunidade que já começava a cuidar dos feridos. — Nós somos o que você jogou fora, pai. E construímos um lar com os pedaços.

Wei abriu a boca para falar, talvez para pedir um perdão que não merecia. Ela levantou a mão. — Vá. Volte para seu palácio vazio e seu trono frio. Viva com o que você fez. Essa será sua penitência.

Lorde Wei olhou para ela um longo momento, vendo a rainha que ela se tornara. Ele virou-se sem outra palavra, montou em seu cavalo e partiu, um homem quebrado deixando o mundo que tentara destruir.

Leanne virou-se para Kale e tomou a mão ferida dele na sua. O epílogo de sua velha vida fora escrito em sangue. O primeiro capítulo da nova estava apenas começando.


Dois anos se passaram. O cânion, agora chamado de “Refúgio de Enleanne”, era um assentamento próspero. Jardins em terraços subiam pelas paredes rochosas. O riso de crianças nascidas em liberdade ecoava onde antes havia gritos de batalha.

Certa noite, ao pôr do sol, Kale levou Leanne a um pequeno planalto com vista para o assentamento. O ar cheirava a terra úmida e fumaça de madeira. Ele pegou a mão dela. Em sua palma não estava o botão de jade, mas um anel simples esculpido na madeira escura da casa que foram forçados a abandonar.

Ele deslizou o anel no dedo dela. — Você é meu lar, Enleanne — disse ele, a voz cheia de uma emoção que não escondia mais.

Ela encostou a cabeça no ombro dele, olhando para as luzes cintilantes das casas lá embaixo, para a vida que haviam construído das cinzas da crueldade.

— Não — sussurrou ela, o coração transbordando. — Nós estamos em casa, juntos.

Eles permaneceram no crepúsculo, dois párias que haviam encontrado não apenas um ao outro, mas um mundo. Um mundo nascido de uma piada cruel, forjado na violência e redimido por um amor mais forte que qualquer exército, mais profundo que qualquer cicatriz.

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