Vinícius Júnior: gênio, vilão ou apenas um jovem tentando sobreviver ao próprio talento?

No futebol mundial, poucos jogadores dividem opiniões como Vinícius Júnior. Para muitos, ele é magia pura: dribles, velocidade, improviso, gols decisivos. Para outros, um dos jogadores mais irritantes do planeta — teatral, provocador, emocional demais. Mas quem é, afinal, o verdadeiro Vini? Um herói incompreendido ou o arquiteto dos próprios problemas?
A trajetória dele mostra que a verdade é bem mais complexa.
Um começo marcado pela luta
Nascido em 2000, em São Gonçalo, periferia do Rio, Vinícius cresceu entre duas possibilidades comuns a tantos jovens pobres do Brasil: trabalhar muito ou cair no crime. Ele escolheu a bola. Jogava descalço na rua, esquecia o jantar, levava bronca dos pais — mas sua habilidade era tão evidente que cedo chamou a atenção.
Na escolinha do Flamengo e depois no futsal, refinou sua técnica. Com dez anos, entrou na base rubro-negra, enfrentando viagens diárias de até duas horas para treinar. Aos poucos, virou destaque. O grande salto veio com a Copa Sul-Americana Sub-17: artilheiro, campeão e protagonista. Europa inteira observava.
Apenas adolescente, foi vendido ao Real Madrid por 45 milhões de euros. Um valor que carregava peso. E expectativas.
As primeiras quedas — e a maturação
O início no profissional não foi simples. Na estreia pelo Flamengo, tentava dribles demais, tomava decisões equivocadas. A imprensa brasileira zombava, chamando-o de “Negueba 2.0”. Porém, Vini respondeu com gols, personalidade e uma confiança que poucos jovens têm.
A chegada à Espanha foi ainda mais dura: velocidade do jogo, marcação intensa e, logo depois, a primeira lesão séria — o rompimento de ligamento no joelho. Em choque, o garoto entendeu que, se quisesse sobreviver no futebol europeu, teria de mudar. Começou a trabalhar o corpo, a mente e sua tomada de decisão.
E funcionou. Aos poucos, tornou-se um monstro físico, praticamente imune a lesões, e decisivo em jogos grandes.
O auge? A final da Champions de 2022, quando marcou o gol do título sobre o Liverpool. Em 2024, tornou-se o jogador mais jovem a marcar em duas finais diferentes da competição. Um gigante.

Mas o outro lado da moeda nunca desapareceu
Para cada golaço, um teatro. Para cada jogada genial, uma provocação. Para cada momento mágico, um escândalo. Vinícius se tornou um personagem imprevisível — capaz de incendiar um estádio tanto pelo talento quanto pelo temperamento.
A relação com o técnico Xabi Alonso, por exemplo, simboliza bem isso. O novo Real Madrid exige disciplina, obediência tática, rotatividade. Vini, um jogador emocional, acostumado com liberdade, não aceita bem ser substituído. No Clássico contra o Barcelona, explodiu: “Sempre eu! Eu vou embora!”, gritou ao sair de campo. Voltou, pediu desculpas — mas não ao treinador.
Claramente, algo ali não se encaixa. Ele precisa de confiança, de afeto, de um treinador que o entenda. Solari conseguiu. Ancelotti, ainda mais. Mas Alonso cobra frieza — e Vinícius ainda não aprendeu a entregar.
O peso insuportável do racismo
Se os problemas esportivos já seriam difíceis, a realidade fora do campo é brutal. Vinícius virou alvo do que há de pior nos estádios espanhóis: insultos racistas repetidos, ataques vergonhosos e até uma boneca com sua camisa pendurada numa ponte, simulando um enforcamento.
Em Valência, 2023, o episódio foi ainda mais cruel: chamado de “macaco”, reagiu, foi expulso e tratado como culpado — até a punição ser anulada.
Exausto, desabafou:
“O racismo é normal na La Liga.”
Palavras duras, mas compreensíveis. A estrutura espanhola sempre tratou racismo com burocracia, lentidão e um certo fingimento institucional. Embora avanços recentes tenham ocorrido, o problema persiste — e Vinícius é o principal alvo.
Muitos tentam justificar: “Ele provoca”, “Ele irrita”, “Ele simula”. Mas nada, absolutamente nada, justifica racismo. Uma sociedade civilizada sabe separar comportamento esportivo de crime de ódio.
Mas é impossível negar: Vinícius também cria os próprios inimigos
O problema é que seu temperamento alimenta a narrativa dos críticos.
— As simulações exageradas.
— As provocações infantis.
— O tempo desperdiçado em discussões.
— O ego ferido quando é substituído.
— As ofensas aos adversários em campo.
Vini joga como um craque, mas reage como um garoto que não aceita frustração. E isso custa caro. Inclusive o Ballon d’Or 2024 — onde desempenho, títulos e comportamento contam. Real Madrid boicotou a cerimônia após ele perder o prêmio. A pior resposta possível.
O futuro: herói ou vilão? O protagonismo é dele
Vinícius Júnior tem potencial para ser o melhor do mundo.
Tem carisma, história, drible, gols decisivos, força física e mental para aguentar pressões gigantescas.
Mas também tem um temperamento que o impede de voar mais alto.
Para conquistar tudo o que pode, precisa:
controlar emoções;
entender que o coletivo vem antes do ego;
aceitar críticas sem explosões;
parar com a teatralidade;
focar no jogo e não no caos ao redor.
Se conseguir, ninguém segura.
Se não, continuará preso entre genialidade e autossabotagem — amado por uns, odiado por outros.
Vinícius é um craque. Mas é também um ser humano tentando amadurecer diante do mundo inteiro. E talvez isso explique por que ele provoca tanta paixão — positiva e negativa.