VEXAME AO VIVO: O RELATOR DO PROJETO DE LIVRA BOLSONARO NÃO AGUENTOU A PRESSÃO E FUGIU DA ENTREVISTA

Relator da proposta que altera a dosimetria de condenações, incluindo as do 8 de janeiro, abandona debate ao vivo sob intenso questionamento. Entenda a polêmica que opõe pacificação do país e o risco de sensação de impunidade.

A política brasileira foi palco de mais um episódio de alta voltagem que ilustra a profunda polarização que o país enfrenta. Em uma entrevista que se tornou viral, o Deputado Paulinho, relator de um polêmico projeto de lei que propõe uma readequação na dosimetria de penas, viu-se sob o fogo cruzado de questionamentos incisivos de jornalistas, culminando em sua retirada abrupta do debate, sob a justificativa de compromissos inadiáveis. O projeto em questão, aprovado na Câmara dos Deputados em um movimento de surpresa e alta tensão, tem o potencial de alterar significativamente a situação legal de condenados por crimes contra o Estado Democrático de Direito, notoriamente os envolvidos nos atos de 8 de janeiro, incluindo o ex-Presidente Jair Bolsonaro.

A essência da controvérsia reside na alegação de que a nova proposta transforma penas longas em períodos muito mais curtos de detenção, gerando um debate acalorado sobre a justiça e a prioridade legislativa no país. O episódio da entrevista não apenas colocou em xeque a sustentação do projeto, mas também expôs a fragilidade do argumento da “pacificação” quando confrontado com a exigência de coerência jurídica e moral.

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A Tese da Dosimetria e a Matemática da Redução

O Deputado Paulinho, que se autodeclara um metalúrgico que se viu na posição de especialista em Código Penal, iniciou a entrevista defendendo a legalidade e a lógica por trás da readequação. O ponto nevrálgico é a forma como a pena é calculada para condenados por múltiplos crimes, como “golpe de estado” e “abolição violenta do Estado democrático de direito”.

Aos questionamentos sobre a redução drástica – que, em números apresentados pelos entrevistadores, transformaria uma pena de 27 anos e 3 meses em apenas 2 anos e 4 meses em regime fechado –, o deputado insistiu que a conta não era simples e merecia ser feita “direito”. Ele detalhou o intrincado cálculo: o condenado não cumpre a totalidade da pena máxima estabelecida inicialmente. A legislação atual, segundo a interpretação do projeto, permitiria a aplicação de um quarto da pena total. No caso que ele citou, o montante a ser cumprido seria, originalmente, de 6 anos e 10 meses.

O cerne da manobra legal, de acordo com o relator, é a unificação das duas penas (golpe de estado e abolição violenta) por serem, em sua visão, a “mesma coisa”, aplicando-se a maior delas. Com essa unificação e a subsequente aplicação de redutores e a remissão por tempo cumprido, o cálculo final chegaria à marca de 2 anos e 4 meses.

Essa explanação técnica, no entanto, não aplacou o ceticismo dos jornalistas, que prontamente questionaram a chancela do Supremo Tribunal Federal (STF) para tal interpretação. O deputado foi cauteloso, admitindo que não poderia afirmar um “ok” do Supremo, mas mantendo a validade de sua fórmula legal. A desconfiança pairava sobre se o projeto realmente se limitava a uma questão técnica de dosimetria ou se representava uma manobra política específica para beneficiar figuras de alto escalão.

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A Pacificação versus a Anistia e a Polarização

Um dos argumentos mais fortes e repetidos pelo Deputado Paulinho para justificar a urgência e a pertinência do projeto foi a necessidade de “pacificar o país”. Segundo ele, a proposta visa virar a página da intensa polarização que o Brasil vive, focada na discussão binária de “se deixa preso ou se solta”. Ele manifestou a esperança de que o projeto não seja alterado no Senado e que o próprio Presidente Lula o sancione para permitir que o país se concentre em temas mais produtivos, saindo do ciclo vicioso de debates que, em sua visão, paralisam a nação.

Entretanto, a noção de pacificação foi imediatamente confrontada. Ao citar uma declaração de um colega político de que a aprovação do projeto seria uma “batalha, mas não a guerra” – sendo a guerra a anistia total –, o deputado foi levado a diferenciar os termos. Ele defendeu que a proposta efetivamente resultaria em uma ampla libertação: “todas as pessoas que foram presas soltas, todas as pessoas que estão com tornozeleiras vão tirar tornozeleira” e a pena dos mandantes seria “reduzida drasticamente”. Para ele, isso é o que pavimenta o caminho para a pacificação.

O relator, contudo, fez questão de ressaltar o que ele percebe como uma resistência do Governo à pacificação, citando a longa noite de votação na Câmara, que se estendeu até as 4h da manhã, e as críticas de que o projeto “beneficia criminosos”. Ele rebateu veementemente essa acusação, assegurando que o texto foi avaliado pelos principais juristas do país e que tal alegação é “impossível”. A insistência dos opositores em prolongar o debate e taxar a medida como absurda reforça, para o relator, a ideia de que o interesse em manter a polarização é real e ativo no Congresso.

A Questão da Prioridade e a Mensagem à Sociedade

Talvez o ponto mais espinhoso levantado pelos entrevistadores tenha sido a questão da prioridade legislativa. Em um país assolado por desafios urgentes em segurança pública, saúde – descrita como “um caos” – e emprego, a dedicação do Congresso à redução de pena para condenados por crimes de natureza política foi colocada sob intenso escrutínio.

“Você acha que é normal a gente ir para uma eleição presidencial do ano que vem… e a gente discutindo se deixam preso ou se solta?”, questionou o relator, reiterando que era prioridade da Casa “tirar isso da frente” para que o Brasil pudesse discutir seus reais problemas. A premissa subjacente é que, enquanto o tema da prisão ou soltura dos envolvidos no 8 de janeiro dominar o noticiário, os temas verdadeiramente relevantes para o cotidiano do cidadão – como a melhoria da saúde pública ou a geração de empregos de qualidade – ficam em segundo plano.

A argumentação, porém, não convenceu totalmente os jornalistas, que insistiram na mensagem que tal atitude passaria à sociedade. Um dos entrevistadores, citando a situação de segurança pública em São Paulo e Rio de Janeiro, confrontou: “Aí a gente tá as voltas com redução de pena para condenado de golpe de estado no Supremo.” Qual seria a mensagem transmitida? O deputado voltou à tese da polarização: “O que atrapalha o país é a polarização. Nós temos que sair dessa polarização.” A sociedade, no entanto, pode interpretar a pressa em resolver a questão de condenados políticos como um privilégio concedido à classe política em detrimento das necessidades básicas da população.

O Contrassendo e a Moralidade da Lei

A discussão rapidamente se aprofundou na moralidade e no contrassenso da legislação. Foi lembrado que o Congresso Nacional tem, nos últimos meses, endurecido as penas para diversos crimes comuns. O projeto, portanto, surge como um movimento em direção oposta, o que levanta a suspeita de um duplo padrão na aplicação da justiça.

“Queria saber do senhor se isso não é um contrassenso e se não é perigoso em um país como o Brasil, em que a gente não conseguiu resolver a ditadura militar, não fica parecendo que o golpe de estado pode ser fácil assim, pode compensar,” indagou uma jornalista.

O deputado minimizou o risco, alegando que a redução é “muito pequena” para ser o problema e que, após verem as consequências para os presos, futuros golpistas pensarão “10 vezes” antes de se “rebentar,” como ele colocou.

No entanto, a argumentação de que o projeto não beneficiava “nenhum criminoso” foi desafiada por sua própria fala, que momentos depois reconheceu que os atos contra o Estado Democrático de Direito “são crime” e que a redução faria as pessoas pensarem duas vezes. O jornalista Artur da Piev sintetizou o dilema: o projeto pode ser legal, mas seria moralmente justificável que alguém que tenta um golpe de estado receba uma pena menor do que quem comete um furto, por exemplo?

O relator tentou desvincular-se da comparação, notando que a legislação sobre os crimes contra o Estado Democrático de Direito é relativamente nova, tendo sido incluída em 2021, no governo Bolsonaro. Ele então recorreu a outros exemplos de desproporcionalidade nas penas brasileiras para justificar a necessidade de ajustes amplos: “Você acha que é justo alguém pintar a estátua com batom e pegar 14 anos? Eu não acho.” Ele citou também o caso de um ex-ministro, que sequer estava no Brasil e foi condenado a 24 anos. A intenção era demonstrar que o sistema penal brasileiro é repleto de injustiças, e que o projeto seria uma tentativa de correção mais ampla.

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O Dilema da Lei Integral: Líderes versus Multidão

Um dos argumentos mais fortes contra a proposta de Paulinho era a forma como ela trata líderes e os demais participantes, a chamada “multidão”. Se a intenção era proteger os mais vulneráveis – os “velhinhos que picharam estátua,” como foram referidos – por que a solução não foi aumentar a pena para os líderes e diminuir para a multidão? A expectativa social é que um ex-presidente ou um general que “fique querendo dar golpe” recebam a maior gravidade possível, diferenciando-os claramente dos que agiram sob influência.

O deputado defendeu-se alegando que não poderia criar uma lei que fizesse distinção entre as pessoas. “Eu não poderia fazer uma lei que diferencia as pessoas. Eu fiz ela integral,” explicou. Ele confirmou que o projeto contemplava a figura do “crime de multidão” especificamente para “beneficiar as pessoas que apenas participaram (…) da depredação, ou talvez nem participaram.”

O questionamento final e mais contundente foi: “E por que que não ficou só no crime de multidão? Subiu pros mandantes para beneficiar Bolsonaro. Exatamente.”

A resposta do relator foi a de que “eu não poderia fazer uma lei para um, uma lei para outro. Fiz uma lei só.” Essa defesa da “integralidade” da lei, no entanto, soa oca para os críticos, que veem nela a única forma legal de estender o benefício da redução para os líderes sem criar uma legislação ad personam (feita para uma pessoa).

A Retirada Repentina e o Futuro do Projeto

O ápice da tensão na entrevista foi atingido logo após essa troca de argumentos. Questionado novamente sobre o ponto crucial, o deputado pediu desculpas e anunciou o fim de sua participação, alegando ter uma reunião. A saída abrupta, sob a justificativa de “agenda,” selou a entrevista em um momento de clímax, deixando a sensação de que a pressão dos questionamentos havia se tornado insustentável.

O projeto segue agora para o Senado Federal, onde o debate promete ser igualmente intenso. A proposta levanta questões fundamentais sobre o sistema de justiça brasileiro, a dosimetria de penas, a real prioridade do Congresso Nacional e, acima de tudo, a forma como o país pretende lidar com o legado e as cicatrizes dos ataques à sua democracia. A pacificação é um anseio nacional, mas se o preço a ser pago é a percepção de impunidade para crimes graves, a polarização pode apenas mudar de foco, persistindo no tecido social. A sociedade brasileira, mais uma vez, se vê no centro de um furacão político-jurídico que definirá os contornos de sua estabilidade futura. A forma como o Senado e, posteriormente, a Presidência da República lidarão com essa lei controversa será um termômetro da capacidade do Brasil de equilibrar a estabilidade política com a exigência de justiça plena.

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