A primeira vez que conheci Daniel foi em uma cafeteria nos arredores de Brighton Hill. Ele tentava equilibrar uma ligação, um saco de confeitar e uma carteira teimosa quando deixou cair todos os cartões de crédito no chão. Ajoelhei para ajudá-lo.
— Obrigado — disse, tímido. — Juro que não sou sempre tão desastrado.
Sorri. — Todo mundo tem dias assim.
Assim começou tudo. Daniel era firme, atencioso, gentil. Lembrava que eu gostava de canela no café, mandava mensagens perguntando se cheguei bem e nunca me fez sentir que precisava “ganhar” o afeto dele.
Depois de tantos homens emocionalmente inacessíveis, Daniel parecia um lar.
— Tenho um filho — disse no nosso terceiro encontro. — Evan. Treze anos. A mãe dele nos deixou quando ele tinha oito. Estamos só nós dois.
— Adoraria conhecê-lo — respondi. Seus olhos se iluminaram.
Conhecer Evan foi… difícil. Educado, mas frio. Respondeu “senhora” como se eu fosse uma professora. Quando tentei me aproximar, ele foi direto:
— Você não é minha mãe.
— Eu sei — disse suavemente. — E não estou tentando ser.
Mesmo assim, continuei tentando. E Daniel sempre dizia:
— Ele vai amolecer. Só precisa de tempo.
Nos noivamos numa tarde chuvosa. Evan apenas murmurou “parabéns”. Achei que era um começo. Estava errada.
No dia do casamento, tudo parecia um sonho. Exceto pelo meu nervosismo. Quando bateram na porta da suíte nupcial, achei que fosse minha dama de honra. Era Evan. Terno apertado, expressão tensa.
— Podemos conversar? Em particular?
Saímos para o jardim. Lá, ele me encarou.
— Não se case com meu pai.
Congelada, perguntei por quê. Ele me entregou um envelope com as mãos trêmulas.
Dentro: avisos de dívida, ações judiciais e e-mails entre Daniel e um tal de Greg.
“Ela não tem família, tem casa própria e poupança. Case-se, espere dois anos, alegue sofrimento emocional e leve metade. Fácil.”
“Ela está caindo direitinho. Estou atolado em dívidas. Isso vai me salvar.”
Minhas mãos tremiam.
— Quanto tempo você sabe disso?
— Ouvi ele no telefone com o tio Greg semanas atrás. Roubei o celular dele. Copiei tudo.
— Evan…
Ele abaixou a cabeça. — Tentei ser frio pra ver se você desistia. Mas agora… precisava te contar.
Chorei.
— Você me protegeu.
Chamei meu amigo Michael, que me acompanharia até o altar.
— Preciso de um contrato pré-nupcial imediato. Rigoroso.
Ele o redigiu e levou até Daniel.
Minutos depois, Daniel invadiu a suíte, furioso.
— O que é isso? Contrato agora?
— Assine.
— Nunca! Isso é um insulto!
— Então não há casamento.
— Eu te amo, Cora.
— Você ama minha conta bancária.
— Isso é loucura!
— Eu sei de tudo, Daniel. Os e-mails. As dívidas. O plano.
Ele ficou pálido.
— Isso é um mal-entendido!
— Evan confirmou.
— Pequeno traidor!
— Nem ouse — disse, me colocando entre os dois. — Ele fez a coisa certa.
Daniel amassou o contrato e saiu.
— Estamos terminados — disse.
Caminhei até o altar vazio.
— O casamento está cancelado. Obrigada por virem.
— Saí com Evan ao meu lado. O sol parecia mais quente do que em toda a manhã.
— Você está bem? — ele perguntou.
— Estarei. Graças a você.
— Você me odeia?
— Nunca. Você me salvou, Evan.
Três meses depois, recebi uma carta. Evan morava com a tia, estava feliz. Daniel declarou falência e era investigado por fraude.
“Às vezes penso em você”, escreveu Evan. “Espero que esteja feliz. E segura.”
Guardei a carta numa caixinha junto com o contrato e o programa da cerimônia cancelada.
Num mundo cheio de Daniels, ainda existem Evans.
Alguns heróis não usam capa — usam ternos emprestados e carregam verdades pesadas demais para a própria idade.
E, se tivermos sorte, podem salvar nossa vida.