Minha mãe jogou fora minha insulina dizendo que “a oração cura melhor” — horas depois, eu estava em coma e os paramédicos queriam saber se aquilo era uma tentativa de assassinato

A água azulada girava na privada enquanto minha vida escorria pelo ralo. “É para o seu bem”, disse minha mãe, despejando o último frasco de insulina no vaso sanitário. “Você está dependente de remédios dos homens, quando deveria confiar na cura de Deus.”

Meu nome é Hannah Morrison, tenho 22 anos e sou diabética tipo 1 desde os 15. Em sete anos, nunca havia esquecido uma dose. Nunca brinquei com a doença que matou meu avô antes mesmo da insulina ser inventada. Até que meus pais decidiram que minha sobrevivência era negociável.

Já sentia os sintomas da glicose subindo. Minhas mãos tremiam, não de raiva, mas por hiperglicemia. Supliquei: “Por favor, deixe-me pegar meu kit de emergência”. Ela negou. “Joguei fora também.”

Meu pai bloqueava a porta. “Sua mãe está certa. Alimentamos sua falta de fé por tempo demais.”

Fui arrastada para a sala, onde membros da igreja já se reuniam. Pastor Williams, o círculo de oração, todos prontos para “orar até que Deus agisse”. Meu celular foi confiscado. Fiquei no centro do círculo, sentindo a sede extrema e a visão começando a embaçar. Interromper a oração era visto como falta de fé.

Na segunda hora, me ungiram com óleo. Eu estava enjoada, a glicemia provavelmente acima de 400. Vomitei. Celebraram: “O mal está saindo”. Mas era meu corpo entrando em acidose.

Na quarta hora, não conseguia mais me sentar. Me deitaram no sofá. A visão escurecia. Achei que ia morrer. Foi então que lembrei da pulseira.

Seis meses antes, após outro “teste de fé” que me levou ao pronto-socorro, procurei a advogada Jennifer Martinez, especialista em direitos médicos. Ela preparou proteções legais e me deu uma pulseira de alerta médico com instruções claras: “Em caso de emergência ou recusa de medicamento, contatar J. Martinez, advogada”.

Quando uma senhora da igreja, enfermeira aposentada, foi me ajustar no sofá, leu a pulseira. “Ela é diabética tipo 1, precisa de insulina. Quando foi a última dose?” “Esta manhã”, sussurrei. “Minha mãe jogou o resto fora.”

A enfermeira ligou para o 911, apesar dos protestos dos meus pais. Parâmetros: 8 horas sem insulina, respiração frutada, paciente semiconsciente.

Paramédicos chegaram em seis minutos. Meus pais tentaram impedir a entrada. O líder da equipe, Grace, ordenou o protocolo: glicemia acima de 600, iniciar fluidos, administrar insulina. Minha mãe tentou impedi-la. Grace respondeu: “Se você interferir, será presa.”

Ao verem a pulseira, ligaram para a advogada. Jennifer atendeu no segundo toque. Em minutos, confirmou a situação com Grace e disse que encontraria a equipe no hospital e que também estava notificando a polícia.

Fui internada na UTI. Três dias de fluidos, insulina e monitoração até meu corpo se estabilizar. Jennifer colheu meu depoimento. “Eles já fizeram isso antes, escondendo insumos, atrasando doses. Desta vez, foi pior.”

O caso foi parar na Justiça e chamou atenção nacional. Meus pais foram acusados de tentativa de homicídio, reduzida para perigo consciente após confissão. Receberam dois anos de liberdade condicional, treinamento sobre diabetes tipo 1 e tiveram que pagar pelos custos hospitalares e terapia.

Mas a verdadeira vitória foi a ordem de restrição. Eles não podiam mais chegar perto de mim. Nem do meu irmão de 16 anos, que começava a mostrar sinais da doença. Ele veio morar comigo. Medimos nossa glicemia juntos. Não pulamos doses. Nunca.

Frequentamos outra igreja. Uma que acredita que Deus também atua através da medicina. A pulseira agora está atualizada. Em caso de recusa de medicamento, acione a advogada. “Perseguirão judicial será aplicada”.

Um ano depois, minha hemoglobina está perfeita. Meus pais escrevem cartas, pedindo perdão. Dizem que agiram por amor. Talvez tenham amado, mas amaram mais sua ideia de fé do que minha vida.

Na farmácia, uma jovem me abordou. Estava comprando insulina, as mãos tremendo. “Ouvi sobre seu caso. Meus pais também acham que devo confiar em Deus, não na insulina.”

Dei a ela o cartão da Jennifer. “Confie em Deus se quiser. Mas tome sua insulina primeiro. Ele deu sabedoria aos cientistas por um motivo.”

Ela sorriu, guardando o cartão. “Minha mãe diz que usar remédio é falta de fé.” Respondi: “Morrer de algo evitável é falta de bom senso.”

Rimos. Humor ácido nos uniu. Sobreviventes de um amor perigoso. Porque fé verdadeira não é negar a realidade. É agradecer a Deus pela insulina e pelas pessoas que a trazem quando você mais precisa.

Fé é usar a pulseira que diz: “Ligue para minha advogada.” Porque amor, quando condicionado, pode ser fatal. Mas sobreviver e ainda acreditar em algo maior que o medo — isso sim é fé.

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