O Destino Cruel de Amestris: Como o Orgulho de Xerxes e uma Promessa Bêbada Destruíram a Vida da Própria Filha

Você tem 14 anos, de pé em um salão preenchido por mil olhos. O homem que deveria protegê-la — seu pai, o governante mais poderoso da Terra — acaba de entregar seu corpo com uma única frase proferida em meio à embriaguez. No início, você não entende. Apenas sente a sala congelar. Os músicos calam-se; os nobres param de respirar. Do outro lado do banquete, o velho general que a solicitou, um homem mais velho que seu próprio avô, sorri.
Ele sabe que seu pai não pode recusar. Não aqui, na frente de todo o império. Suas mãos tremem; sua mãe cobre o rosto. Cada mulher no salão sabe exatamente o que acabou de acontecer. Sua vida não é mais sua. E seu pai, o Rei dos Reis, não olha para você. Ele olha para o próprio orgulho, para a imagem de um deus-imperador que não pode se permitir fraquejar. Quando ele fala, usa apenas uma palavra: “Concedido”.
Os convidados aplaudem. O general curva-se. Você permanece ali, engolindo um grito que ninguém jamais ouvirá. Porque, neste palácio, o sofrimento de uma filha vale menos que o ego de um rei. O nome dela era Amestris, e o que aconteceu com ela é um dos exemplos mais perturbadores de como o poder absoluto destrói até mesmo aqueles que finge amar.
Para entender Amestris, é preciso entender o mundo em que ela nasceu. Xerxes não era apenas um rei; ele governava um império que ia da Líbia ao Vale do Indo. Segundo Heródoto, sua palavra não era conselho, era lei. Mas o verdadeiro perigo estava dentro das muralhas. O tribunal persa era uma fortaleza de silêncio, onde a proximidade do poder absoluto significava a facilidade de ser esmagado por ele.
As filhas reais eram moedas políticas, ferramentas de aliança envoltas em joias. Amestris, no entanto, ocupava uma posição estranha. Nascida de uma concubina bactriana, sua beleza era descrita como excepcional. Xerxes a mantinha por perto, demonstrando uma afeição que, na corte persa, provaria ser o início de sua ruína. Tudo mudou em um banquete em 479 a.C.
Xerxes bebia há dias, cercado por bajuladores. Em um momento de bravata bêbada, ele jurou pelos deuses persas que concederia qualquer pedido feito a ele. Artabano, um general idoso e ambicioso, percebeu a oportunidade. Ele se levantou e pediu o impensável: a mão da filha do rei. O silêncio que se seguiu foi sufocante. Princesas reais quase nunca se casavam com súditos comuns, muito menos com generais decrépitos. Mas Xerxes havia feito um juramento público. Se recusasse, sinalizaria fraqueza para todo o império. Com o rosto pálido e as mãos agarradas ao trono, ele forçou a palavra: “Concedido”.
Amestris implorou em particular, mas Xerxes escolheu a imagem de governante impecável em vez da vida da filha. Três meses depois, o casamento ocorreu. Sob sedas e joias que valiam cidades inteiras, Amestris movia-se como uma performer treinada para esconder o desespero. Artabano, aos 60 anos, triunfava. Ele não queria apenas uma esposa; queria um vínculo de sangue com a linhagem aquemênida.
Amestris não entrou em um casamento; ela entrou em uma sentença. Artabano a manteve em isolamento quase total, proibindo-a de visitar sua família ou falar com suas irmãs. Na cultura persa, onde os laços femininos eram vitais, isso foi especialmente cruel. Ela era uma prisioneira em seus próprios aposentos. Xerxes, envergonhado e incapaz de admitir o erro, nunca respondeu aos pedidos de socorro da filha.
O tratamento de Artabano era obsessivo. Apesar da idade avançada, ele submetia Amestris a exigências matrimoniais forçadas e frequentes, obcecado em produzir um herdeiro real. Médicos e especialistas em fertilidade eram convocados constantemente. Ela não era vista como esposa, mas como um vaso. Três anos depois, em 476 a.C., Amestris engravidou. Enquanto Artabano oferecia sacrifícios de gratidão, Amestris mergulhava na tristeza profunda. Ela sabia que um filho a prenderia àquele homem para sempre.
O parto durou dois dias. O bebê, um menino chamado Xerxes, nasceu perigosamente fraco e morreu dez dias depois. Nos corredores do palácio, rumores sombrios surgiram: alguns diziam que Amestris, em total desespero, tirara a vida do próprio filho para libertá-lo daquele destino. Outros diziam que servos leais negligenciaram a criança para poupar a princesa.
A morte do bebê desencadeou o terror. Convencido de que Amestris era responsável, Artabano tornou-se fisicamente abusivo. Gritos eram ouvidos atrás das portas; Amestris aparecia com hematomas no rosto e nos braços. Em uma ocasião, ela foi espancada tão severamente que ficou acamada por semanas. Quando o corpo sarou, algo dentro dela já havia morrido. Ela parou de comer, parou de falar, movendo-se como uma sombra oca.
Xerxes foi informado, mas sua autoridade agora valia pouco. Artabano sabia da fraqueza do rei. O homem que criou o sofrimento de Amestris era o mesmo homem que não podia mais impedi-lo. Quatorze anos após o casamento, o destino finalmente mudou. Xerxes foi assassinado em um golpe liderado pelo próprio Artabano. Em uma exibição hipócrita de cinismo, o general justificou o assassinato dizendo que Xerxes era um tirano fraco por ter sacrificado a própria filha.
O golpe durou sete meses até que o filho de Xerxes, Artaxerxes, esmagou a rebelião e executou Artabano. Poderia ser a liberdade de Amestris, mas aos 28 anos, ela parecia ter décadas a mais. Seus cabelos estavam grisalhos, seu olhar vacante. Artaxerxes tentou restaurar o lugar dela na corte, oferecendo-lhe autonomia e luxo, mas ela raramente saía de seu quarto. Um dia, músicos tocaram uma melodia que ela costumava dançar antes daquela noite fatídica. Ao ouvir, Amestris soltou um grito dilacerante, quebrou os instrumentos e desabou em lágrimas — as primeiras em anos.
Amestris morreu aos 36 anos. As fontes falam em doença prolongada, mas a verdade era a inanição voluntária — a única forma de controle que lhe restava. Ela não morreu em 457 a.C.; ela morreu na noite em que seu pai disse “concedido”. Seu espírito fora apagado duas décadas antes de seu corpo desistir.
As inscrições oficiais nunca mencionam Amestris. Xerxes é lembrado como o construtor de Persépolis, não como o pai que sacrificou a filha por orgulho. A tragédia de Amestris é a tragédia de todos que vivem sob autoridade irrestrita, onde a vontade de um indivíduo torna-se o destino de todos abaixo dele. Xerxes não a golpeou nem ordenou sua morte, mas através de uma promessa descuidada para impressionar sua corte, ele a destruiu tão certamente quanto qualquer carrasco.
Os maiores horrores da história nem sempre acontecem em guerras ou rebeliões, mas em decisões silenciosas tomadas atrás das muralhas do palácio. Decisões que homens poderosos nunca revisitam, mas das quais seus filhos nunca escapam.