O sol queimava impiedoso sobre a pequena Mary enquanto ela caminhava lentamente pelas ruas do bairro mais rico da cidade. Em suas mãos calejadas, ela segurava uma sacola plástica pesada, cheia de laranjas. Ela tinha apenas nove anos de idade, mas caminhava com o peso de alguém muito mais velho. Seus pés doíam após horas de caminhada, e seu estômago estava vazio desde o amanhecer.

Mas Mary não reclamava. Cada passo que ela dava era por sua mãe, Clara, que jazia doente em casa, incapaz de trabalhar e precisando desesperadamente de remédios que elas não podiam pagar. Vender laranjas era tudo o que Mary podia fazer. Ela ia de casa em casa, batendo em portões gigantescos, esperando que alguém comprasse algo.
A maioria das pessoas a ignorava. Alguns diziam “não” e fechavam as portas sem um segundo olhar. Mas ela não desistia. Sua mãe sempre lhe dissera para ser forte e nunca parar de tentar.
Então, ela viu o maior portão que já vira na vida. Atrás dele, erguia-se uma mansão imensa, com paredes brancas imaculadas e janelas altas, cercada por flores vibrantes e árvores antigas. Mary parou, imóvel, encarando a propriedade. A casa parecia um palácio saído de um livro de contos de fadas. Mas havia algo triste nela também. Era quieta demais. Parecia que ninguém vivia realmente lá.
Mary respirou fundo, reuniu toda a sua coragem e caminhou até o portão. Ela pressionou o pequeno botão do interfone na parede. Segundos se passaram e Mary pensou que talvez não houvesse ninguém em casa. Então, ouviu um som de estática vindo do alto-falante.
— Quem é? — perguntou uma voz profunda e grave.
Mary pigarreou, tentando fazer sua voz soar mais forte. — Hum, olá, senhor. Meu nome é Mary. Estou vendendo laranjas. O senhor gostaria de comprar algumas? Elas são muito frescas e doces.
Houve um longo silêncio. Mary esperou, o coração batendo rápido. Ela estava prestes a ir embora quando a voz falou novamente. — Quanto custam?
O rosto de Mary se iluminou de esperança. — Cinco laranjas por dois dólares, senhor. Ou dez por três dólares. É um preço muito bom.
Outra pausa. Então a voz disse: — Espere aí.
Mary esperou junto ao portão, trocando a sacola pesada de uma mão para a outra. Seus braços estavam cansados e sua garganta seca. Ela não bebia água há horas. Mas se esse homem comprasse suas laranjas, ela poderia comprar o remédio de sua mãe hoje. Esse pensamento a manteve de pé.
Depois do que pareceu uma eternidade, ela ouviu passos se aproximando. O portão zumbiu alto e se abriu lentamente.
Um homem alto estava diante dela. Ele vestia roupas caras, uma camisa branca impecável e calças pretas perfeitamente passadas. Seus sapatos brilhavam e seu relógio parecia custar mais do que a casa inteira de Mary. Seu rosto era bonito, mas marcado pelo cansaço, com olhos tristes que pareciam carregar pensamentos pesados. Havia um pouco de grisalho em seu cabelo, embora ele não parecesse muito velho.
Este era Marcus, embora Mary ainda não soubesse seu nome. Ele olhou para a garotinha com seu uniforme escolar desgastado e sapatos sujos. Por um momento, algo estranho brilhou em seus olhos. Talvez surpresa, talvez confusão.
— Entre — disse ele calmamente.
Mary hesitou. Sua mãe sempre a avisara para nunca entrar na casa de estranhos, mas aquele homem não parecia perigoso. Ele parecia solitário e profundamente triste.
— Está tudo bem — disse Marcus, vendo a preocupação no rosto dela. — Vou comprar todas as suas laranjas. Você pode ficar aqui perto do portão se estiver com medo.
— Todas elas? — Os olhos de Mary se arregalaram de choque. Ela tinha vinte laranjas na sacola. Isso daria seis dólares. Era mais dinheiro do que ela costumava fazer em três dias inteiros.
— Sim, todas.
Marcus tirou a carteira do bolso, mas então parou e olhou para ela com mais atenção. — Quando foi a última vez que você comeu?
O estômago de Mary roncou alto, respondendo por ela. Ela sentiu as bochechas queimarem de vergonha e olhou para os pés. O rosto cansado de Marcus se suavizou.
— Venha para dentro. Deixe-me pegar algo para você comer primeiro. Depois eu pago pelas laranjas.
Mary sabia que não deveria entrar, mas a fome doía. E a voz do homem era gentil. Ela assentiu devagar e o seguiu pelo caminho de pedras. O jardim era ainda mais bonito de perto, mas parecia vazio, como um jardim onde nenhuma criança brincava.
Marcus abriu a grande porta da frente e Mary entrou. Ela engasgou. O teto era tão alto que ela teve que inclinar a cabeça para trás para vê-lo. Tudo brilhava. Pisos de mármore, lustres de cristal, móveis macios. Mas a casa parecia fria. Não fria como gelo, mas fria como a solidão. Não havia cheiro de comida, nem vozes, nem risadas. Apenas um silêncio que fez Mary se sentir pequena.
— Espere aqui — disse Marcus, apontando para uma cadeira perto da entrada. — Vou trazer comida para você.
Mary sentou-se com muito cuidado, com medo de sujar a cadeira cara. Seus olhos percorreram o saguão, absorvendo tudo. Então, ela viu.
Em uma pequena mesa de madeira perto da escadaria, havia uma foto em uma moldura de ouro. A moldura era brilhante, mas a foto parecia um pouco antiga. Mary levantou-se devagar e se aproximou. Seu coração começou a bater cada vez mais rápido.
Ela pegou o porta-retratos com as duas mãos, que agora tremiam.
A mulher na foto parecia mais jovem e muito mais saudável do que Mary se lembrava, mas era inconfundível. Ela usava um lindo vestido azul e ria para quem quer que estivesse tirando a foto. Seu cabelo era longo e escuro, e seu sorriso era cheio de alegria. O tipo de sorriso que Mary não via no rosto de sua mãe há muito tempo.
Mas Mary conhecia aquele rosto. Ela o via todos os dias.
Era a mãe dela. Era Clara.
As mãos de Mary tremiam enquanto ela segurava a moldura com mais força. Sua mente girava com perguntas. Por que a foto de sua mãe estava na casa desse estranho rico? Sua mãe nunca mencionara conhecer pessoas ricas. Na verdade, Clara nunca falava sobre sua vida antes de Mary nascer.
Ela ouviu passos atrás de si e se virou rapidamente. Marcus havia retornado carregando uma bandeja com sanduíches e suco. Mas quando viu o que Mary estava segurando, ele parou bruscamente.
A bandeja tremeu em suas mãos. Seu rosto ficou completamente branco, como se todo o sangue tivesse sido drenado. Seus olhos estavam fixos na fotografia, depois no rosto de Mary, e de volta à fotografia.
— Essa… essa é a minha mãe — disse Mary suavemente, a voz pouco mais que um sussurro.
Ela ergueu a moldura para que ele pudesse ver melhor. — Por que a foto da minha mãe está na sua casa?
A boca de Marcus se abriu, mas nenhuma palavra saiu. Ele parecia alguém que acabara de receber a notícia mais chocante do mundo. Ele colocou a bandeja em uma mesa próxima com cuidado, movendo-se lentamente como se estivesse prestes a cair.
— Sua… sua mãe? — A voz dele falhou. — Qual é o nome da sua mãe?
— Clara — respondeu Mary. — O nome dela é Clara.
Marcus deu um passo para trás, apoiando-se na parede. — Clara… — Ele repetiu o nome como se fosse uma oração e uma pergunta ao mesmo tempo. — Clara é sua mãe?
Mary assentiu. — Senhor, o senhor está bem? O senhor conhece a minha mãe?
Marcus passou a mão pelo cabelo, um gesto de desespero. Ele sentou-se pesadamente na cadeira mais próxima. — Conhecê-la? — ele disse baixinho. — Sim… sim, eu a conheci. Há muito tempo.
Ele olhou para Mary com olhos que agora brilhavam com lágrimas. — Quantos anos você tem?
— Tenho nove, senhor. Farei dez em três meses.
Marcus fechou os olhos e respirou fundo, trêmulo. Mary nunca tinha visto um homem adulto parecer tão abalado. — Onde está sua mãe agora? — Marcus perguntou, abrindo os olhos. Havia urgência em sua voz. — Onde está Clara?
— Ela está em casa, senhor. No nosso apartamento. Ela está muito doente. É por isso que estou vendendo laranjas, para comprar o remédio dela.
Ao mencionar a doença da mãe, os olhos de Mary se encheram de lágrimas. — Me leve até ela — Marcus interrompeu, levantando-se de repente. — Por favor, me leve até sua mãe agora mesmo.
Mary recuou, assustada. — Mas eu não entendo. Por que o senhor tem a foto dela?
Marcus olhou para a garotinha à sua frente. Ele podia ver Clara no rosto dela. Os mesmos olhos, a mesma expressão gentil. Seu coração batia tão forte que doía. — Mary — disse ele, tentando manter a voz firme. — Eu preciso te perguntar uma coisa muito importante. Você… você tem pai?
O rosto de Mary caiu. Era a pergunta que ela mais odiava. — Não, senhor. Não tenho pai. Somos só eu e a mamãe. Sempre fomos só nós duas.
Algo quebrou dentro de Marcus ao ouvir aquelas palavras. Ele cobriu o rosto com as mãos por um momento. Quando olhou para cima novamente, seus olhos estavam vermelhos.
— Mary, acho que sei por que sua mãe nunca falou sobre seu pai. E acho que sei por que ela teve que te criar sozinha. Eu preciso vê-la.
Mary estava confusa, mas o homem parecia sincero. — O senhor estava procurando por ela?
— Sim — sussurrou Marcus. — Por dez anos, eu tenho procurado por ela.
Marcus puxou a carteira e entregou várias notas a Mary. Cem dólares. — Isso é muito dinheiro! — exclamou Mary. — Fique com ele. Compre o remédio. E diga à sua mãe que Marcus quer vê-la. Diga a ela que eu sei que ela está viva e que não estou bravo. Diga… diga que eu só quero conversar.
Mary pegou o dinheiro e um papel onde ele escreveu seu número. — O senhor… quero dizer, Marcus… o senhor é meu pai?
A pergunta pairou no ar. Marcus olhou para a menina corajosa. — Eu não sei com certeza ainda — disse ele honestamente. — Mas Mary, eu acho que posso ser. E se eu for… sinto muito por não ter estado lá. Se eu soubesse que você existia, nada neste mundo teria me mantido afastado.
Mary correu todo o caminho para casa. Quando chegou ao apartamento minúsculo e úmido, encontrou Clara deitada no colchão fino, tossindo.
— Mãe! — Mary gritou. — Um homem comprou todas as laranjas! Ele nos deu cem dólares!
Clara tentou sorrir, mas então viu a expressão no rosto da filha. — O que foi, querida?
— O nome dele é Marcus.
O sangue drenou do rosto de Clara. Ela agarrou o braço de Mary. — O que você disse?
— Marcus. Ele tem uma foto sua na mansão dele. Ele chorou quando eu disse que você era minha mãe. Ele disse que está te procurando há dez anos.
Clara começou a tremer de terror. — Não, não, não… Ele nos encontrou. Temos que ir embora, Mary. Temos que fugir hoje à noite.
— Por quê?! — Mary chorou. — Ele foi bonzinho! Ele quer nos ajudar!
— Porque a família dele nunca vai nos deixar em paz! — Clara soluçou. — Porque eu te escondi dele por nove anos!
Clara olhou para a filha confusa e percebeu que não podia mais correr. Era hora da verdade. — Mary… Marcus é seu pai.
Ouvir aquilo em voz alta tirou o fôlego de Mary. — Então por que fugimos?
— Porque a mãe dele, sua avó, é uma mulher poderosa e terrível — explicou Clara, chorando. — Quando fiquei grávida, ela me ameaçou. Disse que me colocaria na prisão se eu não desaparecesse. Ela disse que Marcus nunca mais queria me ver. Eu era jovem, pobre e estava apavorada. Então eu fugi para te proteger.
— Mas mãe… — disse Mary firmemente. — Marcus não sabia. Ele disse que a mãe dele mentiu para nós dois. Ele disse que te ama. Ele quer te ver.
Clara olhou para o papel com o número de telefone. O medo lutava contra o amor que ela ainda sentia. — Se ligarmos para ele… e se a mãe dele tentar nos machucar de novo?
— Então enfrentaremos ela juntos — disse Mary. — Você, eu e o papai. Como uma família.
Naquela tarde, com as mãos trêmulas, Clara ligou para o número. Marcus atendeu no primeiro toque. A reunião no pequeno apartamento foi cheia de lágrimas, abraços e pedidos de perdão. Marcus segurou Clara e Mary como se fossem as coisas mais preciosas do mundo.
— Minha mãe roubou dez anos de nós — disse Marcus, com a voz trêmula de raiva e tristeza. — Mas ela nunca mais vai tocar em vocês.
Marcus levou Clara e Mary para o melhor hospital da cidade. Ele não se importava com o custo; ele só queria Clara saudável. Enquanto ela se recuperava, um teste de DNA confirmou o que seus corações já sabiam: Mary era filha de Marcus. 99,9% de compatibilidade.
Mas Marcus tinha uma última batalha a travar.
Ele dirigiu até a mansão de sua mãe, Catherine. Ele entrou sem bater e a encontrou tomando chá, fria e elegante como sempre.
— Onde você estava na noite de 15 de março, dez anos atrás? — ele perguntou. — Não sei do que você está falando — respondeu ela, indiferente. — Você sabe. Foi a noite em que você ameaçou Clara. A noite em que você expulsou a mulher que eu amava e a neta que você nem sabia que existia.
Catherine empalideceu. — Ela estava grávida? — Sim. Tenho uma filha de nove anos. Ela vendia laranjas na rua para sobreviver por causa do que você fez.
Marcus deu um ultimato à mãe: ou ela aceitava a família dele com respeito e amor, ou nunca mais veria o filho ou a neta. Pela primeira vez na vida, a inabalável Catherine quebrou. O medo de perder o filho para sempre a fez perceber o erro terrível que cometera.
Semanas depois, Clara recebeu alta do hospital. Ela não voltou para o apartamento úmido. Ela, Marcus e Mary foram para a mansão — que agora estava cheia de risadas, flores novas e vida.
Catherine pediu perdão. Foi um processo lento, mas com o tempo, as feridas começaram a cicatrizar. Mary ganhou uma avó que, embora rigorosa, tentava compensar os anos perdidos.
Um mês depois, Marcus e Clara se casaram no jardim da mansão. Mary foi a daminha de honra.
Anos mais tarde, Mary contava aos seus próprios filhos a história de como seus avós se reencontraram. — Sua avó estava vendendo laranjas e bateu na porta de um estranho — dizia ela. — Mas aquele estranho era o pai dela. E aquela única pergunta, “Por que a foto da minha mãe está na sua casa?”, mudou tudo.