(1906, Ribeirão Preto) O Horripilante Caso de Mariana Queiroz

No outono de 1906, Ribeirão Preto vivia o auge da prosperidade cafira. As fazendas se estendiam pelos morros vermelhos da região e o dinheiro do café havia transformado a cidade em um dos centros urbanos mais prósperos do interior paulista. Era neste cenário de riqueza e modernidade que a família Queiroz mantinha uma das propriedades mais respeitadas do município, a fazenda Santa Eulalia, localizada a cerca de 15 km do centro da cidade, numa região de colinas suaves cortadas pelo ribeirão que dava nome ao lugar. A família

Queiroz havia chegado à região em 1872, quando Joaquim Bernardino Queiroz, patriarca da linhagem, adquiriu as primeiras terras e plantou os primeiros pés de café. Em 1906, a propriedade estava sob o comando de seu filho, Antônio Lourenço Queiroz, homem de 43 anos, conhecido na região pela severidade com que conduzia os negócios e pela descrição absoluta com que tratava dos assuntos familiares.

Antônio havia se casado em 1885 com Helena Francisca da Silva, filha de uma família tradicional de Campinas. Do casamento nasceram quatro filhos. Mariana, a primogênita, nascida em 1886, portanto com 20 anos em 1906. Carlos Augusto, nascido em 1888. Isabel Cristina, nascida em 1990, e o Cassaula Pedro Henrique, nascido em 1893.

A fazenda Santa Eulália ocupava uma extensão de aproximadamente 300 alqueires, com a casa principal situada no topo de uma elevação natural que oferecia vista panorâmica das plantações. A construção erguida em 1878 seguia o estilo típico das casas de fazenda da época. estrutura de pau a pique, com paredes grossas de adobe, telhado de duas águas coberto por telhas francesas e um alpendre amplo que circundava toda a frente e as laterais da residência.

O que distinguia a casa grande da fazenda Santa Eulália de outras propriedades da região era sua disposição peculiar. A construção original havia sido ampliada em duas ocasiões. Primeiro, em 1885, quando foi acrescentada uma ala inteira para acomodar os filhos do casal. E novamente em 1895, quando Antônio mandou construir um anexo nos fundos destinado a abrigar sua crescente biblioteca e um escritório particular onde conduzia os negócios mais reservados da fazenda.

Esta última ampliação criou uma configuração arquitetônica incomum. A casa passou a ter duas entradas principais, uma voltada para a estrada que levava à cidade e outra que dava acesso direto aos fundos da propriedade, onde ficavam as cenzalas desativadas desde a abolição e os novos alojamentos dos colonos europeus que haviam chegado para trabalhar na lavoura.

Os empregados da casa eram poucos, mas faziam parte da família há décadas. Rosa Benedita Santos, de 52 anos, havia sido escravizada na propriedade e permanecera como cozinheira após a abolição. João Batista Ferreira, de 48 anos, cuidava dos cavalos e da manutenção da casa, também ex-escravizado, que escolhera ficar na fazenda.

Havia ainda Maria das Dores Oliveira, de 35 anos, que auxiliava nos serviços domésticos. e cuidava especialmente das roupas da família. A rotina da fazenda Santa Eulália seguia um ritmo quase religioso. Antônio levantava às 5 da manhã para acompanhar o início dos trabalhos na lavoura. Helena dedicava as manhãs à administração doméstica e as atividades de beneficência na região.

Filhas, Mariana e Isabel dividiam o tempo entre os estudos particulares ministrados por uma preceptora que vinha da cidade três vezes por semana e as atividades próprias de moças de família abastada, bordado, piano, francês e leitura dos romances que chegavam de São Paulo. Mariana Queiroz, aos 20 anos, era descrita pelos contemporâneos como uma jovem de beleza discreta.

mas de inteligência notável. Tinha cabelos castanho escuros, sempre presos em um coque baixo, olhos amendoados de cor parda e uma estatura mediana para os padrões da época. O que mais chamava a atenção nela, segundo os relatos preservados, era sua paixão pelos livros e por longas caminhadas pelas trilhas que cortavam a propriedade.

Desde pequena, Mariana demonstrava uma curiosidade incomum pelo passado da fazenda e pela história das famílias que haviam vivido na região antes da chegada dos queiroz. costumava conversar longamente com Rosa Benedita sobre os tempos da escravidão, fazendo perguntas que deixavam a cozinheira desconfortável.

Em várias ocasiões, Rosa foi vista saindo dessas conversas com os olhos vermelhos, como se tivesse chorado. Isabel, se anos mais nova que a irmã, era de temperamento completamente oposto, alegre, expansiva, adorava as festas da cidade e sonhava com um casamento que a levasse para São Paulo ou Rio de Janeiro. As duas irmãs, apesar da diferença de idade e personalidade, mantinham uma relação próxima, embora marcada por silêncios estranhos que não passaram despercebidos aos empregados da casa. Carlos Augusto, o filho do meio, havia partido para São Paulo em 1905

para estudar direito na Faculdade do Largo de São Francisco. Suas visitas à fazenda eram raras e sempre breves. Pedro Henrique Oula, com 13 anos em 1906, estudava no colégio interno dos Padres Salesianos em Campinas, retornando apenas durante as férias escolares. A primeira irregularidade documentada na rotina da fazenda Santa Eulália ocorreu na manhã de 15 de abril de 1906.

Rosa Benedita relatou posteriormente que ao preparar o café da manhã, como fazia há mais de 20 anos, notou que Mariana não havia descido para a refeição matinal no horário habitual. Isso era incomum, pois a jovem mantinha uma pontualidade rigorosa em todas as atividades domésticas.

Quando Rosa subiu para verificar se Mariana estava indisposta, encontrou o quarto vazio, mas a cama feita de maneira impecável. As roupas que Mariana havia usado no dia anterior estavam dobradas sobre a cadeira e seu vestido de passeio matinal armário. A janela do quarto permanecia fechada, assim como a porta havia sido encontrada pela manhã.

Helena Queiroz, questionada sobre o paradeiro da filha, respondeu que Mariana havia saído cedo para uma de suas caminhadas habituais pela propriedade, atividade que praticava regularmente desde os 15 anos. Antônio, consultado durante o almoço, confirmou a versão da esposa e acrescentou que havia autorizado a filha a explorar livremente todas as trilhas da fazenda, desde que retornasse antes do anoitecer.

No entanto, Mariana não retornou para o almoço, nem para o jantar. Quando a escuridão tomou conta da propriedade e ela ainda não havia aparecido, Antônio organizou uma busca com os colonos e empregados da fazenda. Durante toda a noite de 15 para 16 de abril, homens com lampiões percorreram cada trilha, cada bosque, cada clareira da propriedade.

João Batista Ferreira relatou posteriormente que durante a busca noturna, o grupo encontrou pegadas de pés descalços numa trilha que levava a uma parte mais afastada da propriedade, próxima aos limites com a fazenda vizinha. As pegadas eram pequenas, compatíveis com os pés de Mariana, mas o estranho era que pareciam seguir um caminho em círculos, como se a pessoa estivesse desorientada ou procurando algo específico.

No final da trilha, os homens descobriram uma clareira natural que nenhum deles conhecia, apesar de trabalharem na fazenda há décadas. A clareira estava rodeada por árvores antigas, algumas com troncos tão largos que três homens não conseguiriam abraçá-las. No centro da área aberta havia uma depressão circular no solo, como se alguém tivesse cavado e depois coberto novamente a terra.

Antônio ordenou que escavassem o local imediatamente. Após cavarem aproximadamente 1 m de profundidade, encontraram uma caixa de madeira do tamanho de um baú pequeno. A madeira estava deteriorada pela humidade, mas ainda resistente. Quando a abriram, descobriram que continha objetos pessoais: roupas de criança, sapatos pequenos, brinquedos de madeira e diversos papéis manuscritos em estado de conservação precário.

Os papéis, examinados posteriormente por Antônio à luz de lampiões, conham o que pareciam ser cartas escritas por crianças, mas o conteúdo era perturbador. As cartas falavam sobre o lugar onde ninguém nos encontra, os jogos que o Senhor nos ensina e o segredo que não podemos contar para ninguém. Algumas cartas mencionavam nomes que Antônio reconheceu. Eram filhos de colonos e empregados que haviam trabalhado na fazenda nas décadas anteriores. A descoberta causou um mal-estar imediato entre os homens presentes.

Rosa Benedita, que havia insistido em acompanhar a busca, apesar das objeções de Antônio, ao ver o conteúdo da caixa, caiu de joelhos e começou a chorar de forma incontrolável. Quando conseguiu falar, repetia apenas: “Eu sabia, eu sempre soube, mas não podia falar.

” Antônio ordenou que a caixa fosse levada de volta à casa e guardada em segurança. Também determinou que ninguém comentasse a descoberta com pessoas estranhas à propriedade. A busca por Mariana continuou durante toda a madrugada, mas sem resultados. Quando o sol nasceu em 16 de abril, ela continuava desaparecida.

Durante os dias seguintes, uma atmosfera de tensão silenciosa se instalou na fazenda Santa Eulalia. Helena passou a permanecer trancada em seus aposentos na maior parte do tempo. Isabel, que inicialmente havia demonstrado preocupação natural com o desaparecimento da irmã, tornou-se estranhamente calada e evitava qualquer conversa sobre o assunto.

Antônio mantinha suas atividades normais durante o dia, supervisionando os trabalhos da lavoura e atendendo aos negócios da fazenda. No entanto, todas as noites, ele se recolhia ao seu escritório nos fundos da casa e permanecia lá até altas horas, examinando papéis e documentos. As luzes do escritório eram visíveis dos alojamentos dos colonos e alguns relataram posteriormente que ocasionalmente ouviam o som de papel sendo queimado na lareira, mesmo durante as noites mais quentes do outono.

No dia 20 de abril, 5 dias após o desaparecimento de Mariana, um evento inesperado mudou completamente o rumo dos acontecimentos. Por volta das 2 horas da tarde, Mariana apareceu caminhando pela estrada principal que levava à fazenda, vinda da direção da cidade. Rosa Benedita foi a primeira a vê-la chegando.

Relatou posteriormente que Mariana caminhava com passos regulares, mas lentos, e que seu vestido estava limpo e bem arrumado, como se tivesse acabado de se vestir. Seus cabelos estavam perfeitamente penteados e ela carregava nas mãos um pequeno buquê de flores silvestres. Quando Rosa correu para abraçá-la, Mariana a cumprimentou com naturalidade, como se tivesse saído apenas para um passeio matinal.

Perguntada sobre onde havia estado durante os cinco dias, Mariana respondeu que havia visitado os amigos antigos e que havia ajudado a resolver algumas questões pendentes. Helena, chamada às pressas, encontrou a filha sentada na sala principal da casa, arrumando as flores silvestres em um vaso.

Ariana a cumprimentou com um beijo no rosto e comentou que estava com fome, perguntando se poderia almoçar. Comportava-se como se nada de extraordinário tivesse acontecido. Antônio, informado do retorno da filha, deixou imediatamente os trabalhos na lavoura e voltou para casa. O encontro entre pai e filha foi presenciado por Rosa Benedita, que estava servindo o almoço tardio de Mariana.

Segundo seu relato, Antônio entrou na sala com expressão severa, mas ao ver Mariana, sua fisionomia mudou drasticamente, ficou pálido e permaneceu parado por vários segundos, como se tivesse visto um fantasma. Mariana levantou-se da mesa e caminhou até o pai. Segurou suas mãos e disse com voz calma e clara: “Não se preocupe, papai. Tudo está resolvido agora.

Os segredos antigos foram colocados em seus devidos lugares. Antônio não respondeu, apenas assentiu com a cabeça e se retirou para seu escritório, onde permaneceu pelo resto do dia. A partir do retorno de Mariana, a rotina da fazenda Santa Eulalia nunca mais foi a mesma.

A jovem retomou suas atividades habituais, as aulas com a preceptora, as caminhadas pela propriedade, a leitura em sua biblioteca particular. No entanto, os empregados da casa notaram mudanças sutis em seu comportamento. Mariana havia desenvolvido o hábito de conversar sozinha durante as caminhadas. Rosa Benedita, que ocasionalmente a observava da janela da cozinha, relatou que via a jovem parar em determinados pontos da propriedade e falar com alguém que não estava visível. Às vezes gesticulava como se estivesse explicando algo.

Outras vezes permanecia imóvel, como se estivesse ouvindo respostas. Isabel começou a evitar a irmã sempre que possível. Quando, questionada posteriormente sobre o motivo, disse apenas que Mariana falava sobre coisas que uma moça não deveria saber e que seus olhos haviam adquirido uma expressão que assustava.

As refeições familiares, que anteriormente eram momentos de conversa animada, tornaram-se ocasiões de silêncio quase absoluto. Helena comia mecanicamente, sem levantar os olhos do prato. Antônio mantinha uma expressão tensa e respondia apenas com monossílabus quando alguém lhe dirigia a palavra. Isabel inventava desculpas para fazer as refeições em seus aposentos.

Apenas Mariana parecia à vontade, comentando sobre assuntos triviais, como se nada tivesse mudado. João Batista Ferreira relatou que durante maio de 1906 começou a notar mudanças na rotina de Antônio. O fazendeiro passou a sair sozinho durante as noites, sempre na direção da clareira, onde haviam encontrado a caixa enterrada.

João, preocupado com a segurança do patrão, decidiu segui-lo discretamente em algumas ocasiões. Segundo o relato de João Batista, Antônio permanecia na clareira por períodos longos, às vezes até duas ou três horas. Carregava sempre uma lamparina e alguns papéis. João nunca conseguiu se aproximar o suficiente para ouvir o que Antônio fazia exatamente, mas descreveu que o fazendeiro parecia estar lendo em voz alta e ocasionalmente enterrando pequenos objetos em diferentes pontos da clareira.

Em uma ocasião específica, durante a última semana de maio, João relatou ter visto Mariana na Clareira antes da chegada de Antônio. A jovem estava de pé no centro da área, vestida com um camisão branco, completamente imóvel. Quando Antônio chegou, aproximou-se dela e os dois ficaram conversando por um longo período. João não conseguiu ouvir a conversa, mas notou que em nenhum momento Mariana se moveu de sua posição central.

Durante o mês de junho, os empregados da fazenda começaram a relatar eventos que consideraram inexplicáveis. Rosa Benedita disse que às vezes encontrava pratos de comida em locais estranhos da casa. no alpendre dos fundos, no sótam, na dispensa. Quando questionava os membros da família, todos negavam ter colocado os pratos nesses lugares.

Maria das Dores relatou que várias peças de roupa infantil apareciam lavadas e estendidas no varal, apesar de não haver crianças pequenas na casa. As roupas eram de tamanhos variados, como se fossem de diferentes idades, e ninguém admitia tê-las lavado. João Batista encontrou brinquedos de madeira espalhados pelo pátio da casa em diversas manhãs.

Eram brinquedos antigos, similares aos que haviam sido encontrados na caixa enterrada, mas aparentavam ter sido recém fabricados. Quando mostrava os brinquedos para a família, Antônio ordenava que fossem queimados imediatamente. Durante este período, Mariana mantinha longas conversas com Rosa Benedita sobre o passado da fazenda.

A cozinheira, que inicialmente resistia a essas conversas, gradualmente começou a relatar eventos que havia presenciado durante seus anos de trabalho na propriedade. Rosa contou a Mariana sobre crianças que haviam desaparecido durante os primeiros anos da fazenda quando Joaquim Bernardino Queiroz ainda estava vivo. falou sobre filhos de escravizados que saíam para brincar e nunca mais retornavam, sendo encontrados dias depois em estado que ela se recusava a descrever em detalhes.

mencionou que Joaquim tinha o hábito de levar crianças para passeios educativos pelas trilhas mais afastadas da propriedade e que essas crianças voltavam mudadas, assustadas, incapazes de falar sobre o que haviam experienciado. Segundo Rosa, Helena sempre soubera dessas histórias, mas nunca ousara confrontar o sogro ou posteriormente questionar Antônio sobre a continuidade de certas tradições familiares.

A cozinheira sugeriu que Antônio havia herdado não apenas a propriedade, mas também determinadas responsabilidades que vinham sendo passadas de pai para filho na família Queiroz. Durante essas conversas, Mariana ouvia tudo com atenção absoluta, fazendo anotações em um caderno que mantinha sempre consigo.

Ocasionalmente fazia perguntas específicas sobre datas, nomes e detalhes que Rosa considerava perturbadoramente precisas, como se Mariana já soubesse as respostas e estivesse apenas confirmando informações. No início de julho, Mariana anunciou à família que gostaria de organizar uma festa para celebrar seu 21º aniversário, que ocorreria em agosto.

A sugestão surpreendeu a todos, pois Mariana nunca havia demonstrado interesse por eventos sociais. Antônio inicialmente se opôs à ideia, mas Mariana insistiu, argumentando que seria uma oportunidade de retribuir a hospitalidade das famílias vizinhas. Helena apoiou exitantemente a proposta da filha, talvez enxergando na festa uma possibilidade de retorno à normalidade. Isabel demonstrou entusiasmo, pois há meses não participava de nenhuma atividade social.

Antônio finalmente cedeu, mas estabeleceu condições rígidas. A festa seria pequena, apenas para as famílias mais próximas e encerraria antes das 10 horas da noite. Durante as semanas de preparação, Mariana demonstrou uma energia incomum. Supervisionava pessoalmente todos os detalhes, o cardápio, a decoração, a música, a lista de convidados.

insistiu que a festa fosse realizada no alpendre dos fundos da casa, área que normalmente era pouco utilizada para eventos sociais. Rosa Benedita notou que Mariana fazia questão de preparar pessoalmente alguns pratos específicos para a festa. eram receitas que a cozinheira não conhecia, baseadas em ingredientes que Mariana trazia de suas caminhadas pela propriedade, ervas silvestres, raízes, flores específicas.

Quando Rosa perguntou onde havia aprendido essas receitas, Mariana respondeu que os amigos antigos haviam ensinado. A festa foi marcada para o dia 15 de agosto de 1906. Durante a semana anterior ao evento, Mariana passou a sair todas as manhãs para longas caminhadas, sempre carregando uma cesta vazia e retornando com ela cheia de ingredientes que ninguém conseguia identificar.

Antônio, durante este período, demonstrava uma agitação crescente. João Batista relatou que o patrão havia voltado a fazer suas visitas noturnas à clareira, mas agora com maior frequência, às vezes saindo duas ou três noites por semana. Em algumas ocasiões, João notou que Antônio retornava dessas saídas com as roupas sujas de terra, como se tivesse estado cavando.

Na manhã de 15 de agosto, dia da festa, Mariana acordou antes do amanhecer e foi encontrada por Rosa Benedita na cozinha, preparando uma bebida que exalava um aroma doce e peculiar. Quando questionada sobre o que estava fazendo, Mariana explicou que estava preparando uma bebida especial para brindar seu aniversário, uma receita que havia descoberto recentemente.

Durante a tarde, chegaram à fazenda cerca de 20 convidados, fazendeiros vizinhos com suas famílias, o médico da cidade, Dr. Sebastião Almeida Costa, o padre local Pedro Francisco Antônio Barbosa e algumas famílias da elite comercial de Ribeirão Preto. A festa começou às 5 horas da tarde com um clima aparentemente normal. Os convidados elogiaram a decoração e a comida.

Helena parecia mais relaxada do que havia estado em meses. Isabel conversava animadamente com outras jovens da região. Antônio mantinha sua habitual reserva, mas recebia os cumprimentos dos convidados com cortesia. Por volta das 7 horas da tarde, Mariana anunciou que gostaria de fazer um brinde especial. pediu que todos os convidados se reunissem no alpendre dos fundos e serviu a bebida que havia preparado pela manhã.

A bebida tinha corambar e um sabor que muitos dos presentes descreveram posteriormente como doce, mas com um final amargo em comum. Após o brinde, Mariana pediu atenção e disse que gostaria de contar uma história para os convidados. explicou que havia descoberto recentemente alguns fatos interessantes sobre a história da fazenda Santa Eulália e que achava apropriado compartilhar essas descobertas na ocasião de seu aniversário.

O relato subsequente de Mariana causou um desconforto crescente entre os presentes. Ela começou falando sobre a chegada de Joaquim Bernardino Queiroz à região e sua rapidez em adquirir terras a preços muito baixos. Mencionou que havia encontrado correspondências antigas que sugeriam que Joaquim tinha métodos pouco convencionais para convencer outros proprietários a vender suas terras.

Mariana então passou a falar sobre as crianças que haviam desaparecido durante os primeiros anos da fazenda. Com uma calma desconcertante, mencionou nomes específicos, datas, circunstâncias. Alguns dos convidados mais velhos reconheceram os nomes, pois haviam conhecido as famílias envolvidas décadas antes. Dr.

Sebastião Almeida Costa, que havia atendido várias dessas famílias durante sua carreira, ficou visivelmente perturbado quando Mariana mencionou detalhes médicos sobre as condições em que algumas crianças haviam sido encontradas. Detalhes que, segundo ele, nunca haviam sido divulgados publicamente. Antônio tentou interromper o relato da filha várias vezes, mas Mariana continuava falando com uma determinação inabalável.

Sua voz permanecia calma e clara, como se estivesse recitando fatos históricos bem documentados. A situação tornou-se ainda mais tensa quando Mariana começou a falar sobre tradições familiares que envolviam educação especial de crianças selecionadas. Usou termos ambíguos, mas que deixaram clara a natureza perturbadora dessas práticas.

Mencionou que essas tradições haviam sido transmitidas de pai para filho e que recentemente havia descoberto que ainda estavam sendo mantidas. P. Francisco Antônio Barbosa levantou-se e disse que achava apropriado encerrar a festa. Vários outros convidados concordaram e começaram a se preparar para partir. Mariana, no entanto, pediu que esperassem mais alguns minutos, pois tinha uma revelação final a fazer.

Foi neste momento que ela revelou ter encontrado, durante seus cinco dias de ausência em abril, um local onde estavam enterrados os restos de pelo menos 12 crianças. Disse que havia passado esses dias conversando com elas e entendendo o que realmente havia acontecido. Acrescentou que agora sabia exatamente quem era o responsável por suas mortes e que estava pronta para garantir que a justiça fosse feita. O silêncio que se seguiu a essa declaração foi absoluto.

Antônio estava lívido, com as mãos tremendo visivelmente. Helena havia desabado em uma cadeira, cobrindo o rosto com as mãos. Isabel chorava silenciosamente. Doutor Sebastião foi o primeiro a recuperar a compostura e perguntou a Mariana onde exatamente ela havia feito essa descoberta.

Mariana respondeu que poderia mostrar o local a qualquer pessoa que tivesse interesse em verificar suas afirmações. Sugeriu que a investigação começasse pela clareira que fica nos fundos da propriedade, onde certamente encontrariam evidências que comprovariam tudo o que havia relatado. Antônio finalmente conseguiu falar. Com voz rouca, disse que Mariana estava passando por um momento de confusão mental.

e que nada do que havia relatado tinha fundamento na realidade. Pediu desculpas aos convidados e sugeriu que a festa fosse encerrada. No entanto, alguns dos convidados, particularmente doutor. Sebastião e Pedro Francisco insistiram que as alegações de Mariana eram graves demais para serem ignoradas, mesmo considerando a possibilidade de confusão mental.

propuseram que na manhã seguinte fosse organizada uma investigação informal do local mencionado. Antônio se opôs veementemente à proposta, argumentando que seria uma violação da propriedade privada baseada em delírios de uma jovem perturbada. No entanto, Mariana interveio e diz que autorizava formalmente a investigação, pois considerava que a verdade precisava ser revelada.

A discussão entre os presentes estendeu-se por mais de uma hora. Finalmente ficou acordado que na manhã de 16 de agosto, um pequeno grupo composto pelo Dr. Sebastião Pet Francisco e dois fazendeiros vizinhos retornariam para acompanhar Mariana até o local que ela havia mencionado. Os convidados partiram em um clima de tensão extrema.

Muitos dos presentes relataram posteriormente que a festa havia sido o evento mais perturbador de que haviam participado. Vários mencionaram que a bebida servida por Mariana havia deixado um gosto estranho na boca que persistiu por dias. Durante a noite de 15 para 16 de agosto, a fazenda Santa Eulalia foi palco de eventos que apenas os empregados da casa presenciaram.

Rosa Benedita relatou que por volta da meia-noite ouviu ruídos vindos da direção da clareira. Eram sons de escavação, como se alguém estivesse cavando com ferramentas. João Batista, investigando os ruídos, viu Antônio caminhando em direção aos fundos da propriedade, carregando duas paz e uma lamparina. Cerca de uma hora depois, viu Mariana seguindo o mesmo caminho, mas caminhando descalça e vestindo apenas um camisão branco.

Maria das Dores relatou que durante toda a madrugada ouviu vozes vindas da direção da clareira. não conseguiu distinguir palavras específicas, mas descreveu as vozes como uma conversa entre duas pessoas que estavam resolvendo algo muito importante. Pouco antes do amanhecer, João Batista viu Antônio retornando da clareira sozinho.

Carregava apenas uma pá e suas roupas estavam completamente sujas de terra. caminhava lentamente, como se estivesse exausto, e foi direto para seu escritório nos fundos da casa. Mariana retornou cerca de uma hora depois do nascer do sol. Rosa Benedita, que a viu chegando, relatou que a jovem caminhava normalmente, mas que seu camisão estava limpo, como se não tivesse tido contato com terra ou vegetação.

Seus pés também estavam limpos, apesar de ter caminhado descalça por trilhas de terra. Quando Rosa perguntou se estava tudo bem, Mariana respondeu que sim, que finalmente tudo havia sido colocado em ordem. acrescentou que estava ansiosa pela visita dos senhores que viriam investigar o local, pois tinha certeza de que encontrariam exatamente o que precisavam encontrar.

O grupo de investigação chegou à fazenda por volta das 9 horas da manhã de 16 de agosto. Dr. Sebastião havia trazido algumas ferramentas básicas de escavação. P. Francisco carregava um pequeno crucifixo e um frasco de água benta. Os dois fazendeiros vizinhos, Coronel Henrique Augusto Mendes e Sr. Joaquim Antônio Rodrigues, vinham motivados mais pela curiosidade do que por qualquer convicção sobre as alegações de Mariana.

Antônio recebeu o grupo com evidente relutância, mas não podia mais se opor à investigação sem parecer suspeito. Helena permaneceu em seus aposentos, alegando indisposição. Isabel havia saído cedo para visitar uma prima na cidade, evitando estar presente durante a investigação.

Mariana cumprimentou os visitantes com uma serenidade que contrastava drasticamente com o estado de agitação em que se encontrava na véspera. Estava vestida adequadamente para uma caminhada pelos trilhos da fazenda e carregava uma pequena cesta, dizendo que aproveitaria a ocasião para colher algumas ervas que cresciam na área.

O grupo caminhou por aproximadamente 20 minutos pelas trilhas que cortavam a propriedade. Mariana guiava o caminho com confiança absoluta, como se tivesse percorrido aquele trajeto centenas de vezes. O parava para apontar detalhes específicos: uma árvore marcada, uma formação rochosa, um desvio quase imperceptível entre a vegetação.

Quando chegaram à clareira, os investigadores ficaram impressionados com o isolamento do local. Apesar de estar dentro dos limites da fazenda, a área parecia completamente selvagem, como se não tivesse recebido interferência humana por décadas. Mariana caminhou diretamente para o centro da clareira e apontou para uma área onde a terra parecia ter sido recentemente revolvida.

Doutor Sebastião examinou o solo e confirmou que havia evidências claras de escavação recente. Peto e Francisco notou que a vegetação ao redor estava pisoteada, sugerindo atividade humana durante a noite anterior. A escavação começou imediatamente. Após cavarem por aproximadamente 40 minutos, o grupo encontrou os primeiros ossos. Eram claramente restos humanos. E Dr.

Sebastião, com sua experiência médica, confirmou que pertenciam a uma criança de aproximadamente 8 a 10 anos de idade. Continuando a escavação, descobriram mais ossos de diferentes tamanhos, indicando que ali estavam enterrados os restos de várias crianças de idades variadas. Dr.

Sebastião contou pelo menos sete conjuntos distintos de ossos, todos de menores. Pe Francisco, visivelmente abalado, começou a rezar em latim. Coronel Henrique e Sr. Joaquim observavam em silêncio, claramente chocados com a descoberta. Mariana permanecia calma, como se a revelação fosse exatamente o que esperava. Foi então que fizeram a descoberta mais perturbadora.

Entre os ossos encontraram pequenos objetos pessoais, um sapato infantil de couro, alguns botões, fragmentos de tecido e uma pequena cruz de madeira com as iniciais acogravadas. Dr. Sebastião reconheceu imediatamente as iniciais. Antônio Queiroz, não o pai atual da família, mas o avô, Joaquim Bernardino Queiroz, cujo nome completo era Joaquim Bernardino Antônio Queiroz.

Quando confrontaram Mariana sobre o significado da cruz, ela explicou calmamente que durante seus cinco dias de ausência em abril, havia conversado longamente com as crianças enterradas naquele local. disse que elas haviam contado detalhes sobre como foram atraídas para a clareira durante os anos em que Joaquim Bernardino estava vivo, sobre os jogos especiais que ele inventava e sobre como nunca mais conseguiram voltar para casa.

Mariana acrescentou que as crianças também haviam revelado que a tradição não havia morrido com Joaquim Bernardino, que Antônio havia continuado as práticas do pai, embora de forma mais cautelosa. Disse que nos últimos 20 anos, pelo menos três crianças filhas de colonos haviam desaparecido da fazenda em circunstâncias similares. Dr. Sebastião perguntou como ela poderia ter obtido informações tão específicas.

Mariana respondeu que durante seus cinco dias de ausência havia permanecido exatamente naquela clareira, sem comer ou beber, apenas ouvindo as histórias que precisavam ser contadas. Petor Francisco, recuperando-se do choque inicial, perguntou diretamente se Antônio estava envolvido nas mortes recentes.

Mariana hesitou por alguns segundos, depois respondeu que essa era uma pergunta que deveria ser feita diretamente a ele. O grupo decidiu retornar imediatamente à casa para confrontar Antônio com as evidências encontradas. Durante o caminho de volta, Mariana permaneceu em silêncio, caminhando alguns passos atrás dos homens.

Quando chegaram a casa, encontraram apenas Rosa Benedita, que informou que Antônio havia saído logo após a partida do grupo. Segundo ela, ele havia selado seu melhor cavalo e partido na direção da cidade, carregando uma mala e alguns papéis. João Batista, questionado sobre o paradeiro do patrão, relatou que havia visto Antônio partir por volta das 10 horas da manhã, mas que ele não havia mencionado seu destino ou quando retornaria.

Doutor Sebastião decidiu que era necessário informar imediatamente as autoridades policiais de Ribeirão Preto sobre a descoberta. Pedro Francisco concordou e se ofereceu para acompanhá-lo até a cidade. Os dois fazendeiros vizinhos preferiram retornar às suas propriedades, mas prometeram fornecer qualquer testemunho que fosse necessário.

Mariana despediu-se do grupo com tranquilidade, agradecendo por terem acreditado em suas palavras e por terem descoberto a verdade. disse que finalmente se sentia em paz, pois havia cumprido a promessa que fizera às crianças enterradas na clareira. Dr. Sebastião e P. e Francisco chegaram a Ribeirão Preto no final da tarde e relataram a descoberta ao delegado de polícia, Dr. Carlos Alberto Sampaio.

Uma investigação oficial foi aberta imediatamente e um mandado de prisão foi expedido contra Antônio Lourenço Queiroz. No entanto, Antônio nunca foi encontrado. As investigações posteriores revelaram que ele havia sacado uma quantia significativa do banco na manhã de 16 de agosto, antes mesmo da descoberta na clareira.

Alguns relatos não confirmados sugeriam que ele havia sido visto embarcando no trem com destino ao Rio de Janeiro, mas sua pista se perdeu completamente. Helena Queiroz foi interrogada extensivamente, mas alegou o desconhecimento completo sobre as atividades do marido. Isabel confirmou a versão da mãe, embora tenha admitido que sempre soubera que algo estava errado na fazenda, sem conseguir especificar exatamente o quê.

As investigações na fazenda Santa Eulia continuaram por várias semanas. Além da clareira original, foram encontrados outros dois locais de sepultamento, contendo os restos de mais cinco crianças. Documentos encontrados no escritório de Antônio confirmaram que pelo menos oito crianças haviam desaparecido da fazenda ao longo dos últimos 20 anos.

Rosa Benedita, João Batista e Maria das Dores forneceram testemunhos detalhados sobre eventos suspeitos que haviam presenciado durante seus anos de trabalho na fazenda. Seus relatos corroboraram muitas das alegações feitas por Mariana durante a festa de aniversário. Em setembro de 1906, a fazenda Santa Eulalia foi confiscada pelo Estado como parte da investigação criminal.

Helena e Isabel se mudaram para Campinas para morar com parentes da família materna. A propriedade permaneceu abandonada e gradualmente foi sendo invadida pela vegetação. Quanto a Mariana, seu destino permaneceu um mistério tão grande quanto suas alegações. Na manhã de 20 de agosto, quatro dias após a investigação na clareira, Rosa Benedita encontrou seu quarto vazio.

Sua cama estava feita, suas roupas organizadas, mas ela havia desaparecido sem deixar qualquer rastro. Desta vez, nenhuma busca foi organizada. Helena, quando informada do desaparecimento da filha, apenas comentou que Mariana havia encontrado finalmente seu verdadeiro lar. Isabel disse que a irmã havia mencionado na véspera que seu trabalho estava concluído e que era hora de juntar-se aos amigos que tanto havia ajudado. Dr.

Sebastião manteve registros médicos detalhados sobre todo o caso. em suas anotações particulares encontradas após sua morte em 1942, ele expressava dúvidas sobre a natureza exata dos conhecimentos demonstrados por Mariana. questionava como ela poderia ter obtido informações tão precisas sobre eventos ocorridos décadas antes de seu nascimento.

Peter Francisco incluiu o caso de Mariana Queiroz em seus arquivos paroquiais como um exemplo de intervenção providencial para revelação da verdade. Embora nunca tenha falado publicamente sobre aspectos que considerava inexplicáveis do comportamento de Mariana, manteve correspondência com outros religiosos sobre casos onde a justiça terrena é alcançada por meios que transcendem a compreensão humana.

O arquivo oficial do caso foi selado em 1935, após uma revisão que considerou que todas as evidências possíveis haviam sido coletadas e que não havia perspectiva de localizar Antônio Queiroz. O documento final da investigação, assinado pelo delegado que sucedeu, Dr. Carlos Alberto Sampaio, concluiu que os crimes investigados foram comprovados, além de qualquer dúvida razoável, mas as circunstâncias que levaram à sua descoberta permanecem parcialmente inexplicáveis.

Em 1962, durante escavações para a construção de uma nova estrada na região, operários encontraram os restos de uma construção antiga enterrada nas proximidades da área onde ficava a fazenda Santa Eulália. Entre os escombros descobriram ossos humanos e diversos objetos pessoais, incluindo roupas e brinquedos infantis.

O arqueólogo responsável pela escavação, Dr. Eduardo Santos Ribeiro, da Universidade de São Paulo, datou os achados como sendo da primeira metade do século XX. Em seu relatório, mencionou que a disposição dos ossos sugeria sepultamento cuidadoso e intencional, não abandono casual.

Entre os objetos encontrados, havia um pequeno diário com caligrafia feminina, escrito em português. As páginas legíveis conham anotações sobre conversas com os pequenos amigos e promessas que precisam ser cumpridas. A última entrada datável era de agosto de 1906. O diário foi arquivado na universidade como parte da documentação arqueológica da região.

Nunca foi publicado ou estudado em detalhes, permanecendo como mais um documento que sugere, sem confirmar definitivamente o destino final de Mariana Queiroz. Até hoje, a região onde ficava a fazenda Santa Eulália é evitada pelos moradores locais. Algumas famílias mais antigas de Ribeirão Preto ainda contam histórias sobre uma jovem que conversava com as crianças que não puderam crescer e que finalmente encontrou paz quando a verdade foi revelada.

Os registros oficiais preservados nos arquivos municipais de Ribeirão Preto documentam apenas os fatos verificáveis: o desaparecimento de múltiplas crianças, a descoberta de seus restos, a fuga do principal suspeito e o desaparecimento subsequente da jovem que havia revelado os crimes.

O que realmente aconteceu com Mariana Queiroz durante aqueles cinco dias em abril, como ela obteve conhecimentos tão específicos sobre eventos do passado e qual foi seu destino final, permanecem questões sem resposta definitiva. O caso está oficialmente encerrado, mas suas circunstâncias continuam a intrigar qualquer um que examine os documentos preservados.

Talvez algumas verdades sejam reveladas por métodos que nossa compreensão racional não consegue explicar completamente. E talvez, às vezes, a justiça encontre formas de se manifestar que transcendem nossas expectativas sobre como o mundo deveria funcionar. O silêncio que hoje reina na região onde ficava a fazenda Santa Eulália não é o silêncio cúmplice que uma vez protegeu os crimes ali cometidos. É um silêncio diferente.

Um silêncio que sugere que algumas histórias, uma vez contadas completamente, finalmente podem descansar em paz. Yeah.

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