A bondade foi seu erro fatal. Ele resgatou a garota Apache pendurada, mas ela era a isca. Agora, os ‘Abutres’ vêm buscar os dois nesta armadilha mortal.

O deserto de Pico ardia sob um sol que parecia fogo. O vento carregava o cheiro de ferro enferrujado e areia escaldante, chicoteando o rosto de um cavaleiro solitário. Ronan Hail estava procurando por um cavalo perdido quando ouviu o som.

Não era o vento. Não era um animal selvagem. Era uma voz humana.

“Por favor… me solte. Dói.”

A voz era rouca, fraca, como se estivesse enterrada sob a areia. Ronan puxou as rédeas e seguiu o chamado. Em uma duna manchada de sangue, ele viu a figura.

Ela estava pendurada em um galho de árvore seca, uma mulher Apache. Era alta, com ombros e braços musculosos, a pele escurecida pelo sol e coberta de poeira. A corda cravada profundamente em seus pulsos, e o sangue escorria.

Ronan parou, seus olhos ficando frios. Ele desceu, sacou sua faca e a cortou. O corpo pesado dela caiu em seus braços, queimando de febre, mal se agarrando à vida. Seus lábios se moveram. “Não… não os deixe me ver.”

Ronan não respondeu. Ele a ergueu em seu cavalo e cavalgou pelas areias vermelhas, deixando para trás a árvore da forca. Ao longe, nuvens escuras se acumulavam. Uma tempestade estava chegando. Mas dentro de Ronan, algo ainda mais violento estava crescendo: uma decisão que o colocaria contra todo o deserto.

Naquela noite, o vento uivava pelas frestas da pequena cabana. Ronan deitou a mulher Apache na cama velha, a mesma cama onde sua esposa adoecera em seu último inverno. A lamparina a óleo lançava um brilho amarelo sobre o rosto dela: pele bronzeada, lábios rachados, marcas de corda gravadas nos pulsos e hematomas cobrindo seus ombros.

Ele ferveu água, limpou suas feridas e as envolveu com cuidado.

“Onde… Onde estou?” sua voz parecia ter voltado da beira da morte.

“Na minha casa. Fique calma.”

“Por que… um rancheiro… me salvou?”

Ronan permaneceu em silêncio, torcendo o pano. Ele não sabia a resposta. Talvez porque simplesmente não pôde ignorar aquela voz implorando por misericórdia.

“Meu nome é Nahi,” ela disse, a voz trêmula, mas firme. “Os ‘Abutres’ me capturaram. Eles iam me vender para um saloon em Dry Bluff. Eu lutei. Então me penduraram, esperando que algum tolo viesse me resgatar.”

Ronan ergueu os olhos. Aqueles olhos negros e profundos continham medo, mas pertenciam a uma guerreira.

“Você não devia ter me ajudado,” ela sussurrou. “Eles vão voltar.”

Ronan sentou-se, olhando para a escuridão da janela. “Se voltarem, estarei esperando. Ninguém merece ser pendurado como um animal.”

O vento apagou a lamparina. Na penumbra, restavam apenas o brilho das brasas e duas respirações: a de um homem que se cansara de viver e a de uma mulher que acabara de escapar da morte.

Ao amanhecer, o vento do deserto ainda estava afiado. Ronan saiu para levar água ao seu cavalo e parou.

Seu velho cavalo, Rusty, seu companheiro por sete anos, jazia imóvel em uma poça de sangue seco. Na porta de madeira da cabana, uma marca se destacava: a letra “X”, queimada com ferro quente. O símbolo dos Abutres.

Ronan cerrou os punhos. Era um aviso. Uma sentença.

Quando ele voltou, Nahi já estava de pé na varanda, os olhos negros alertas. “Eles já vieram.”

“Ainda não. Mas virão. Você deveria me deixar ir.”

Ronan balançou a cabeça. “Se você for, morrerá. Se ficar, pelo menos temos uma chance de lutar.”

Nahi o observou, o muro que ela erguia ao redor de si mesma rachando, revelando exaustão e gratidão. “Estou acostumada a ver homens correrem quando nos veem.”

“Eu já corri uma vez,” Ronan respondeu lentamente. “Não pretendo fazer isso de novo.”

Ele começou a reforçar a cabana, colocando barras de madeira extras, bloqueando a porta. Nahi o ajudou. Suas mãos grandes, veadas e habilidosas, balançavam o martelo com tanta capacidade quanto as de qualquer homem da fronteira.

“Esta noite,” disse Ronan, “durma no porão.”

“A tempestade está chegando,” ela assentiu.

Antes de descansar, Nahi disse baixinho: “Se eles matarem você, não deixarei um único deles viver.”

Ronan apenas sorriu, um sorriso cansado. “Então parece que temos o mesmo plano.”

Naquela noite, o céu se partiu. O vento uivava, carregando o cheiro úmido da tempestade e trovões que soavam como cascos batendo na pedra. Ronan limpava seu velho rifle Winchester.

Uma rajada forte bateu contra a cabana. Ele sinalizou para Nahi ficar quieta.

Então, um vulto escuro deslizou pela janela. Nahi moveu-se mais rápido que um grito. Ela agarrou a garganta do homem, girou e cravou sua faca profundamente em seu peito. O vento engoliu seu último grito.

Ronan disparou duas vezes. O segundo homem caiu morto na varanda. O terceiro desapareceu na escuridão. O céu rugiu.

“Três ainda faltam,” disse Nahi, a voz rouca. “Eles voltarão quando a tempestade diminuir.”

Ronan puxou Nahi para o porão, fechando a escotilha de madeira. Na escuridão, podiam ouvir cada passo na lama acima. Cada gota de chuva batendo no telhado como um relógio.

Ao amanhecer, a tempestade havia se transformado em uma névoa espessa. O quintal era um pântano. Os corpos de dois Abutres jaziam retorcidos. Ao longe, três cavalos negros esperavam.

“Eles ainda estão aqui,” disse Nahi.

“Sim. E sabem que não vamos fugir.” Ronan entregou a ela seu velho Colt. “Quando eu disser, não hesite.”

A porta da frente arrebentou. Um homem investiu. O tiro de Nahi ecoou antes que ele pudesse falar, atingindo-o no braço. Os outros dois avançaram, atirando repetidamente.

Fumaça de pólvora encheu a cabana. “Um deles foi para os fundos!” Ronan gritou.

Nahi disparou pela porta dos fundos. O quarto homem veio contra ela do celeiro. Ela girou, deu um soco que o derrubou e ele apagou.

Ronan disparou o último tiro. O último homem caiu.

A chuva parou. A terra ficou quieta, envolta em névoa, fumaça e cheiro de sangue.

Ronan saiu, o casaco rasgado, o rosto manchado. “Acabou.”

Nahi fechou os olhos e assentiu.

Quando o sol nasceu, o Marshall Quinn apareceu. Seus olhos varreram os corpos antes de pousar em Ronan. “Ouvi dizer que houve problemas por aqui. Alguém eliminou um bando inteiro de Abutres.”

Ronan apenas apontou para as covas abertas.

O Marshall examinou os buracos de bala e olhou para Nahi. “Ela é Apache?”

“Ela é alguém que foi salva,” disse Ronan.

Quinn tirou um maço de papéis úmidos de seu casaco. Cartazes de “Procurado”. “Cada nome nessa lista está agora deitado na lama. Caçamos esses desgraçados por dois anos.”

Ele ficou em silêncio por um momento, então removeu seu distintivo e o colocou sobre a mesa. “Esta é sua prova. Se alguém perguntar, diga que está trabalhando conosco. Vai mantê-los longe.”

Ronan olhou para o distintivo, mas não o tocou. “A justiça é lenta por aqui, Marshall.”

Quinn deu um leve sorriso. “Ela é. E às vezes ela vem usando o rosto de alguém que deixou de acreditar nela.”

Quando o Marshall foi embora, Ronan viu Nahi ao lado do túmulo de Rusty. Ela colocou uma margarida branca sobre ele. “Eles não vão voltar mais,” disse Ronan.

“Então,” Nahi olhou para ele, os olhos suavizando, “ainda estamos vivos. Pelo menos por hoje.”

Depois da tempestade, Pico voltou ao silêncio. Ronan acordava cedo, fazia café e saía com sua pá. Do outro lado da varanda, Nahi já estava acordada, carregando baldes de água do poço.

Eles falavam pouco. Eles apenas trabalhavam. Ronan reconstruiu as cercas. Ela o ajudou a serrar a madeira. A cada balanço do martelo, a cada linha de suor nos braços de Nahi, ele se lembrava de sua falecida esposa, mas também percebia algo mais: a vida nunca o havia abandonado de verdade.

Ela era forte, rápida e, quando ria, sua voz era suave como o vento de maio.

As semanas passaram. As manhãs traziam o canto dos pássaros; as noites, a fumaça da cozinha. Ronan ensinou-lhe as letras gravadas na madeira. Ela lhe ensinou uma velha canção Apache, profunda e arrastada. E, pela primeira vez em muitos anos, ele não se sentiu mais vivendo em cinzas, mas em solo novo, onde alguém poderia começar a plantar esperança.

A primavera seguinte chegou cedo. O rancho Pico, antes lar apenas de vento e cinzas, agora ecoava com vida.

Ronan encostou-se na pá, olhando para o solo recém-arado. Seus olhos brilhavam com a luz de um homem que tinha um motivo para acordar.

Nahi se aproximou, seu vestido rústico abraçando sua estrutura alta. Sua barriga agora mostrava uma curva suave. “O bebê nascerá quando o milho estiver maduro,” ela disse, com um leve sorriso.

Ronan deu um sorriso cansado, mas gentil. “Então ele crescerá com a estação dourada.”

Dentro da casa, sobre a mesa, uma licença de casamento estava pronta. “Homem branco e Apache juntos,” o Marshall havia resmungado. Nahi apenas olhou para os campos dourados. “Agora esta terra não pertence a ninguém, e pertence a todos.”

Um dia, Nahi trouxe uma pequena placa de madeira que ela havia esculpido: “Água para quem tem sede. Lar para os perdidos. Sem cor, sem guerra.”

Ronan tocou as letras, a voz embargada. “Agora eu entendo. Eu não te salvei.”

Ela sorriu, colocando a mão dele gentilmente sobre sua barriga. “Não, Ronan. Nós salvamos um ao outro.”

Naquela noite, enquanto o sol mergulhava atrás da colina, eles ficaram lado a lado na varanda. O vento trazia o cheiro de milho fresco e fumaça quente. O cheiro de um lar de verdade. No lugar onde a morte havia visitado, agora apenas a vida permanecia.

Related Posts

Our Privacy policy

https://abc24times.com - © 2025 News