
O estalar agudo dos sapatos de couro de Marcos Silveira ressoava no mármore frio da entrada. Era a sua voz que gritava, uma melodia desafinada de raiva e exaustão, que já se tornara a banda sonora daquela mansão.
— Eu pago três mil reais por mês, e vocês não conseguem fazer dois bebés pararem de chorar!
A sua fúria recaiu sobre a décima segunda ama que pedia a demissão em três meses. Fernanda, quarenta anos, vinte de experiência, arrumava os seus pertences com as mãos a tremer.
— Senhor Marcos, eu nunca vi nada assim. Estes bebés não param de chorar nem por cinco minutos. É como se estivessem… possuídos.
Marcos riu amargamente.
— Possuídos? Eles têm oito meses de idade. São bebés normais.
— Normais? — Fernanda virou-se para encará-lo, a sua voz baixa, mas firme. — Bebés normais não choram oito horas seguidas, todas as noites. Bebés normais não olham para o teto como se vissem algo que não existe. E bebés normais têm pais que os pegam no colo.
A última frase atingiu Marcos como uma lâmina. Sentiu o rosto a arder de fúria.
— Como ousa questionar a forma como educo os meus filhos? Eu trabalho dezasseis horas por dia para lhes dar tudo o que precisam!
— Tudo, menos carinho — murmurou Fernanda, pegando na sua mala.
— O que disse?
— Nada, senhor. Só espero que encontre alguém que consiga ajudar estas crianças, porque elas estão a sofrer.
A porta bateu com força, deixando Marcos sozinho no vasto salão de entrada. Do andar de cima, vinham os gritos familiares dos gémeos, Pedro e Paulo, que, aos oito meses de vida, pareciam ter declarado guerra ao silêncio. Eram duas da tarde de uma quinta-feira, e já choravam há quatro horas ininterruptas.
Marcos subiu as escadas com passos pesados, parando na porta do quarto dos bebés. Através da fresta, podia ver os dois berços de madeira maciça a balançar sob o desespero dos seus filhos. Pedro estava vermelho de tanto chorar, os punhos cerrados, o corpo tenso. Paulo fazia o mesmo, numa agonia sincronizada.
— Carmen! — gritou.
A governanta apareceu a correr.
— Sim, senhor.
— Preciso de outra ama hoje mesmo. Ligue para todas as agências que conhece.
Carmen baixou o olhar, desconfortável.
— Senhor, eu já tentei ontem, depois que a Fernanda avisou que ia sair. Nenhuma agência quer mandar funcionárias para cá.
— Como assim, não querem?
— Dizem que as amas voltam sempre traumatizadas. Uma agência até disse que nos vai colocar na lista de “clientes problemáticos”.
Marcos sentiu o mundo a desabar. Em oito meses, tentara de tudo. Amas diplomadas, enfermeiras especializadas, até uma “especialista em bebés difíceis”. Todas fugiram como se a casa estivesse a arder.
— E agora, o que faço?
— Tem uma moça na porta a querer falar consigo sobre emprego — disse Carmen, hesitante.
— Ama?
— Não, senhor. Empregada doméstica. Mas ela disse que tem experiência com crianças.
Marcos olhou para Carmen como se ela tivesse enlouquecido.
— Carmen, a casa já está limpa. Preciso de alguém que faça estes bebés pararem de chorar.
— Eu sei, mas ela insistiu muito. E do jeito que as coisas estão…
Os gritos do andar de cima ficaram mais altos, como se os bebés soubessem que estavam a ser discutidos. Marcos passou as mãos pelo cabelo, sentindo que ia enlouquecer.
— Está bem. Mande-a entrar, mas não prometo nada.
Helena Silva entrou na sala como se não tivesse medo de nada. Vinte e oito anos, cabelo louro preso num rabo de cavalo, t-shirt branca simples e calças de jean desbotadas. Não parecia intimidada pela mansão luxuosa, nem pelos gritos que ecoavam pela casa.
— Boa tarde, senhor Marcos — disse, estendendo a mão. — O meu nome é Helena Silva.
— Helena, vou ser direto. Não preciso de empregada doméstica. Preciso de alguém que faça os meus filhos pararem de chorar.
— Ouvi lá fora. Deve ser muito difícil para todos.
— Difícil? — Marcos quase gritou. — Não durmo direito há oito meses. Perdi contratos importantes porque chego às reuniões a parecer um zombie. Doze amas pediram a demissão.
Helena manteve a voz calma.
— E o que os médicos disseram?
— Que não há nada de errado com eles. Exames normais, saúde perfeita. Mas eles choram como se estivessem a ser torturados.
— Posso subir e vê-los?
— Para quê? Você não é ama.
— Não, mas já cuidei de bebé que chorava muito.
Marcos olhou para ela com desconfiança.
— Criei o meu irmão caçula sozinha quando tinha dezoito anos. Os meus pais morreram, e ele tinha dois meses. E ele chorava assim. Pior.
Havia algo na voz de Helena que fez Marcos parar de questionar.
— Está bem, mas só para olhar.
Subiram juntos, o som do choro tornando-se ensurdecedor. O quarto dos gémeos era um contraste assustador: móveis caríssimos, brinquedos importados, tudo perfeito. E no meio de tanto luxo, dois bebés choravam como se o mundo estivesse a acabar.
Helena aproximou-se dos berços devagar. Pedro tinha o rosto molhado de lágrimas, os bracinhos esticados para cima. Paulo contorcia-se como se algo o estivesse a magoar.
— Há quanto tempo estão assim hoje?
— Desde as dez da manhã. E ontem, das nove da noite às seis da manhã.
Helena ficou a observar os bebés em silêncio. Não tentou pegá-los, não fez barulhinhos, não tentou distraí-los com brinquedos. Apenas observou.
— Senhor Marcos — disse ela, depois de alguns minutos. — Posso fazer uma pergunta?
— Fale.
— Com que frequência o senhor pega nos seus filhos ao colo?
A pergunta foi como uma bofetada. Marcos sentiu a raiva explodir no peito.
— Ouça aqui, Helena, não sei das quantas. Não preciso de lições sobre como ser pai. Preciso de alguém que resolva este problema!
— Não estou a dar lições — disse ela, sem se alterar. — Só estou a tentar entender.
— Entender o quê? Por que é que choram? Já lhe disse que os médicos não encontraram nada.
— Eu acredito, mas nem sempre o problema é físico.
Marcos parou de gritar.
— O que quer dizer?
— Bebés sentem tudo, senhor. Sentem raiva, tristeza, solidão. Mesmo sem entender, absorvem as emoções dos adultos.
— Isso é conversa de maluco.
— Talvez. Mas o meu irmão parou de chorar quando eu aprendi a ficar calma perto dele.
Os gémeos continuavam a chorar, como se nada no mundo pudesse consolá-los. Marcos olhou para os filhos e, pela primeira vez em meses, realmente os viu: dois bebés pequenos, indefesos, que talvez estivessem a pedir algo que ele não sabia dar.
— O que quer em troca de tentar ajudar?
— Trabalho como empregada doméstica. Dois mil reais por mês.
— Dois mil?
Era menos do que ele gastava numa noite de restaurante.
— Por que tão pouco?
— Porque não sou ama profissional. Sou só alguém que entende de bebés tristes.
Marcos olhou para Helena, depois para os filhos. Não tinha mais nada a perder.
— Pode começar amanhã cedo. Mas deixo claro: não espero milagres. Só tente descobrir por que é que choram tanto.
Helena assentiu.
— Vou descobrir, senhor. Prometo.
Quando ela saiu, Marcos ficou sozinho com os bebés que continuavam a chorar. Pela primeira vez, perguntou-se se o problema não estaria neles, mas sim nele próprio. Aquela noite seria a última em que ignoraria completamente os gritos dos filhos, porque amanhã Helena chegaria, e com ela, verdades que ele não estava preparado para enfrentar.
Helena chegou na manhã seguinte, às sete em ponto, como combinado. Carmen recebeu-a à porta dos fundos com uma expressão de pena no rosto, como se estivesse a ver alguém a caminhar diretamente para um precipício.
— Menina, tem a certeza que quer trabalhar aqui? — sussurrou a governanta, olhando nervosamente para as escadas. — Ainda vai a tempo de desistir.
— Por que é que eu desistiria? — perguntou Helena, amarrando o avental.
— Porque eles estão a chorar desde as cinco da manhã. O senhor Marcos nem desceu para tomar o pequeno-almoço. Está trancado no escritório com a porta fechada.
Os gritos dos gémeos ecoavam pela casa inteira, um som desesperador que fazia qualquer pessoa querer fugir. Helena ouviu atentamente, como se estivesse a decifrar uma música complexa.
— Estão com fome? — perguntou.
— Já tomaram um biberão às seis. Também já foram mudados. Tomaram banho, tudo certinho. Mas não param de chorar.
Helena subiu as escadas devagar, seguindo o som do choro. O corredor do segundo andar era elegante, com quadros caros nas paredes e um tapete grosso que abafava os passos. Mas havia algo estranho que ela notou imediatamente. Todas as portas estavam fechadas, exceto a do quarto dos bebés.
— Carmen! — chamou, quando a governanta subiu atrás dela. — Qual é o quarto do senhor Marcos?
— O último do corredor. Depois do escritório dele.
Helena olhou na direção indicada. Entre o quarto dos bebés e o quarto do pai havia pelo menos vinte metros de distância.
— E ele sempre dormiu aí?
— Sempre, desde que os meninos nasceram.
— E antes, quando a esposa era viva?
Carmen ficou desconfortável.
— Antes, eles dormiam no quarto principal, que fica do outro lado da casa. Mas depois que a Dona Isabela faleceu, ele mudou para o quarto mais distante.
Helena parou na porta do quarto dos gémeos. Pedro e Paulo estavam nos berços, a chorar com uma intensidade que parecia impossível para bebés tão pequenos. Mas ela não entrou imediatamente. Em vez disso, ficou a observar o corredor.
— Carmen, mostre-me a casa toda. Quero conhecer todos os cómodos.
— Para quê? Você vai trabalhar só na cozinha e nas áreas de serviço.
— Quero entender como esta família vivia antes de os bebés nascerem.
A governanta hesitou, mas acabou por concordar. Desceram para o rés-do-chão, e Carmen começou o tour. A casa era imensa. Sala de estar, sala de jantar, biblioteca, escritório, cozinha gourmet, área de lazer, tudo impecavelmente decorado, mas com um ar frio, como se ninguém realmente vivesse ali.
— Onde faziam as refeições quando a Dona Isabela estava viva? — perguntou Helena.
— Na sala de jantar, sempre. Ela fazia questão que fossem momentos em família.
— E agora?
— O senhor Marcos come no escritório, quando come. Às vezes, fica o dia inteiro só a tomar café.
Helena foi até à sala de jantar. A mesa de mogno para doze pessoas estava impecável, como se nunca tivesse sido usada. Mas em cima do aparador, havia marcas circulares na madeira, como se alguém tivesse removido objetos que ficavam ali sempre.
— O que tinha aqui em cima? — perguntou ela, passando o dedo nas marcas.
Carmen baixou os olhos.
— Fotos da família. O senhor Marcos mandou guardar tudo depois que os meninos nasceram.
— Guardar onde?
— No quarto que era da Dona Isabela. Ele trancou a porta, e ninguém pode entrar.
Helena sentiu um aperto no peito.
— Ele proibiu que qualquer coisa da esposa ficasse à vista?
— Não apenas proibiu. Ele mesmo recolheu tudo. Fotos, roupas, perfumes, até as plantas que ela cuidava. Disse que não queria “lembranças dolorosas” pela casa.
— E isso aconteceu quando?
— Logo depois que trouxe os bebés do hospital. Na primeira semana.
Helena subiu novamente para o segundo andar, desta vez prestando atenção em detalhes que havia perdido antes. As paredes do corredor tinham marcas retangulares mais claras, como se quadros tivessem sido removidos. No final do corredor, havia uma porta com uma fechadura diferente das outras.
— Aquele é o quarto da Dona Isabela? — perguntou.
— Era o quarto principal do casal. Agora está fechado há oito meses.
Helena aproximou-se da porta e encostou o ouvido. Do outro lado, vinha um silêncio sepulcral, como se o cómodo estivesse morto. Mas o que mais lhe chamou a atenção foi a posição. O quarto ficava exatamente ao lado do quarto dos bebés.
— Carmen, posso fazer-lhe uma pergunta muito pessoal?
A governanta ficou tensa.
— Depende da pergunta.
— Como a Dona Isabela morreu?
— No parto. Complicações na cesariana. Perdeu muito sangue, e não conseguiram salvar.
— E o senhor Marcos estava presente?
— Estava na sala de cirurgia, quando ela… quando ela partiu. Saiu de lá completamente destruído.
Helena voltou para o quarto dos bebés, onde Pedro e Paulo continuavam a chorar. Desta vez, ela entrou e aproximou-se dos berços. Os bebés estavam claramente exaustos, mas não conseguiam parar de chorar.
— Vocês sentem, não é? — sussurrou ela, olhando para eles. — Sabem que alguém muito importante deveria estar aqui, mas não está.
Como se entendessem as suas palavras, os bebés choraram ainda mais alto. Helena notou algo que nenhuma das amas anteriores tinha percebido. Eles não choravam olhando para qualquer direção. Olhavam sempre para a parede que dividia o quarto deles do quarto principal.
— Carmen — chamou. — Venha cá um minuto.
A governanta entrou relutante no quarto.
— O que foi?
— Repare para onde olham quando choram.
Carmen observou por alguns segundos. Pedro estava com o rosto virado para a parede da direita. Paulo fazia o mesmo. Era como se estivessem a chamar alguém que estava do outro lado.
— Meu Deus! — murmurou Carmen. — Estão a olhar para o quarto da mãe.
— Exato. E aposto que fazem isso desde que nasceram.
— Mas isso é impossível. Bebés não sabem onde as pessoas estão.
— Não sabem onde estão — corrigiu Helena. — Mas sabem onde deveriam estar.
Nesse momento, a porta do quarto abriu-se bruscamente. Marcos entrou como um furacão, com o cabelo despenteado e uma expressão furiosa no rosto.
— O que estão a fazer aqui? Por que não estão a cuidar do que foram contratadas para fazer?
— Senhor Marcos — disse Helena, calmamente. — Estou a tentar entender por que é que os seus filhos choram tanto.
— Já lhe disse ontem que não há explicação. Eles simplesmente choram.
— Há explicação, sim. E o senhor sabe qual é. Os seus filhos estão a chamar pela mãe, e eles sabem que o senhor os culpa pela morte dela.
O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor. Até os bebés pararam de chorar por alguns segundos, como se sentissem a tensão no ar. Marcos ficou pálido, as mãos a tremer de raiva.
— Você não sabe do que está a falar — disse ele, com a voz perigosamente baixa.
— Sei, sim. O senhor removeu todas as lembranças da sua esposa, mudou de quarto para ficar o mais longe possível dos filhos e evita tocá-los porque eles lhe lembram a perda.
— Cale a boca! — Marcos explodiu. — Você não tem o direito de falar sobre a minha família!
— Os seus filhos não são sua família? — perguntou Helena, sem se alterar.
A pergunta atingiu Marcos como um tiro. Ele olhou para os bebés, que haviam voltado a chorar, depois para Helena, que o encarava sem medo.
— Eles mataram a minha esposa — disse, a voz quebrada. — Isabela estava perfeitamente bem até decidir ter filhos. Se ela não tivesse engravidado, ainda estaria viva.
Carmen levou a mão à boca, chocada. Em oito meses, nunca tinha ouvido Marcos falar tão abertamente sobre a culpa que carregava.
— Senhor Marcos — disse Helena, suavemente. — Posso contar-lhe uma coisa sobre mim?
— Não quero ouvir.
— Quando o meu irmão nasceu, a minha mãe teve complicações no parto. Ela morreu três dias depois.
Marcos parou de andar e olhou para ela.
— Eu tinha dezoito anos e passei esses três dias a odiar aquele bebé. Achava que ele tinha matado a minha mãe. Quando ela realmente partiu, eu culpei o meu irmão por tudo.
— E então?
— E então, o meu pai morreu num acidente, e eu percebi que o meu irmão não tinha matado ninguém. Ele era apenas o resultado do amor dos meus pais.
Marcos sentou-se na poltrona do quarto como se não conseguisse mais ficar de pé.
— Mas Isabela morreu por causa deles.
— Isabela morreu para lhes dar vida — corrigiu Helena. — E aposto que, se pudesse escolher novamente, faria a mesma escolha. Você não a conhecia.
— Não. Mas conheço mães, e mães não culpam os filhos pela própria morte. Elas pedem aos pais para amarem as crianças por elas.
Os bebés continuavam a chorar, mas agora parecia um choro diferente. Não era desespero puro, era um pedido, um chamamento por alguém de quem precisavam desesperadamente.
— Senhor Marcos — disse Helena. — Quando foi a última vez que pegou nos seus filhos ao colo?
— Eu… eu não me lembro.
— Não se lembra ou nunca pegou?
Marcos fechou os olhos.
— Nunca consegui. Sempre que olho para eles, vejo Isabela a morrer na mesa de cirurgia. E eles sentem isso. É por isso que choram tanto. Sabem que deveriam ser amados, mas só encontram rejeição.
Carmen, que havia ficado em silêncio até então, finalmente falou.
— Senhor Marcos, a Dona Isabela sempre dizia que queria que os filhos crescessem rodeados de amor.
— Ela dizia isso? — perguntou Marcos, com a voz embargada.
— Dizia. Nos últimos meses de gravidez, só falava sobre como seria criar os meninos com muito carinho.
Helena aproximou-se de Marcos devagar.
— Quer tentar, só por alguns minutos?
— Tentar o quê?
— Pegar num dos seus filhos ao colo.
Marcos olhou para os berços como se fossem bombas prestes a explodir.
— Eu não consigo.
— Consegue, sim. E eles precisam disso.
Helena foi até ao berço de Pedro e pegou-o ao colo com cuidado. O bebé continuou a chorar, mas acalmou-se um pouco ao sentir o toque humano. Ela caminhou até Marcos e estendeu-lhe a criança.
— Só por um minuto — insistiu.
Com as mãos a tremer, Marcos pegou no filho nos braços. Pedro era mais pequeno do que ele imaginava, mais frágil, mais real. E no momento em que sentiu o calor do pai, parou completamente de chorar.
O silêncio no quarto foi mágico. Pela primeira vez em oito meses, um dos gémeos parou de chorar nos braços do pai. Paulo, vendo o irmão tranquilo, também diminuiu o choro.
— Meu Deus! — sussurrou Marcos, olhando para o filho.
— Ele parou, porque é isso que ele queria desde sempre — disse Helena. — O amor do pai.
Marcos olhou para Pedro, que agora o observava com olhos curiosos, como se estivesse a conhecer o pai pela primeira vez.
— E talvez estivesse mesmo. Eu sou um péssimo pai — murmurou.
— Não é. É apenas um pai com medo de amar e perder de novo.
— E se eu não conseguir? E se eu só lhes trouxer mais dor?
Helena sorriu pela primeira vez desde que havia chegado.
— Então eu vou ensiná-lo. Afinal, é para isso que estou aqui.
Do lado de fora, a chuva começou a cair, como se o céu estivesse a lavar anos de dor acumulada. E pela primeira vez em oito meses, a casa dos Silveira conheceu alguns minutos de paz.
O momento mágico durou apenas cinco minutos.
Mas quando Marcos tentou devolver o bebé a Helena, as suas mãos começaram a tremer violentamente.
— Eu não posso — disse ele, estendendo Pedro rapidamente. — Não consigo olhar para ele sem ver Isabela a morrer.
Helena pegou no bebé, que imediatamente voltou a chorar, como se soubesse que tinha perdido a sua oportunidade de conexão com o pai.
— Senhor Marcos, o que aconteceu exatamente no dia em que nasceram? — Não. Quero saber o que realmente aconteceu. Os detalhes.
Marcos levantou-se bruscamente da poltrona.
— Por que é que quer saber isso? Não vai mudar nada.
— Vai, sim. Porque enquanto o senhor não enfrentar a verdade, os seus filhos vão continuar a chorar. Eles sentem a sua dor, senhor Marcos. Sentem a sua culpa.
Carmen, que havia ficado em silêncio a observar a cena, deu um passo à frente.
— Senhor, talvez seja a hora de conversar sobre aquele dia.
— Carmen, não!
— Faz oito meses que o senhor carrega este peso sozinho. Não está a funcionar.
Marcos caminhou até à janela, dando as costas a todos.
— Vocês não entendem. Eu matei a minha esposa.
— Como? — perguntou Helena, suavemente.
— Eu convenci-a a ter filhos. Isabela tinha medo da gravidez desde sempre. Dizia que tinha pressentimentos ruins, mas eu insisti. Disse que ela estava a ser boba, que as mulheres tinham filhos todos os dias sem problema.
Os bebés choravam mais baixo agora, como se estivessem a ouvir a confissão do pai.
— Continue — encorajou Helena.
— Durante a gravidez, ela teve várias complicações. Pressão alta, sangramento. O médico sugeriu repouso absoluto, mas eu estava focado nos negócios. Achava que ela estava a exagerar.
— No dia do parto, Isabela estava apavorada. Segurava a minha mão e dizia que tinha a certeza de que algo ia dar errado. Eu ria. Disse que estava a ser dramática. — Marcos virou-se para olhar os filhos, os olhos cheios de lágrimas. — As últimas palavras que ela ouviu de mim foram: “Pára de frescura, Isabela, vai correr tudo bem.”
— E então?
— E então, ela entrou na cirurgia. Fiquei na sala de espera, nervoso, mas ainda a achar que eram preocupações bobas dela. Quando os médicos saíram com os bebés, pensei que tinha acabado. Mas eles voltaram a correr. — A voz de Marcos começou a falhar. — Hemorragia. Não conseguiam estancar o sangue. Passou uma hora, duas horas. E eu lá, a rezar a Deus por mais tempo.
— O que aconteceu depois?
— Depois, um médico veio dizer-me que tinham conseguido parar o sangramento, mas Isabela tinha entrado em coma. Disse que as próximas horas seriam decisivas.
Helena aproximou-se dele.
— E os bebés?
— Os bebés estavam na UTI neonatal, perfeitos, saudáveis, a chorar alto. E eu odiava-os. — Marcos engoliu em seco. — Olhava para eles e pensava: “Por causa de vocês, a minha esposa pode morrer.”
— Isabela ficou em coma por três dias — continuou Marcos, explodindo. — Três dias que passei no hospital sem comer, sem dormir, apenas a orar. E sabe o que fazia? Negociava com Deus.
— Como assim?
— Dizia: “Deus, se salvar a minha esposa, eu faço qualquer coisa. Dou todos os meus bens para a caridade. Dedico a minha vida aos pobres. Qualquer coisa, só não a tire de mim.”
No terceiro dia, Isabela acordou.
— Por algumas horas, pensei que Deus tinha atendido as minhas orações. Ela estava fraca, mas consciente. Falou comigo, perguntou pelos bebés.
— E o que disse?
— Disse que eles estavam bem. Prometi que os íamos criar juntos, que ela ia recuperar completamente. Mentiras. Mentiras que eu queria que fossem verdade.
— Naquela noite, Isabela piorou de novo. Infeção generalizada. O corpo dela não tinha mais forças para lutar. Quando os médicos me chamaram pela última vez, eu sabia. — Marcos sentou-se na poltrona novamente. — Ela pediu-me para prometer uma coisa antes de partir.
— O quê?
— Que eu amaria os nossos filhos por nós dois. Que não os culparia pela morte dela.
— E o que respondeu?
— Prometi. Segurei a mão dela e prometi que seria o melhor pai do mundo. E então ela sorriu, fechou os olhos e…
Marcos desabou a chorar pela primeira vez em oito meses. Soluços profundos que saíam do fundo da alma. Helena colocou Pedro no berço e aproximou-se de Marcos.
— Senhor, não foi culpa sua.
— Foi, sim! Se eu não tivesse insistido para ter filhos, ela estaria viva!
— Ou não. Ninguém sabe o futuro. Isabela escolheu ter filhos também, senhor Marcos. Foi decisão dela.
— Mas eu convenci-a!
— Convencer não é obrigar. Ela podia ter dito não.
Carmen aproximou-se também.
— Senhor Marcos, posso contar uma coisa que nunca contei?
Ele olhou para ela através das lágrimas.
— Dona Isabela veio falar comigo duas semanas antes de os meninos nascerem. Ela disse que tinha medo de morrer no parto, mas que não se arrependia de estar grávida.
— Ela disse isso?
— Disse. Falou que se alguma coisa acontecesse com ela, eu deveria lembrar o senhor de que a escolha tinha sido dela também, que ela queria muito ser mãe. Há mais. Ela pediu-me para esconder algumas coisas para os meninos: cartas, fotos, lembranças. Disse que quando eles crescessem, eu deveria dar-lhes tudo.
— Que cartas?
— Cartas que ela escreveu para Pedro e Paulo. Uma para cada ano de vida deles, até aos dezoito anos. Trinta e seis cartas no total. Estão escondidas no quarto dela. A Dona Isabela deu-me uma chave extra e fez-me prometer que só abriria o quarto quando o senhor estivesse pronto.
Marcos olhou para Carmen com incredulidade.
— Você teve acesso ao quarto este tempo todo?
— Tive, mas respeitei a sua dor. Sabia que não era a hora.
— E agora é — adiantou-se Helena. — Agora os seus filhos precisam de conhecer a mãe, e o senhor precisa de se despedir de verdade.
— Eu não sei se consigo entrar naquele quarto — admitiu.
— Não precisa entrar sozinho — disse Helena. — Nós vamos consigo. E se for muito doloroso…
— Vai ser. Mas a dor que o senhor está a sentir agora, a fugir das lembranças, é pior.
Marcos levantou-se devagar, como um homem a caminhar para o seu próprio julgamento.
— Está bem. Mas se eu não conseguir ficar lá dentro, a gente sai.
— Combinado — disse Helena.
Saíram do quarto dos bebés, deixando a porta aberta para poderem ouvir se voltassem a chorar. Caminharam pelo corredor até à porta do quarto principal, que estava fechada há tantos meses. Carmen colocou a chave na fechadura.
— Senhor, tem a certeza?
Ele respirou fundo.
— Tenho.
A porta abriu-se com um ranger. O quarto estava escuro, com as cortinas fechadas e um cheiro a mofo. Carmen acendeu a luz e todos ficaram parados na entrada. O quarto estava exatamente como Isabela o tinha deixado. A cama arrumada, os perfumes na penteadeira, roupas no armário entreaberto. Era como se ela tivesse saído para o hospital e fosse voltar a qualquer momento.
— Eu posso sentir o perfume dela.
— Dona Isabela usava sempre aquele perfume de rosas — disse Carmen, suavemente.
Carmen foi até ao guarda-roupa e abriu uma gaveta no fundo.
— As cartas estão aqui.
Tirou uma caixa de madeira decorada, cheia de envelopes numerados. No primeiro envelope estava escrito: Para Pedro e Paulo. Primeiro ano de vida. Marcos pegou no envelope com as mãos a tremer.
— Posso abrir?
— Pode. Ela deixou instruções para que fossem abertas quando necessário.
Ele abriu cuidadosamente e tirou uma carta escrita à mão, com a letra delicada de Isabela.
— Leia em voz alta — pediu Helena.
Marcos começou a ler, a voz embargada.
— “Meus amores, Pedro e Paulo, se estão a ouvir esta carta, significa que eu não pude ficar para cuidar de vocês pessoalmente. Mas saibam que cada segundo da gestação foi a época mais feliz da minha vida.”
Ele parou, as lágrimas dificultando a continuação.
— Continue — encorajou Helena.
— “O vosso pai pode estar triste e com raiva agora. Talvez até vos culpe pela minha partida. Mas não o culpem. Ele amava-me tanto que deve estar perdido sem mim. Tenham paciência com o vosso pai.” — Marcos desabou a chorar novamente. — “Quero que saibam que vos escolhi. Mesmo sabendo dos riscos, escolhi dar-vos vida e faria a mesma escolha milhões de vezes. Vocês são o maior presente que eu poderia dar ao mundo.”
Carmen terminou de ler, com a voz embargada.
— “Vivam felizes, meus amores. Sejam gentis. Sejam corajosos. Sejam amados. E saibam que, onde eu estiver, estarei sempre a cuidar de vocês. Com todo o meu amor, Mamã Isabela.”
O silêncio no quarto foi total. Três adultos choravam, a processar palavras escritas por uma mulher que sabia que ia morrer, mas que escolheu deixar amor em vez de amargura.
— Ela não me culpa — sussurrou Marcos.
— Nunca culpou — confirmou Carmen. — Ela disse-me que a única coisa que a deixava triste era pensar que o senhor se poderia culpar para sempre.
— Os seus filhos não mataram a sua esposa, senhor Marcos. Eles são o último presente que ela lhe deu.
Marcos olhou ao redor do quarto, vendo pela primeira vez não um mausoléu de dor, mas um lugar cheio de amor e lembranças felizes.
— Eu quero tentar — disse finalmente.
— Tentar o quê?
— Ser o pai que Isabela esperava que eu fosse.
Helena sorriu através das lágrimas.
— Então, vamos começar agora.
Saíram do quarto, deixando a porta aberta pela primeira vez em oito meses. Quando chegaram ao quarto dos bebés, encontraram Pedro e Paulo a dormir pacificamente. Pela primeira vez em oito meses, não estavam a chorar.
Às três da manhã, pela primeira vez em oito meses, Marcos não foi acordado pelos gritos dos gémeos. O silêncio na casa era tão profundo que ele acordou sozinho, confuso, a achar que algo terrível tinha acontecido. Correu para o quarto dos bebés, com o coração a mil.
Pedro e Paulo dormiam tranquilamente nos berços, a respirar suavemente, com expressões serenas que ele nunca tinha visto nos seus rostos. Pela primeira vez, pareciam realmente bebés normais.
— Senhor Marcos — sussurrou Helena, acordando com o barulho dele à porta.
— Eles estão bem? — perguntou ele, baixinho, com medo de quebrar o encanto.
— Estão. Dormiram a noite toda sem um único gemido.
Marcos aproximou-se dos berços devagar, como se estivesse a ver os filhos pela primeira vez.
— Parecem diferentes — murmurou.
— Não são eles que estão diferentes, senhor Marcos. É o senhor.
— Como assim?
— Ontem, quando leu a carta de Isabela, algo mudou dentro do senhor. E eles sentiram. Eles viveram oito meses a sentir a sua culpa, a sua raiva, a sua rejeição. Ontem, sentiram amor pela primeira vez.
Marcos ficou em silêncio, a observar os filhos. Era verdade que algo tinha mudado. A culpa esmagadora tinha diminuído, substituída por uma compreensão dolorosa, mas necessária.
— Por que é que se importa tanto? Não me conhece, nem conhecia a minha família. Por que é que está a fazer isto?
Helena sorriu tristemente.
— Porque sei como é crescer sem o amor do pai. O meu pai amava-me, mas estava perdido na própria dor. Depois que a minha mãe morreu, ele passou dois anos a culpar-me pelo que aconteceu. Dois anos em que eu senti que não merecia existir. Não quero que os seus filhos passem pelo que eu passei.
Pedro mexeu-se no berço, mas continuou a dormir. Marcos estendeu a mão e tocou na bochecha de Pedro. A pele era macia e quente, completamente real.
— Ele é tão pequeno — murmurou.
— Precisa muito do senhor. Eu não sei como ser pai, Helena. Nunca aprendi.
— Ninguém nasce a saber. A gente aprende a fazer.
Nesse momento, Paulo acordou. Não chorou. Apenas abriu os olhos e olhou ao redor. Quando viu Marcos, observou-o, curioso.
— Ele está a olhar para mim — disse Marcos, surpreso.
— Está. Quer conhecer o pai. E agora? O que faço?
— Fale com ele.
Marcos aproximou-se do berço de Paulo, nervoso.
— Oi, filho.
A palavra “filho” saiu estranha da sua boca. Mas Paulo sorriu, um sorriso pequeno, mas inconfundível.
— Ele sorriu! — exclamou Marcos, baixinho.
— Sorriu porque reconheceu a voz do pai.
Marcos começou a cantarolar baixinho, a canção de embalar que Isabela cantava. O efeito foi mágico. Os dois bebés relaxaram completamente, como se a canção despertasse alguma memória profunda.
— Eles conhecem essa música? — disse Helena, emocionada.
— Isabela cantava todos os dias. Dizia que queria que eles nascessem já a saber que eram amados. E sabem. É por isso que pararam de chorar quando o senhor finalmente começou a demonstrar amor.
Quando os bebés adormeceram novamente, Marcos ficou ali parado, a observá-los, sentindo algo novo a crescer no peito. Não era mais dor ou culpa, era proteção, cuidado, responsabilidade.
— Helena — disse ele. — Posso contar-lhe um segredo? Eu sempre quis ser pai. Mas quando Isabela morreu, foi como se esse sonho tivesse virado pesadelo.
— E agora?
— Agora estou com medo. Medo de tentar e não conseguir ser o pai que eles merecem.
— Não existe pai perfeito. Existem pais que tentam, que se importam, que estão presentes. Isabela não esperava que o senhor fosse perfeito. Ela esperava que tentasse.
Pedro mexeu-se no berço e estendeu os bracinhos para cima, como se pedisse colo.
— Ele quer que eu o pegue ao colo? — perguntou Marcos, incrédulo.
— Quer. Está a pedir o carinho do pai.
Com o coração a bater forte, Marcos pegou Pedro nos braços. O bebé aninhou-se contra o seu peito, suspirando contente. Era a primeira vez em oito meses que um dos filhos se sentia realmente seguro nos braços do pai.
— É uma sensação incrível — murmurou Marcos. — É o que Isabela queria que o senhor sentisse desde o primeiro dia.
Paulo, vendo o irmão ao colo do pai, também começou a estender os bracinhos. Helena ajudou Marcos a acomodar Paulo no outro braço. Pela primeira vez na vida, segurava os dois filhos ao mesmo tempo. Pedro e Paulo acalmaram-se completamente, como se finalmente estivessem onde sempre deveriam estar.
— Eles são tão pequenos — disse Marcos, emocionado. — E dependem completamente de mim.
— Dependem. Mas o senhor é capaz de cuidar deles.
— Você salvou a minha família.
— Não salvei. Apenas mostrei o que já existia.
— Mesmo assim, eu lhe devo mais do que posso pagar.
— Não me deve nada, senhor. Ver estes bebés felizes já é pagamento suficiente.
Naquela manhã, Marcos desceu para a cozinha, ainda a carregar os dois filhos. Helena preparou os biberões, e Marcos seguiu as instruções cuidadosamente. Quando os bebés terminaram de mamar, Marcos embalou-os, cantando a canção de embalar de Isabela.
— Por que é que é tão diferente das outras pessoas que trabalharam aqui?
— Porque já estive no lugar deles — Helena sorriu. — Sei como é ser criança e sentir que não é amada.
— Eu não quero que Pedro e Paulo tenham essas cicatrizes — disse Marcos, a abraçar os filhos.
— Então, não terão. Porque o senhor vai estar presente.
Seis meses depois daquela primeira noite de paz, a casa dos Silveira tinha-se transformado. Marcos acordava todos os dias a querer ver Pedro e Paulo. Numa manhã de sábado, Helena estava na cozinha quando ouviu Marcos gritar do andar de cima. Subiu a correr.
Encontrou Marcos no quarto, segurando Pedro, os olhos cheios de lágrimas de alegria.
— Helena, você não vai acreditar! Ele andou!
Pedro deu os seus primeiros passos cambaleantes em direção a Helena. Paulo tentou logo a seguir, caindo sentado e rindo alto.
— Os dois, no mesmo dia! — exclamou Helena. — Que coincidência incrível!
— Não é coincidência — disse Marcos. — É hoje. Hoje faz exatamente um ano que Isabela morreu. E eles escolheram hoje para dar os primeiros passos. É como se Isabela estivesse a dizer que está tudo bem.
Carmen apareceu à porta.
— A Dona Isabela está a ver tudo. Tenho a certeza absoluta.
— Helena — disse Marcos. — Você não é mais a nossa empregada. É família. Quero que seja oficialmente a madrinha de Pedro e Paulo. Quero que ajude a criá-los.
Helena chorou, emocionada.
— Aceito. Seria uma honra ser madrinha deles.
Nesse momento, Pedro olhou para Marcos e disse claramente:
— Papai!
Todos ficaram em silêncio absoluto. Era a primeira palavra clara que qualquer um dos bebés tinha falado.
— Papai! — repetiu Pedro, sorrindo orgulhoso.
— Pá-papai — tentou Paulo.
— Eu soube que não era coincidência — disse Carmen. — Foi providência divina.
— Obrigado, Helena — disse Marcos, abraçando-a, com os dois bebés ao colo. — Por me devolver os meus filhos e por me devolver a mim mesmo.
— E vocês salvaram o meu futuro — ela sorriu. — Deram-me a família que sempre sonhei ter.
Uma hora depois, estavam no cemitério. Marcos carregava Pedro, Helena carregava Paulo, e Carmen levava um bouquet de rosas brancas.
— Oi, amor — disse Marcos, ajoelhando-se diante da lápide. — Trouxe os nossos filhos para você conhecer. Eles aprenderam a andar hoje, e disseram “Papai” pela primeira vez.
— Quero que conheça Helena. Ela salvou-nos. Vai ser madrinha de Pedro e Paulo.
O vento balançou as árvores ao redor, como se Isabela estivesse a dar a sua aprovação.
— Obrigado, amor. Por me dar estes dois tesouros, por me ensinar que o amor é mais forte que a dor, por me perdoar.
Ficaram ali por alguns minutos em silêncio. Uma família reconstruída pelo amor e pela determinação de nunca desistir.
Em casa, a casa estava em paz, cheia de vida e possibilidades. A empregada que ninguém queria tinha-se tornado a peça mais importante da família. E os bebés, que choravam todas as noites, agora enchiam a casa com risadas todos os dias. O milagre estava completo.