Ela Estava Secretamente Dormindo Dentro da Igreja Quando Um Homem Entrou, Chorando, E O Que Ele Fez Lá Mudou Tudo…

Era apenas uma blusa rasgada, um detalhe quase invisível, um acidente bobo. Ou pelo menos, foi nisso que Clara tentou acreditar. Mas bastou um olhar, uma risada, para que aquele pequeno rasgo no tecido se transformasse em algo muito maior, um abismo entre o que ela sentia e o que os outros viam.

Às vezes, é em um instante como esse, aparentemente trivial, que tudo desmorona. E quando o silêncio de casa já não serve como refúgio, o único caminho é fugir até descobrir, em algum lugar inesperado, que não precisamos ser perfeitos para sermos vistos.

O sol estava se pondo quando Clara desceu do ônibus, as últimas cores do dia se espalhando pelo céu como uma aquarela desbotada. Foi nesse momento que ela sentiu. Quase imperceptível, o puxão na manga de sua blusa lilás. Em segundos, um pequeno gancho de metal transformou a peça que ela mais gostava em um pedaço em ruínas, abrindo um rasgo que ia do ombro até quase a cintura. Seu coração afundou. Era a blusa que ela havia escolhido com tanto cuidado para a excursão escolar do dia seguinte. A única que ainda fazia ela se sentir bonita, depois de meses tentando encontrar seu lugar em uma cidade nova, uma escola nova, uma vida nova que seus pais haviam escolhido para ela.

“É nada”, murmurou para si mesma, ajustando a mochila para cobrir o rasgo. “Ninguém vai perceber.”

Mas perceberam, especialmente ele, Lucas, o garoto de olhos verdes que se sentava duas fileiras à frente de Clara na aula de literatura. O garoto que escrevia poesias nos cantos de seus cadernos quando achava que ninguém estava olhando. O garoto cujo sorriso fazia o estômago de Clara revirar desde o primeiro dia de aula.

Foi no pátio central da escola, com o sol da manhã forte demais para Clara se esconder nas sombras, que o rasgo foi exposto. A mochila escorregou, e a risada de Lucas veio como um golpe.

“Uau, Clara, sua blusa está parecendo como me sinto nas segundas-feiras”, ele gritou, apontando, e o pátio inteiro parecia virar-se em sua direção. As risadas explodiram ao seu redor como pequenas bombas. Clara sentiu o calor subindo pelo seu pescoço, invadindo suas bochechas, queimando seus olhos.

Maria, a popular garota do terceiro ano, rapidamente sacou o celular e capturou sua humilhação em pixels perfeitos. Clara não esperou o próximo momento. Não esperou o sinal, a chamada, a aula de história que costumava adorar. Virou-se e correu, com as risadas a perseguindo como fantasmas.

Sua casa ficava a 20 minutos a pé da escola. Era uma casa de dois andares com grandes janelas e um pequeno jardim que sua mãe tentava manter vivo. Clara abriu a porta com a chave, agradecendo ao universo por ninguém estar em casa ainda. Subiu as escadas sem tirar os sapatos, algo que normalmente lhe renderia um olhar reprovador de sua mãe.

Seu quarto ficava no final do corredor, ao lado do quarto de Beatriz, sua irmã de 8 anos, dona de uma impressionante coleção de desenhos na geladeira e performances de dança na sala que recebiam aplausos entusiásticos de seus pais.

Ela jogou a mochila no chão e se deixou cair na cama, seus olhos fixos no teto onde ela havia colado pequenas estrelas fluorescentes anos atrás, quando ainda acreditava que os sonhos brilhavam no escuro.

As horas passaram lentamente. Ela ouviu quando sua mãe chegou, seguida de Beatriz, tagarelando sobre seu dia perfeito na escola. Ouviu quando seu pai chegou, o som de suas chaves na mesa de entrada, sua voz grave perguntando o que tinha para o jantar. O cheiro de molho de tomate e alho subia pelas escadas.

“Clara, o jantar está pronto.”

A voz de sua mãe atravessou a porta, mas Clara não se moveu.

Após alguns minutos, passos subiram as escadas, uma batida suave na porta.

“Clara, está tudo bem, querida?”

“Não estou com fome”, ela respondeu, sua voz baixa. “Você precisa comer alguma coisa. Foi um dia difícil na escola?” A pergunta flutuava no ar, como um salva-vidas. Mas havia algo no tom de sua mãe, aquele automatismo, aquela pressa disfarçada de alguém que já tinha a próxima tarefa esperando, que a impediu de pegar a oportunidade.

“Não, só estou cansada.”

“Tudo bem, eu vou deixar um prato para você, caso mude de ideia.”

Passos se afastando, as vozes retomando a conversa lá embaixo. O riso de Beatriz. A vida continuando sem ela, ao redor dela, através dela.

Clara viu como os olhos de seu pai brilhavam quando Beatriz recitava a tabuada. Como sua mãe guardava todos os desenhos que Beatriz fazia, enquanto suas redações premiadas do colégio ficavam esquecidas em alguma gaveta. Ela não queria ser o centro das atenções. Ela só queria ser vista. Verdadeiramente vista.

Naquela noite, enquanto todos dormiam, Clara arrumou uma mochila com algumas roupas, um caderno, uma escova de dentes e seu pequeno ursinho de pelúcia marrom, que ela havia escondido de todos por anos.

Contou as economias que tinha guardado em uma lata de biscoitos, 217 reais, e os colocou em um envelope. Em um pedaço de papel, escreveu: “Preciso de um tempo. Não se preocupem comigo.”

Deixou a nota na cama arrumada e saiu pela porta dos fundos antes do sol nascer.

O primeiro dia foi quase uma aventura. Caminhou por ruas que nunca tinha explorado, comprou um sanduíche em uma padaria onde ninguém a conhecia, e assistiu as pessoas viverem suas vidas sem saber que ela estava fugindo da sua.

Mas quando a noite caiu, a realidade do que fizera começou a pesar sobre ela. Encontrou um banco em uma praça arborizada, longe das luzes principais, e tentou dormir. A brisa de verão, que deveria ser agradável, parecia cortar sua pele como pequenas lâminas de gelo. Cada som, um galho quebrando, um carro passando, fazia seu coração pular. O medo começou a se instalar, enrolando-a como uma cobra.

E então, ela se lembrou da igreja que havia passado ao longo do caminho, com suas janelas de vidro colorido e uma porta de madeira escura. Talvez ali ela pudesse encontrar algum alívio. Sem mais coragem para continuar sua fuga, Clara entrou na igreja. O silêncio lá dentro não era vazio ou assustador como na praça. Era reconfortante.

Ela se sentou no último banco, observando as pessoas orando. Quando o último visitante saiu, Clara decidiu se esconder atrás do altar, onde havia notado um banco escondido. E ali, naquele pequeno espaço, ela adormeceu pela primeira vez em dois dias.

O som da porta abrindo a acordou. Ela tentou controlar a respiração, tentando fazê-la quase inexistente.

Foi então que ela viu um homem entrar. Ele parecia cansado, seus ombros caídos, seus passos lentos. Ele não parecia ser um ladrão, não estava procurando nada para roubar. Seus olhos estavam fixos no altar. Quando chegou ao centro da igreja, seus ombros começaram a tremer. Clara o observou enquanto ele se ajoelhava e começava a chorar. Era uma dor que ela sentiu dentro de si, como se ele estivesse falando algo que ela mesma havia guardado.

“Por que, Deus? Por que isso aconteceu?” Ele sussurrava entre os soluços. “Eu tentei ser um bom pai. Eu só queria que ele fosse forte…”

As palavras dele foram como um espelho. Clara se perguntou se seus pais sentiam o mesmo.

Na manhã seguinte, ao voltar para casa, ela foi recebida por um abraço apertado de sua mãe e a voz de seu pai, dizendo: “Graças a Deus.”

Finalmente, Clara percebeu: não precisava ser perfeita para ser vista.

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