Era 1887. O sol de inverno pendia pálido sobre Pine Hollow, sua luz frágil como vidro. Poeira caía pela rua vazia, onde as persianas batiam como mãos cansadas contra as molduras de madeira. O ar trazia o fantasma da neve, frio, cortante e fino, e por ele vinha uma mulher com quatro crianças pequenas atrás de si, cada uma descalça, cada uma em silêncio.
Seu nome era Ila May Carter, embora a maioria das pessoas que a viu naquela manhã nunca se importasse em perguntar. Ela havia caminhado 45 quilômetros desde o amanhecer, os pés em carne viva, seu corpo tremendo sob um xale esfarrapado que já fora branco. O mais novo, o pequeno Sam, choramingava suavemente, seus lábios rachados de sede. As mãos de Ila tremiam enquanto ela segurava um pequeno pedaço de ouro, a única coisa que ela ainda possuía de sua antiga vida: uma aliança de casamento. Seu brilho havia desaparecido, assim como sua esperança.
Quando ela chegou à loja geral, suas pernas quase cederam. O sino de bronze sobre a porta tilintou, mas ninguém dentro olhou para cima. Os fazendeiros, reunidos perto do balcão, conversavam em vozes baixas. O riso deles morreu quando a sombra de Ila cruzou o chão de madeira. A mulher que gerenciava a loja, dona Wilma Granger, olhou para Ila como se fosse um fantasma saindo do deserto.
Ila ficou ali por um momento, sem fôlego. Sua voz, quando surgiu, rachou como gravetos secos. “Senhora, por favor. Preciso de comida para meus filhos. Eu posso trabalhar ou…” Ela hesitou, então estendeu a aliança com dedos trêmulos. “A senhora compraria o meu anel de casamento?”
O silêncio engoliu a sala. Os homens trocaram olhares desconfortáveis. Dona Granger cruzou os braços. “Aqui não é casa de penhor,” ela disse com frieza. “Tente a igreja.” “Eu já tentei,” Ila sussurrou. “A igreja está vazia.”
Um menino puxou sua saia. “Mamãe, estou com fome,” disse Toby, a voz pequena como um pássaro ferido. O marido de dona Granger tossiu. “Moça, é melhor ir embora. Por aqui, ninguém gosta de mendigar.”
Os ombros de Ila caíram. Os olhos das crianças seguiam um pão atrás do vidro do balcão como se fosse um milagre que eles não pudessem tocar. Ela tentou manter sua dignidade, endireitando a espinha, embora suas costelas doessem de fome. “Por favor,” disse ela novamente, mais suavemente agora, como se estivesse suplicando para o próprio céu.
A porta da loja se abriu, deixando entrar uma rajada de vento e uma nuvem de poeira. Botas soaram firmemente no limiar. Um homem alto entrou silenciosamente, tão calado quanto uma sombra. Seu casaco estava remendado por anos de trabalho, seu chapéu inclinado para baixo, o queixo coberto por dias de barba. Seu nome era Mikuel Boon, embora ninguém na cidade o chamasse de nada em particular. Diziam que ele perdera a mulher que amava no último inverno rigoroso, e com ela, sua vontade de falar mais do que o necessário.
Ele parou, os olhos passando do anel para as crianças, para os hematomas visíveis sob a manga de Ila. A sala parecia se silenciar ao seu redor. Então, sem dizer uma palavra, ele tirou da jaqueta algumas moedas de prata e as colocou sobre o balcão.
“Ela vai levar pão, feijão e o que sobrar do almoço,” disse ele, sua voz tranquila, mas firme.
Dona Granger franziu a testa. “Você a conhece, Mikuel?”
Ele olhou para Ila e então balançou a cabeça. “Não, senhora, mas eu sei o que é fome quando vejo.”
Ila piscou, sem saber se deveria agradecer a ele ou recusar. “Não posso aceitar sua caridade, senhor,” disse ela, seu orgulho cortando a exaustão.
Ele olhou nos olhos dela, cinzentos e inquebráveis. “Então não chame isso de caridade.”
Ele mesmo pegou a comida, enchendo um saco pequeno. As crianças assistiram, os olhos arregalados, enquanto ele entregava à mãe. Então, ele acenou para a porta. “Vamos, eu vou levar vocês para um lugar quente.”
Os murmúrios os seguiram enquanto saíam. A voz de dona Granger cortou o ar, aguda como o vento. “Viúva com suas crianças sozinha com esse homem. Vergonhoso.”
O som picou, mas Ila nada disse. As crianças seguiram de perto enquanto Mikuel as conduzia até uma carroça gasta esperando perto do poste de amarrar. Os cavalos soltaram vapor na aragem gelada. Ele levantou Sam no banco de trás com uma gentileza que o surpreendeu, até ele mesmo.
“Vamos estar em casa antes do anoitecer,” murmurou ele.
Eles viajaram em silêncio pela planície aberta. A terra se estendia sem fim, o dourado desbotando para o cinza sob o crepúsculo que caía. A carroça rangia, o vento assobiava baixo pela grama, e o mundo parecia prender a respiração.
Por fim, luzes piscavam à distância, uma pequena cabana na beira de um riacho congelado. Fumaça subia de sua chaminé, enrolando-se como uma promessa na noite.
Dentro, o calor atingiu seu rosto como uma misericórdia. O cheiro de fumaça de madeira e ensopado preencheu o ar. Mikuel colocou o saco e mexeu na panela que pendia sobre a lareira. “Não é luxo,” disse ele calmamente, “mas vai encher suas barrigas.”
As crianças comeram primeiro, suas pequenas mãos tremendo enquanto enfiavam feijão nas bocas. Ila ficou de costas, lágrimas caindo silenciosamente em seu rosto. Quando percebeu que ele estava observando-a, ela virou-se, envergonhada pela sua fome.
“Você também deveria comer,” disse ele simplesmente.
Ela assentiu, mas só pegou um pouco.
“Obrigada, senhor. Eu vou trabalhar para te pagar. Eu sei cozinhar qualquer coisa.”
Ele largou a colher.
“Você não é minha serviçal, senhora.”
“Então o que sou?”
Ele olhou para o fogo.
“Uma hóspede que fez uma caminhada longa demais.”
As palavras atingiram algo dentro dela. A bondade, pura e não merecida, parecia mais pesada que a crueldade. Ela queria chorar de novo, mas as lágrimas não viriam desta vez.
Após a refeição, ele deu cobertores para as crianças e deixou-as dormir perto do fogo. O menor Sam se enrolou contra o velho cachorro deitado no tapete. Ila sentou-se quieta na borda da cadeira, as mãos dobradas, o anel ainda apertado na mão.
Mikuel se encostou na parede, braços cruzados.
“Para onde você estava indo?” ele perguntou.
“Não tenho mais para onde ir,” ela disse. “Meu marido morreu no último inverno. O senhorio disse que estou atrasada no aluguel. Depois os homens vieram.” Sua voz falhou. “Eles pegaram o que queriam e me disseram para ir embora.”
Ele olhou para ela, sua mandíbula se apertando.
“Não vai mais ninguém te tocar aqui,” ele disse suavemente.
O ar entre eles ficou pesado. Ela olhou para ele, e pela primeira vez, sentiu algo quebrar dentro de si. Uma esperança, mas também medo.
Ela não sabia o que aconteceria depois. Mas com Mikuel, ela sentia que tinha uma chance.