
Wade Langston olhou para o documento em suas mãos calejadas e depois para a casa de fazenda que, segundo o banco, deveria estar vazia. Fumaça subia da chaminé. Três cavalos estavam amarrados ao poste da cerca. Roupas pendiam de um varal estendido entre dois carvalhos. Mas ele havia pago caro por uma propriedade abandonada, e o banco garantira que ninguém mais vivia ali.
Ele cutucou o cavalo para a frente, a confusão dando lugar à irritação. Quanto mais se aproximava, mais sinais de vida via. Um jardim de legumes florescia perto da casa. Galinhas ciscavam dentro de um cercado de arame. Marcas de pneus recentes riscavam o caminho de terra que levava à varanda. A porta da frente se abriu antes que ele pudesse desmontar.
Uma mulher saiu, o cabelo escuro preso para trás e as mãos apoiadas nos quadris. Era bonita, mas seu olhar não trazia boas-vindas. Atrás dela, outras duas mulheres apareceram na porta — igualmente atraentes e igualmente pouco receptivas.
“Você está em propriedade privada”, gritou a primeira mulher, sua voz ecoando pelo quintal com uma autoridade inconfundível.
Wade ergueu o documento. “Senhora, acho que houve algum engano. Comprei este lugar de forma legítima no Frontier Bank há três dias. Tenho os papéis bem aqui.”
Os olhos da mulher se estreitaram. “É mesmo?” Ela desceu os degraus da varanda, as irmãs flanqueando-a. “Pois bem, eu sou Ruby Callahan, e esta é a terra da minha família. Há vinte anos.”
“Vinte anos?”, a voz de Wade falhou um pouco. “O banco me disse que estava abandonada há mais de uma década, que os antigos donos simplesmente tinham ido embora.”
Ruby parou a três metros do cavalo dele, perto o bastante para que ele visse o fogo em seus olhos verdes. “O banco te contou muitas coisas, não é? Mas sabe o que eles não contaram? Nós nunca fomos embora. Nunca vendemos. E, com certeza, nunca abandonamos nosso lar.”
A irmã mais nova, uma loira de olhos preocupados, sussurrou algo para Ruby. A do meio, uma ruiva de olhar afiado, mantinha a mão próxima de algo preso ao cinto.
A mente de Wade girava. Ele havia gasto cada centavo que possuía naquela propriedade. O documento era legítimo — ele o conferira duas vezes no cartório. Mas aquelas mulheres claramente acreditavam que o lugar lhes pertencia, e não pareciam invasoras de passagem.
“Olhem, senhoritas”, disse ele, tentando manter a voz firme. “Não quero confusão. Tenho um documento legal dizendo que esta fazenda agora é minha. Talvez possamos resolver isso de forma pacífica.”
O riso de Ruby não tinha humor. “Pacífica? Você entra em nossas terras com um pedaço de papel e espera que a gente simplesmente faça as malas e vá embora? Está vendo aquele jardim? Os consertos no telhado? O novo curral atrás do celeiro? Nós temos vivido aqui, trabalhando esta terra, mantendo-a viva enquanto o escritório do banco fica vazio lá na cidade.”
Wade sentiu o suor se formar em sua testa, apesar do ar fresco da manhã. Havia algo muito errado ali — e ele começava a suspeitar que talvez o enganado fosse ele. Mas antes que pudesse responder, Ruby puxou um documento dobrado do bolso.
“Porque nós também temos papéis, forasteiro. E os nossos são bem mais antigos que os seus.”
Ruby desdobrou o documento com lentidão deliberada, sem tirar os olhos do rosto de Wade. O papel estava amarelado pelo tempo, as bordas gastas pelo manuseio. Ela o ergueu para que ele visse e, mesmo do alto do cavalo, Wade pôde distinguir um selo oficial na parte inferior.
“Este aqui é o documento original desta propriedade”, disse Ruby, a voz cortando o ar da manhã como uma lâmina. “Assinado em nome do nosso pai, Thomas Callahan, em 1851. O que faz dele um papel de vinte e quatro anos. E o seu, moço? Quantos dias tem mesmo?”
O estômago de Wade afundou. O documento dele tinha sido emitido há apenas três dias — mas aquilo não fazia sentido. Não se pode vender uma propriedade que já pertence a alguém. Os pensamentos dele voaram para a imagem do gerente do banco, inquieto, apressando-se durante a papelada, insistindo em pagamento apenas em dinheiro.
“Isso é impossível”, disse Wade, mas sua voz carecia de convicção. “O Frontier Bank não venderia uma propriedade roubada. É um banco legítimo.”
A irmã do meio deu um passo à frente, o cabelo ruivo cintilando sob a luz do sol. “Legítimo?”, ela riu amargamente.
“Essa é Sadie Quinn”, explicou Ruby, acenando para a irmã. “E ela tem umas histórias interessantes sobre o quão legítimo esse banco realmente é.”
Os olhos de Sadie ardiam de raiva. “Quer saber o que é legitimidade? Três meses atrás, um homem desse mesmo banco veio aqui dizendo que devíamos impostos atrasados. Disse que, se não pagássemos, iriam executar a hipoteca. Mas mostramos a ele esse mesmo documento — provamos que a terra é nossa, livre e desimpedida. Não se deve imposto sobre uma propriedade que nunca foi hipotecada.”
A irmã mais nova, que até então permanecera em silêncio, falou com voz quase inaudível.
“Essa é Clarabel”, explicou Ruby. “E ela viu algo naquele dia que talvez te interesse.”
As mãos de Clarabel tremiam enquanto ela falava. “Depois que o homem do banco foi embora, eu o segui um pouco no caminho até a cidade. Ele parou no armazém do Miller e se encontrou com outro homem. Estavam rindo de algo, e ouvi o do banco dizer: ‘Dê uns três meses e teremos compradores alinhados para essa propriedade.’”
Wade sentiu o chão se mover sob seus pés. “Você está dizendo que o banco planejou vender a terra de vocês mesmo depois de provarem que eram as proprietárias?”
“Estamos dizendo muito mais que isso”, respondeu Ruby. “Estamos dizendo que você não é o primeiro homem que eles trouxeram aqui com um papel bonito e uma história triste.”
As palavras atingiram Wade como um golpe físico. “Não o primeiro?”
Sadie assentiu sombria. “Duas semanas atrás, uma família do leste apareceu com papéis iguais aos seus. Disseram que tinham comprado o lugar sem nem ver. Mandamos eles embora, mas mencionaram algo que nos gelou o sangue.”
Wade desmontou lentamente, as pernas trêmulas. “O que foi que eles disseram?”
Ruby e as irmãs trocaram um olhar carregado de segredos compartilhados e medo profundo. Quando Ruby finalmente respondeu, sua voz era quase um sussurro.
“Elas disseram que o banco contou que os antigos donos haviam morrido num incêndio. As três irmãs, queimadas vivas enquanto dormiam.”
O sangue de Wade gelou. Ele estava diante de três mulheres que, segundo os registros do banco, deveriam estar mortas.
Wade olhou para as três mulheres diante dele — vivas, furiosas — e sentiu as peças de um terrível quebra-cabeça se encaixando em sua mente, cada uma mais perturbadora que a anterior.
“Eles disseram que vocês estavam mortas”, murmurou, a voz tomada pela incredulidade. “Mas aqui estão vocês, vivas, na própria terra, enquanto o banco a vende por aí para qualquer um com dinheiro.”
Ruby assentiu sombriamente. “Agora você está começando a entender. A questão é: o que vai fazer a respeito disso?”
Wade passou a mão pelos cabelos, tentando pensar com clareza. “Eu dei a eles tudo o que tinha. Quinhentos dólares por este lugar. Se o documento de vocês for legítimo, então fui roubado tanto quanto vocês.”
“Mais do que imagina”, disse Clarabel em voz baixa. “Mostra pra ele, Sadie.”
Sadie desapareceu dentro da casa e voltou momentos depois com uma sacola de couro. Ela tirou vários papéis e os espalhou sobre o corrimão da varanda.
“Essas são cópias de escrituras que encontramos voando pela cidade depois daquela tempestade de vento no mês passado. Cinco propriedades diferentes, todas vendidas pelo Frontier Bank nos últimos seis meses, cada uma para um comprador diferente.”
Wade examinou os documentos. As assinaturas eram idênticas, a mesma caligrafia floreada em cada escritura, mas as propriedades descritas estavam espalhadas por três condados, e as datas de venda se sobrepunham de maneira impossível.
“Eles venderam o Rancho Morrison para três famílias diferentes na mesma semana”, continuou Sadie. “O antigo lugar dos Henderson foi vendido cinco vezes desde a primavera. O mesmo padrão em todos os casos. Somente em dinheiro, sem inspeção, compradores incentivados a tomar posse imediatamente.”
“É um golpe de confiança”, concluiu Wade, sentindo a raiva crescer. “Eles estão tirando dinheiro de pessoas como eu enquanto roubam terras de pessoas como vocês. E quando os compradores aparecem e encontram as propriedades ocupadas, o que acontece?”
A expressão de Ruby escureceu. “A maioria simplesmente vai embora, sem brigar. Acham que foram enganados e colocam a culpa na má sorte. O banco fica com o dinheiro, fica com a terra e recomeça o ciclo.”
“Mas alguns não desistem tão fácil”, acrescentou Clarabel. “Alguns tentam nos expulsar. É aí que as coisas ficam perigosas.”
Wade sentiu um enjoo subir. “Quantas pessoas eles já enganaram assim?”
“Mais do que você imagina”, respondeu Sadie. “E está piorando. O banco ficou ousado ultimamente, vendendo as mesmas propriedades repetidas vezes. Estão fazendo uma fortuna com mentiras e documentos falsos.”
Uma nuvem de poeira no horizonte chamou a atenção de Wade. Um cavaleiro se aproximava depressa, e algo na urgência de seu passo fez o estômago dele se revirar.
“Esperando visita?”, perguntou ele.
Ruby seguiu seu olhar — e empalideceu. “É Jed Collins. Trabalha pro banco. Ele só aparece quando tem problema vindo.”
O cavaleiro se aproximou o bastante para que vissem seu rosto — sombrio e determinado. Ele puxou as rédeas com força diante da casa, o cavalo suado e arfante.
“Senhorita Callahan”, chamou Jed, sem sequer desmontar. “O gerente do banco precisa vê-la na cidade hoje. Diz que é sobre seus impostos.”
As mãos de Ruby se cerraram em punhos. “Nós não devemos imposto algum.”
O sorriso de Jed foi frio e predatório. “O banco diz o contrário. Diz que vocês têm até o pôr do sol pra pagar, ou perdem a terra.”
Wade percebeu que aquilo não era coincidência. O banco sabia que ele estava ali. Ele deu um passo à frente, colocando-se instintivamente entre Jed e as irmãs, a mão deslizando para perto do coldre.
“Engraçado isso”, disse Wade, a voz firme apesar da tensão que o consumia. “Comprei esta propriedade do seu banco há três dias. Estranho que estejam cobrando imposto de uma terra que já não pertence mais a vocês.”
A confiança no rosto de Jed vacilou por um instante antes de se recompor. “Deve estar enganado, amigo. Esta é a propriedade Callahan, e está em dívida de impostos há meses.”
“É mesmo?” Wade tirou seu documento do bolso do casaco. “Então por que este papel aqui diz que ela agora é minha? Assinado pelo próprio gerente do banco.”
A cor sumiu do rosto de Jed enquanto ele encarava o documento. Wade pôde praticamente ver os pensamentos do homem correndo, tentando entender como lidar com aquela complicação inesperada.
“Deve ter havido algum erro”, gaguejou Jed. “Vou precisar tratar disso com o senhor Harrison no banco.”
Ruby deu um passo à frente, ainda com sua escritura original nas mãos. “Enquanto estiver lá, pergunte ao senhor Harrison como ele consegue vender uma propriedade que já pertence a nós. Este documento está na nossa família há vinte e quatro anos.”
O cavalo de Jed relinchou, sentindo a tensão no ar. Os olhos do cavaleiro se moveram entre o revólver de Wade e as três mulheres, claramente calculando suas chances.
“Olhe, só estou cumprindo ordens. O banco quer o dinheiro até o pôr do sol, ou haverá consequências.”
“Que tipo de consequências?”, exigiu Sadie, levando a mão para o que estava preso ao cinto.
“Do tipo que acontecem quando as pessoas não pagam suas dívidas”, respondeu Jed, a voz assumindo um tom ameaçador. “O xerife tem sido bem compreensivo com disputas de propriedade ultimamente. Principalmente quando se trata de invasores se recusando a deixar terras compradas legitimamente.”
A raiva de Wade ferveu. “Invasores? Essas mulheres vivem aqui há vinte anos. E eu tenho papéis dizendo que comprei este lugar honestamente. Parece que o banco anda brincando com a verdade.”
A mão de Jed se moveu em direção à arma, mas Wade foi mais rápido — não sacou, apenas mudou de postura, o suficiente para deixar suas intenções claras. A mensagem foi recebida.
“Eu pensaria bem antes do seu próximo movimento”, disse Wade em tom baixo. “Porque agora você está em desvantagem de quatro contra um, e todos nós temos boas razões pra resolver contas com seu patrão.”
Clarabel falou de repente, sua voz suave cortando o silêncio tenso. “Jed, você nos conhece desde crianças. Acha mesmo que invadiríamos terras de outra pessoa?”
Por um momento, a incerteza cruzou o rosto de Jed. Mas logo foi substituída por algo mais duro, quase desesperado. “Tenho minhas ordens”, disse enfim. “E se não tiverem o dinheiro até o pôr do sol, o xerife virá com papéis pra despejar vocês. Todos vocês.”
Ele virou o cavalo e disparou em direção à cidade, deixando atrás de si uma nuvem de poeira e ameaças não ditas.
Wade o observou desaparecer no horizonte, a mente já traçando o próximo passo. “Quanto eles disseram que vocês devem?”
A resposta de Ruby fez o sangue dele gelar. “Duzentos dólares. Até hoje à noite.”
O sol já começava a descer no céu quando Wade guardou os papéis e olhou para as três mulheres. Havia determinação nos rostos delas — o tipo de força que nasce quando alguém não tem mais nada a perder.
“Duzentos dólares até o pôr do sol”, repetiu ele. “E se não pagarem, o banco toma tudo.”
Sadie deu uma risada amarga. “Eles sabem que não temos esse dinheiro. É só uma desculpa pra terminar o que começaram.”
Wade ficou em silêncio por um momento, depois respirou fundo. “Então vamos até a cidade.”
Ruby ergueu os olhos, surpresa. “Pra quê? Pra implorar?”
“Não. Pra lutar.” Wade endireitou o chapéu. “Se Harrison acha que pode enganar meio condado com papel falsificado, vai ter que me encarar de frente. E vocês também merecem respostas.”
Clarabel hesitou. “E se ele tiver o xerife do lado dele?”
“Então veremos quem tem mais coragem: um banqueiro mentiroso ou quatro pessoas que já perderam tudo o que tinham.”
O silêncio pairou por um instante. Depois, Ruby assentiu devagar. “Certo. Vamos acabar com isso.”
Enquanto preparavam os cavalos, Sadie olhou para Wade. “Por que está nos ajudando? Poderia simplesmente ir embora e esquecer o que viu.”
Wade montou no cavalo e respondeu com calma: “Porque já vi gente demais ser enganada. E porque, se não lutar por justiça agora, amanhã podem vir atrás de mim.”
O pequeno grupo partiu em direção à cidade. O vento levantava poeira vermelha sob os cascos, e o sol poente tingia o horizonte de um dourado triste.
Nenhum deles falou por um tempo. Havia apenas o som dos cavalos, o farfalhar das rédeas e o peso da decisão que carregavam.
Quando o letreiro da cidade surgiu à distância, Clarabel murmurou: “Sabe, Wade, talvez o banco não esteja agindo sozinho. Alguém tem que estar ajudando a encobrir tudo isso.”
“Está dizendo o xerife?”, perguntou ele.
“Talvez. Ou o cartório. Ou até o juiz. Papai dizia que, quando o dinheiro fala, muita gente prefere ficar surda.”
Ruby olhou para o horizonte, os olhos duros. “Então é hora de fazer barulho o bastante pra que todos ouçam.”
Ao chegarem à rua principal, a cidade parecia diferente — mais fria, mais tensa. Pessoas que costumavam acenar agora apenas observavam de longe. Os cochichos se espalhavam atrás deles como fumaça.
O banco Frontier, com sua fachada branca e imponente, estava logo à frente. O letreiro dourado brilhava sob o sol, como um insulto.
Wade desmontou e prendeu o cavalo. “Fiquem atrás de mim. Harrison é do tipo que tenta controlar a conversa. Não deem a ele essa chance.”
As irmãs assentiram. Ruby endireitou os ombros, segurando firme sua escritura. Sadie ajeitou o lenço no pescoço. Clarabel respirou fundo, murmurando algo que soava como uma prece.
Wade empurrou a porta dupla.
O interior do banco estava quieto, exceto pelo som distante de uma caneta riscando papel. O gerente Harrison levantou os olhos de sua mesa, o sorriso automático congelando quando viu o grupo.
“Senhor Daugherty”, disse ele, fingindo surpresa. “E… senhoritas Callahan. Que coincidência agradável.”
“Não é coincidência”, respondeu Wade. “Viemos falar sobre os negócios sujos do seu banco.”
O sorriso de Harrison se tornou tenso. “Negócios sujos? Espero que escolha suas palavras com cuidado, senhor Daugherty.”
“Ah, estou escolhendo muito bem.” Wade jogou o documento sobre a mesa. “Comprei esta terra do seu banco há três dias. Agora descubro que ela já tem donos legítimos — e que o senhor tem vendido propriedades repetidas vezes com documentos falsos. Quer me explicar isso?”
Harrison pegou o papel, examinou-o com calma e depois o colocou de lado. “Parece haver algum mal-entendido. O banco apenas age conforme a lei. Se há duplicidade de registros, deve ser um erro do cartório.”
Ruby avançou um passo. “Erro? Esse documento tem a sua assinatura. E o meu também. Está me chamando de mentirosa?”
O gerente manteve a compostura, mas o suor começou a brotar em sua testa. “Senhorita Callahan, este não é o lugar para discussões passionais. Os negócios precisam ser tratados com serenidade.”
“Serenidade é o que a gente perde quando é roubado”, rebateu Sadie, com a voz firme.
Harrison suspirou, fingindo paciência. “Como eu disse, se há algo errado, investigaremos. Agora, se me dão licença, tenho uma reunião marcada com o xerife—”
A porta do banco se abriu com força. Jed Collins entrou, ofegante, o olhar alarmado. “Senhor Harrison, precisamos conversar.”
Harrison lançou um olhar cortante. “Agora não.”
“É sobre o xerife”, insistiu Jed. “Ele tá vindo pra cá — e não sozinho.”
O gerente empalideceu. “Quem está com ele?”
“Os compradores, senhor. Todos eles. Os que descobriram que as terras que o senhor vendeu… não existem mais.”
O som das botas ecoou forte no chão de madeira quando o xerife entrou no banco. Atrás dele, uma dúzia de homens e mulheres — fazendeiros, mineiros, famílias inteiras — todos com rostos marcados pela raiva e pela desilusão.
“Senhor Harrison”, disse o xerife, a voz grave. “Tem muita gente aqui dizendo que o senhor os enganou. Vendeu as mesmas terras mais de uma vez.”
O gerente tentou manter a postura, mas suas mãos tremiam levemente. “Essas acusações são infundadas. O banco atua com total transparência.”
Um dos homens deu um passo à frente, mostrando um papel amassado. “Transparência, é? Então explique por que este documento tem a mesma assinatura que o da moça ali!”
Os murmúrios cresceram. Sadie cruzou os braços, olhando fixamente para o gerente. Ruby encarou o xerife. “E o senhor vai fingir que não vê o que está acontecendo?”
O xerife coçou o queixo, visivelmente desconfortável. “Se for verdade, vai haver investigação.”
“Investigação não”, interrompeu Wade. “Vai haver justiça — agora.”
Ele tirou do casaco um segundo envelope. “Aqui estão cópias de outros contratos, todos com a mesma caligrafia, o mesmo selo falsificado. Eu os encontrei no arquivo do banco.”
O xerife pegou os papéis, examinou rapidamente e ergueu os olhos, duros. “Senhor Harrison, o senhor tem algo a dizer?”
Por um instante, o banco inteiro ficou em silêncio. O tique-taque do relógio na parede soava como um martelo batendo. Harrison abriu a boca, mas nenhuma palavra saiu. O suor escorria pela têmpora.
“Eu… posso explicar,” balbuciou.
“Explique então,” disse Ruby, a voz firme, quase fria. “Explique por que nossas famílias perderam tudo enquanto o senhor enchia os bolsos.”
Harrison olhou em volta, cercado por olhares furiosos. “Eu só… seguia ordens. O banco central exigia os pagamentos. Eu fiz o que precisava pra manter as contas abertas.”
Sadie avançou um passo. “Então destruiu a vida de gente honesta pra proteger a sua reputação?”
O xerife respirou fundo. “Basta.” Ele se virou para dois auxiliares. “Levem-no sob custódia. O tribunal vai decidir.”
Quando os homens o levaram, Harrison gritou: “Vocês não entendem! Eu não era o único! Há gente mais poderosa por trás disso!”
Mas ninguém mais quis ouvir.
O burburinho tomou conta do banco. As pessoas se abraçavam, algumas choravam — não de tristeza, mas de alívio. Ruby olhou para Wade, um sorriso cansado nos lábios.
“Parece que acabou,” murmurou ela.
“Por enquanto,” respondeu ele. “Mas ainda há muito o que arrumar. As terras, os registros…”
Clarabel assentiu, os olhos marejados. “Pelo menos agora temos a chance de recomeçar.”
Sadie sorriu. “E tudo começou porque um estranho decidiu parar e escutar.”
Wade deu uma risada baixa. “Talvez porque eu também já tenha perdido tudo uma vez. Sei o que é não ter pra onde ir.”
Eles saíram do banco juntos. O sol começava a se pôr, derramando luz dourada sobre as ruas poeirentas. As pessoas os seguiam, algumas agradecendo, outras simplesmente caminhando em silêncio.
Ruby olhou para o céu e sussurrou: “Pai teria ficado orgulhoso.”
Sadie segurou a mão dela. “Ele está. A gente fez o que ele sempre dizia — enfrentamos o que era errado.”
Wade parou por um instante, observando o grupo. “Sabe,” disse ele, “às vezes a justiça não vem montada num cavalo branco. Às vezes, ela chega do jeito mais simples: três irmãs corajosas e um rancho que ninguém vai roubar de novo.”
O vento soprou leve, levantando poeira e esperança.
Meses depois, o rancho florescia de novo. As cercas estavam consertadas, o celeiro pintado, e o cheiro de pão recém-assado vinha da cozinha todas as manhãs. O vento que antes soava como lamento agora trazia apenas o som de cavalos correndo e risadas no alpendre.
Ruby caminhava pelo campo com o chapéu do pai nas mãos. O sol se deitava devagar atrás das colinas, pintando o céu de dourado e lilás. Às vezes, ainda custava a acreditar que tudo aquilo era real — que a terra que quase lhes fora tirada agora era novamente delas.
Clarabel cuidava das colmeias atrás do celeiro. O mel era doce e espesso, e as abelhas pareciam entender que ali havia paz outra vez. Ela passou a vender frascos no vilarejo, e cada um trazia um pequeno rótulo escrito à mão: Do Rancho das Irmãs Montgomery.
Sadie, por sua vez, montara uma pequena escola ao lado da capela. Ensinava leitura e contas às crianças das fazendas vizinhas. “Educação é a única coisa que ninguém pode roubar”, dizia ela. E quando terminava as aulas, sentava-se na varanda, dedilhando o violão velho do pai enquanto as crianças corriam atrás de borboletas.
E Wade… ele ficou.
Dizia que pretendia seguir viagem, mas nunca chegou a partir. Ajudava nas colheitas, consertava cercas, e às vezes simplesmente sentava à mesa, escutando histórias que as irmãs contavam sobre os dias difíceis. Ruby sabia que havia algo entre eles — uma calma, uma gratidão que não precisava de palavras.
Numa tarde de outono, ele trouxe uma garrafa de vinho e quatro copos. Sentaram-se juntos sob o carvalho mais antigo do rancho.
“Por que brindar?”, perguntou Sadie.
Wade sorriu. “Por justiça que veio tarde, mas veio.”
Clarabel levantou o copo. “Por recomeços.”
Ruby olhou para o horizonte. “Por promessas cumpridas.”
Eles brindaram, e por um instante tudo pareceu suspenso — o vento, a luz, o tempo.
Quando o sol desapareceu, Wade se levantou e olhou para Ruby. “Sabe”, disse ele, “há lugares que a gente passa, e há outros que nos fazem ficar. Acho que este é um deles.”
Ruby sorriu, sem precisar responder.
À noite, as estrelas tomaram o céu inteiro. O rancho dormia tranquilo, guardando nos campos o eco de tantas batalhas vencidas.
E assim, o que começou com perda, terminou com esperança.
Nem todas as histórias de amor precisam de finais perfeitos — algumas só precisam de paz.