O Bebê Escravo Dado Como Morto que Chorou no Caixão… Um Mistério Profano, 1888

Imagine um bebê que nasce morto e horas depois chora dentro do próprio caixão. Brasil, 1888. A escravidão acabou no papel, mas nas fazendas do interior de Minas sombras do passado ainda assombram. Benedita, jovem ex-escrava, vive o pior pesadelo de uma mãe, perder um filho antes mesmo dele respirar. Mas quando o choro ecoa da madeira do caixão durante o velório, tudo muda.
Milagre, maldição ou algo muito mais sinistro ligado aos horrores enterrados naquela terra? Antes de começar essa jornada arrepiante, se inscreva no canal, ative o sininho para não perder nenhum capítulo e me conta nos comentários de onde você está assistindo. Vamos descobrir juntos esse mistério que vai mexer com suas convicções.
A chuva caía pesada sobre o telhado da antiga Benedita gritava. A chuva caía pesada sobre o telhado da antiga Senzala. Benedita gritava como se o mundo fosse acabar. As mãos dela apertavam o tecido velho que servia de lençol, os nós dos dedos brancos de tanta força. “Força, menina, força que tá quase”, murmurou tia Joana, as mãos experientes e calejadas, guiando o parto na penumbra úmida daquele lugar esquecido por Deus.


O cheiro de ervas medicinais, misturado com suor e sangue tomava conta do ambiente. Velas de sebo tremulavam no vento que entrava pelas frestas das tábuas mal encaixadas, criando sombras dançantes nas paredes descascadas e manchadas pela humidade dos anos. “Tá vindo, tá vindo!”, gritou a parteira, sentindo a cabeça do bebê coroar entre suas mãos trêmulas.
Benedita apertou os punhos com tanta força que as unhas se cam nas palmas. Suor escorria pelo rosto jovem, misturando-se com lágrimas de dor e esperança. A dor cortava como navalha enferrujada, rasgando por dentro, fazendo-a ver estrelas na escuridão. “Ai, meu Deus! Ai, meu Deus do céu!”, ela gritava, jogando a cabeça para trás.
Tia Joana trabalhava em silêncio, concentrada, 60 anos fazendo partos, mas sempre com aquele frio na barriga. Nunca se sabia o que podia dar errado, principalmente ali naquela fazenda amaldiçoada. Mais uma força benedita. Só mais uma. A jovem reuniu todas as forças que ainda tinha no corpo magro e cansado. Gritou como nunca tinha gritado na vida.
Um grito que ecoou pela senzala abandonada, atravessou os campos molhados pela chuva e se perdeu na escuridão da noite. E então, silêncio, um silêncio pesado, assustador. Tia Joana segurou o bebê nas mãos, pequeno, roxo, completamente imóvel. Não chorava, não se mexia, não respirava. “Ai, meu Deus!”, sussurrou a parteira, balançando a cabeça devagar.
O coração apertando no peito. Benedita olhou com os olhos arregalados, ainda ofegante. Ele tá bem? Tá bem? Por que não tá chorando? Tia Joana baixou o olhar, não conseguindo encarar os olhos esperançosos da jovem mãe. Não precisava falar nada. O silêncio já dizia tudo. Não. Benedita tentou se levantar, mas as pernas não obedeciam. Não pode ser.
Não pode ser. Sinto muito, filha, sinto muito mesmo. O menino, o menino não resistiu. O choro da mãe ecoou pela cenzala abandonada como um lamento de alma penada. Chuva lá fora, lágrimas lá dentro, como se o céu e a terra chorassem juntos por aquela vida que não chegou a viver. Tia Joana envolveu o pequeno corpo em panos brancos que tinha trazido de casa.
Mãos trêmulas, coração pesado como pedra. Cada gesto era uma oração silenciosa, um pedido de perdão por não ter conseguido salvar mais uma vida. “Vou preparar ele direitinho”, disse baixinho, a voz embargada. Conforme o costume, conforme manda a tradição. Benedita soluçava sem parar.
Meu bebê, meu bebê, por que Deus fez isso comigo? A parte acendeu mais velas ao redor do corpinho. O ritual começava. Era assim desde os tempos antigos, quando uma criança nascia morta, tinha que ser preparada com carinho, com respeito, para que a alminha encontrasse o caminho da luz. Lavou o corpinho com água morna, perfumada com ervas do campo, arruda, guiné, alecrim. Cada gesto era feito com amor, como se fosse seu próprio neto.
Cantar olava baixinho uma cantiga antiga que sua avó tinha ensinado. Vai em paz, anjinho. Vai em paz, que sua mãe te ama. Colocou o bebê numa caixinha de madeira simples que João, o carpinteiro, tinha feito durante a tarde. Madeira clara, bem lisa, sem farpas, flores do campo ao redor da cabecinha, sempre vivas, margaridas, rosas silvestres.
“Amanhã fazemos o velório”, disse para Benedita, que continuava chorando baixinho. “A comunidade toda vai vir, ninguém vai deixar você sozinha”. A mãe não conseguia parar de chorar. Por que, tia Joana? Por que Deus fez isso comigo? Eu não sou uma boa pessoa. A velha parteira se aproximou, sentou na beira da cama improvisada e abraçou a jovem. Não fala assim, filha.
Você é uma menina de ouro. Deus sabe o que faz. Os caminhos do Senhor são misteriosos. Mas no fundo do peito, uma inquietação crescia, uma sensação estranha que ela não conseguia explicar. Havia algo diferente naquele parto, algo que a incomodava profundamente as marcas no corpinho do bebê, pequenas, quase imperceptíveis, mas estavam lá.
Marcas escuras que pareciam queimaduras antigas, formando um padrão estranho na pele rosada. balançou a cabeça, tentando afastar os pensamentos ruins. “Deve ser impressão minha, deve ser o cansaço.” Fechou a tampa do caixão devagar, com cuidado. O som da madeira batendo ecoou pela cenzala como um tambor fúnebre. Final definitivo. Benedita se arrastou até a caixa e a abraçou com força.
Meu menino, meu menino querido, mamãe te ama tanto. Lá fora, a chuva continuava caindo, grossa, pesada, como se o céu também chorasse por aquela tragédia. Os pingos batiam no telhado de zinco numa música triste e monótona. Tia Joana olhou pela janela sem vidro. Nuvens cobriam a lua e as estrelas.
A noite estava fechada, sem um pingo de luz. “Amanhã vai ser um dia”, pensou, suspirando fundo. Não fazia ideia de quão difícil seria. Na fazenda São Benedito, os mortos nem sempre descansavam em paz. Havia histórias antigas sussurradas pelos mais velhos, histórias de almas penadas que vagavam pelos campos, histórias de crianças que nasciam marcadas pelo destino.
O vento balançou as árvores lá fora, um gemido baixo, como lamento de alma perdida. As folhas dançavam numa música fantasmagórica. Benedita adormeceu, abraçada ao caixão, exausta de tanto chorar. O rosto jovem estava inchado, marcado pela dor. Mesmo dormindo, lágrimas escorriam pelos cantos dos olhos.
Tia Joana ficou de vigília, rezando baixinho. Ave Marias, Pai Nossos, orações que sua avó tinha ensinado. Proteção para a mãe, descanso para o bebê. Mas durante a madrugada, quando o silêncio era total, jurou ter ouvido algo, um barulho quase imperceptível vindo da madeira do caixão, como se algo se mexesse lá dentro.
parou de rezar, prestou atenção, coração disparado, silêncio, balançou a cabeça. Imaginação de velha deve ser o vento. Mas o coração continuou disparado mesmo assim, porque na fazenda São Benedito coisas estranhas aconteciam, principalmente quando chovia, principalmente na cenzala abandonada. Havia histórias sobre aquele lugar. Histórias que os mais velhos contavam em sussurros.
sobre o tempo da escravidão, sobre coisas terríveis que tinham acontecido ali, sobre crianças que nasciam diferentes, marcadas. Tia Joana olhou para o caixão. Benedita dormia abraçada a ele, como se protegesse o filho mesmo depois da morte. “Protege essa criança, senhor”, murmurou.
E protege a mãe também, porque tinha a sensação de que iam precisar de muita proteção. Na fazenda São Benedito, nem tudo que parecia morto estava realmente morto. E alguns segredos eram pesados demais para ficarem enterrados para sempre. O vento soprou mais forte, as velas tremularam. Por um momento, as sombras pareceram se mover sozinhas.
E lá no fundo da cenzala, quase imperceptível, um barulho, como se algo arranhasse a madeira de dentro para fora. O sol nasceu tímido entre as nuvens carregadas, lutando para furar a cortina cinzenta que cobria a fazenda São Benedito.
A notícia se espalhou rápido pelos Cazebres e pela casa grande, de boca em boca, como sempre acontecia naqueles tempos. O bebê da Benedita não resistiu. Coitada da menina tão nova e já passando por isso. Vai ter velório hoje na cenzala velha. Deus sabe o que faz, mas às vezes a gente não entende. As mulheres da comunidade se movimentaram como formigas trabalhadeiras.
Dona Maria, a mais velha de todas, começou a preparar comida para o velório. Canja de galinha, pão caseiro, café forte. Era tradição alimentar quem vinha prestar as condolências. “Não pode deixar ninguém com fome num momento desses”, dizia, mexendo a panela grande no fogão à lenha. Os homens arrumaram bancos de madeira, cadeiras emprestadas, tudo que pudesse servir para acomodar as pessoas.
João, o carpinteiro, verificou se o caixãozinho estava bem feito, se não tinha nenhuma farpa que pudesse machucar. “Tá perfeito,”, murmurou. passando a mão na madeira lisa. Que Deus receba essa criança. Benedita acordou com os olhos inchados de tanto chorar. O corpo doía todo, como se tivesse apanhado a dor do parto misturada com a dor da alma. Uma dor que ela nunca imaginou que existisse.
“Força, filha”, disse dona Maria, abraçando-a com carinho. Deus sabe o que faz. Às vezes a gente não entende, mas ele sabe. Não entendo porquê, murmurou Benedita, a voz rouca de tanto chorar. Por que, meu filho? O que eu fiz de errado? Não fez nada de errado, menina. Essas coisas acontecem, faz parte da vida. Mas Benedita não conseguia aceitar.
Como podia fazer parte da vida, perder um filho antes mesmo dele viver? Como podia ser vontade de Deus uma coisa tão cruel? Tia Joana organizava tudo com a experiência de quem já tinha visto muita coisa na vida. Flores frescas colhidas no campo, velas novas compradas na venda, orações preparadas no coração.
O caixãozinho ficou no centro da senzala, em cima de uma mesa coberta com lençol branco, pequeno, singelo, comovente, flores ao redor, velas acesas, um crucifixo de madeira na cabeceira. Era um menino lindo”, comentou uma vizinha fazendo o sinal da cruz. “Igualzinho à mãe”, disse outra. “Os mesmos olhos, o mesmo nariz. “Pelo menos não sofreu”, murmurou uma terceira. “oi direto para o céu.
As pessoas chegavam devagar, em grupos pequenos, sussurros respeitosos, olhares compassivos, abraços silenciosos. A comunidade se unia na dor, como sempre fazia. Ninguém ficava sozinho na hora da tristeza. Padre Antônio apareceu no meio da tarde, montado no cavalo Baio que usava para visitar as fazendas da região.
Jovem recém-chegado de Ouro Preto, ainda se acostumando com a vida no interior. Meus sentimentos disse para Benedita, tirando o chapéu. Vim abençoar a criança e rezar com vocês. Obrigada, padre. O Senhor é muito bondoso em vir até aqui. Ele se aproximou do caixão com respeito, fez o sinal da cruz devagar, fechou os olhos e começou a oração. Senhor, recebei esta alma inocente em vossa casa.
Dai conforto à mãe que chora e paz ao coração que sofre. As pessoas acompanhavam em silêncio, algumas de joelhos, outras de pé. Algumas choravam baixinho, limpando os olhos com lenços de pano. A tarde caía devagar quando aconteceu a coisa mais estranha que qualquer um deles já tinha visto na vida. Benedita estava ao lado do caixão, segurando um terço de madeira que tinha ganhado da avó.
Os dedos deslizavam pelas contas gastas pelo tempo, sussurrando Ave Marias. Meu anjinho! murmurava baixinho. Mamãe te ama tanto. Mamãe sempre vai te amar. Foi então que todos ouviram um som baixo, quase imperceptível, como um gemido abafado vindo de dentro da madeira. Benedita parou de falar no meio da oração. Olhou ao redor, o coração disparando.
Vocês ouviram isso? Ouviram o quê? Perguntou dona Maria franzindo a testa. Silêncio pesado, todos prestando atenção, ouvidos atentos. O vento parou de soprar, até os pássaros se calaram. E então veio de novo, mais claro dessa vez, inconfundível, um choro fraco, mas era um choro, um choro de bebê vindo do interior do caixão. “Meu Deus do céu!”, gritou uma mulher levando a mão ao peito.
“Não pode ser”, disse outra, recuando alguns passos. “Isso não é possível”, murmurou um homem, fazendo o sinal da cruz. Benedita ficou branca que nem cal, os olhos arregalados, a boca aberta, sem conseguir falar. Depois, como se acordasse de um sonho, gritou: “Meu filho, meu filho tá vivo!” correu para o caixão com as pernas ainda fracas do parto, mãos trêmulas na tampa de madeira, tentando abrir, mas sem conseguir por causa do nervosismo.
“Abre! Abre logo!”, gritava desesperada. “Meu bebê tá vivo. Eu sabia. Eu sabia que ele não tinha morrido. Tia Joana chegou correndo, o rosto pálido de susto. Calma, filha, calma. Deixa eu ver. Mas o choro continuava cada vez mais forte. Mais claro, um choro de bebê com fome, com frio, com medo. Padre Antônio se aproximou, o rosto branco como papel.
Isso, isso não é possível. Eu mesmo vi a criança, não respirava. Abre essa tampa! Benedita gritava batendo na madeira. Meu bebê tá vivo, tá pedindo socorro. Os homens se juntaram ao redor do caixão, mãos nervosas na madeira, dedos trêmulos nos pregos. O coração de todos batia descompassado.
João pegou um martelo e começou a tirar os pregos. Cada batida ecoava pela cenzala como um tiro. O choro do bebê ficava mais forte a cada prego que saía. A tampa se abriu e lá estava ele, o bebê, mexendo os bracinhos pequenos, chorando com força, vivo, completamente vivo. “Milagre!”, gritou alguém no fundo da cenzala.
“Ressurreição”, disse outro caindo de joelhos. Deus é grande”, exclamou uma mulher chorando de emoção. Benedita pegou o filho no colo com cuidado, como se ele fosse quebrar, lágrimas de alegria escorrendo pelo rosto, misturando-se com lágrimas de alívio. “Meu menino, meu menino querido, mamãe tá aqui. Mamãe tá aqui.
” O bebê parou de chorar assim que sentiu o calor da mãe. Abriu os olhinhos pequenos e olhou para ela, um olhar profundo, como se reconhecesse. Mas foi então que tia Joana viu algo que fez seu sangue gelar, as marcas no corpinho, que antes eram quase imperceptíveis, agora estavam mais visíveis, mais escuras, mais definidas.
Pequenos sinais escuros espalhados pelo peito e pelas costas, como queimaduras antigas, mas formando um padrão estranho, quase como símbolos. Benedita chamou baixinho, tentando não alarmar ninguém. Me deixa ver ele um pouquinho. A mãe relutou, apertando o bebê contra o peito. Por quê? Ele tá bem, tá vivo? Só quero ver se tá tudo certo.
Deixa a tia Joana dar uma olhadinha. Benedita entregou o filho com cuidado. Tia Joana examinou as marcas de perto, o coração disparando. Conhecia aqueles símbolos dos tempos antigos, dos rituais proibidos que sua avó tinha contado em sussurros. “O que foi, tia Joana?”, perguntou Benedita, notando a expressão preocupada.
A parte olhou ao redor, todos esperando uma resposta. Não podia falar a verdade. Não ali na frente de todo mundo. Nada, filha. Só só umas marquinhas de nascença. Normal. Mas por dentro o terror crescia como uma planta venenosa, porque aquelas marcas não eram de nascença, eram de algo muito mais antigo e muito mais perigoso.
Padre Antônio se aproximou ainda em choque. “Posso ver a criança?” Tia Joana hesitou, mas entregou o bebê. O padre olhou o rostinho, depois examinou o corpinho, viu as marcas, franziu a testa. tinha estudado sobre sinais estranhos no seminário, sinais que não deveriam existir. “Estranho”, murmurou baixinho.


“Muito estranho. O que é estranho, padre?”, perguntou Benedita, o coração apertando. Ele devolveu o bebê rapidamente. Nada. Só vou rezar pela criança. Vou pedir proteção. Mas no fundo, uma inquietação crescia. Em anos de seminário, tinha estudado sobre manifestações sobrenaturais, sinais que falavam de coisas proibidas, coisas que a igreja preferia esquecer. A festa continuou, mas agora era de alegria.
Onde antes havia tristeza, agora havia celebração. As pessoas riam, choravam de emoção, agradeciam a Deus pelo milagre. É um milagre, repetiam uns aos outros. Deus é grande”, diziam levantando as mãos para o céu. “A criança voltou dos mortos, mas três pessoas não festejavam completamente. Tia Joana, que conhecia os símbolos antigos e sabia o que eles significavam.
Padre Antônio, que estudara os sinais proibidos e sentia que algo não estava certo. E lá no fundo da censala, encostado na parede, uma figura observava tudo. Coronel Benedito, antigo dono da fazenda, agora um homem velho e amargurado. Ele tinha visto as marcas também e sabia exatamente o que significavam, porque ele mesmo as tinha feito anos atrás em rituais que ninguém deveria lembrar. Rituais que ele pensava terem sido esquecidos para sempre.
Mas alguns segredos não morrem. Alguns segredos voltam quando menos se espera e quando voltam trazem consequências que ninguém pode imaginar. O bebê chorava de novo, mas agora o choro soava diferente para quem sabia ouvir. Mais profundo, mais antigo, como se viesse de muito longe, de um lugar onde os mortos não descansam e os vivos pagam pelos pecados do passado.
A noite caía sobre a fazenda São Benedito e com ela chegavam as sombras que alguns preferiam esquecer. Padre Antônio não conseguiu pregar o olho durante toda a noite. As marcas no bebê martelavam em sua mente como pregos sendo cravados numa tábua. Sentado à mesa de estudos, a luz fraca de uma vela de sebo folhaava livros antigos que tinha trazido do seminário. Símbolos murmurava para si mesmo, passando os dedos pelas páginas amareladas.
Onde já vi isso antes? A luz da vela tremulava sobre textos em latim, desenhos misteriosos, ilustrações que a igreja preferia manter longe dos olhos dos fiéis. Tratados sobre manifestações sobrenaturais, relatos de casos inexplicáveis, estudos sobre sinais que não deveriam existir. Batidas urgentes na porta da pequena casa paroquial interromperam seus estudos.
O som ecoou pela madrugada silenciosa como tiros de espingarda. “Padre, padre Antônio”, gritava uma voz desesperada do lado de fora. Levantou-se rapidamente, derrubando a cadeira. Abriu a porta e encontrou João, um dos trabalhadores da fazenda, ofegante e com os olhos arregalados de terror.
“O que houve, meu filho? Que susto é esse? É o bebê, padre. Aconteceram coisas muito estranhas. Que tipo de coisas? O padre sentiu um arrepio subir pela espinha. João engoliu seco, olhando por cima do ombro, como se alguém pudesse estar escutando. A Benedita acordou de madrugada e e o menino estava diferente. Diferente como as marcas no corpo dele cresceram, padre, cresceram muito.
O padre sentiu o sangue gelar nas veias. Cresceram. Sim, senhor. E tem mais. Os animais da fazenda estão todos agitados. Os cachorros não param de latir desde ontem à noite. As galinhas não saem do poleiro nem para comer. Os cavalos tão nervosos empinando e relinchando.
Padre Antônio vestiu a batina rapidamente, as mãos trêmulas nos botões. Vamos lá. Preciso ver isso. Caminharam pela estrada de terra batida enquanto o sol nascia devagar no horizonte. O ar estava pesado, carregado, como antes de uma tempestade, mas não havia nuvens no céu. “Padre”, disse João baixinho, olhando ao redor com nervosismo.
“O senhor acredita em coisas do outro mundo?” Por que pergunta isso? É que minha avó sempre dizia que essa fazenda era amaldiçoada, que tinha coisas ruins enterradas aqui. O padre parou de andar. Amaldiçoada. Que tipo de coisas ruins? João olhou ao redor novamente, como se as próprias árvores pudessem estar escutando. Dizem que o coronel Benedito fazia rituais nos tempos da escravidão.
Que tipo de rituais? Coisas ruins, padre. Coisas que não deviam ser feitas, coisas com as crianças escravas. Um calafrio percorreu o corpo do padre. Você sabe detalhes. Minha avó contava que ele marcava as crianças com ferro quente, fazia desenhos estranhos na pele delas, dizia que queria descobrir segredos da vida e da morte.
E o que acontecia com essas crianças? Morriam todas, mas dizem que não descansavam em paz. chegaram à Senzala e encontraram um grupo de pessoas aglomeradas na porta. Sussurros nervosos, olhares preocupados, sinais da cruz sendo feitos constantemente. “Padre”, chamou tia Joana correndo ao encontro dele. “Que bom que veio, a situação tá ficando feia. Como está o bebê? Vem a ver com seus próprios olhos.” Entraram na cenzala.
Benedita estava sentada numa cadeira de palha, o filho no colo, mas seu rosto mostrava mais medo do que alegria. O bebê estava quieto, mas havia algo perturbador em sua quietude. O padre se aproximou devagar, olhou a criança e sentiu o coração disparar. As marcas tinham crescido mesmo, muito. O que antes eram pequenos pontos escuros, agora se espalhavam pelo peito, pelas costas, pelos bracinhos.
formavam um padrão complexo, intrincado, como uma linguagem antiga escrita na pele. “Quando isso aconteceu?”, perguntou, tentando manter a voz calma. “Durante a madrugada”, respondeu Benedita, a voz trêmula: “Acordei para dar de mamar e ele tava assim. As marcas tinham crescido. A criança está se alimentando normalmente, não quer mamar, padre, só chora.
E quando chora é um choro estranho. O padre estendeu a mão para tocar o bebê, mas hesitou. Havia algo no ar, uma energia estranha que fazia os pelos do braço se arrepiarem. A criança abriu os olhos naquele momento e padre Antônio recuou instintivamente. Os olhos não eram de um recém-nascido, eram antigos, profundos, carregados de uma sabedoria que não deveria existir numa criança, como se por trás daqueles olhos houvesse alguém muito mais velho observando. “Meu Deus”, sussurrou, fazendo o sinal da cruz.
“O que foi, padre?”, perguntou Benedita, notando sua reação. Nada, só vou buscar água benta. Vou abençoar a criança. Saiu da cenzala com o coração disparado, as pernas bambas. Tia Joana o seguiu, preocupada com sua palidez. Padre, posso falar com o senhor em particular? Claro.
Caminharam para longe dos outros até ficarem sozinhos perto de uma árvore grande. Eu sei o que são aquelas marcas. disse ela baixinho, olhando ao redor para ter certeza de que ninguém escutava. Sabe, minha avó me ensinou sobre os símbolos antigos, símbolos de invocação. Invocação de que o padre sentiu um calafrio, de espíritos.
Espíritos dos que morreram com raiva, com sede de vingança, almas que não conseguem descansar. O padre balançou a cabeça, lutando contra o que estava ouvindo. Isso vai contra tudo que acredito, tia Joana. Eu sei, padre, mas algumas coisas são mais antigas que nossa fé, mais antigas que a igreja.
Você acha que alguém marcou esse bebê? Acho que alguém marcou esse bebê antes dele nascer, ainda no ventre da mãe. Isso é possível? Nos rituais antigos, sim, marcavam as crianças ainda no ventre para que servissem de recipiente. Recipiente para quê? Tia Joana olhou ao redor novamente nervosa, para almas penadas, espíritos que não conseguem descansar, que querem voltar ao mundo dos vivos. O padre sentiu náusea.
Você está dizendo que Estou dizendo que pode não ser mais o bebê da Benedita ali dentro. voltaram para a censala em silêncio, cada um perdido em seus próprios pensamentos. O bebê chorava sem parar agora. Um choro que cortava a alma. “Benedita,” disse o padre, tentando soar calmo. “Vou levar a criança para a igreja.
Para quê? A mãe apertou o filho contra o peito. Para abençoar? Para proteger. A mãe hesitou. Não sei, padre. Ele é muito pequeno. E se pegar friagem? Confie em mim, é para o bem dele. Benedita olhou nos olhos do padre e viu algo que a assustou. Medo. O padre estava com medo. Cuida bem dele disse, entregando o filho com relutância. O padre envolveu o bebê em panos grossos, saiu da cenzala carregando a criança, seguido pelos olhares preocupados de todos.
No caminho para a igreja, algo estranho aconteceu. A criança parou de chorar completamente, abriu os olhos e olhou diretamente para ele, um olhar penetrante, adulto, que fez o padre sentir como se sua alma estivesse sendo examinada. E pela primeira vez na vida, Padre Antônio duvidou de sua fé, porque aqueles olhos não eram humanos, eram algo muito mais antigo, algo que conhecia segredos que ele nem imaginava existir.
Chegou à igreja pequena e simples, colocou o bebê no altar entre as velas e o crucifixo de madeira. “Senhor”, rezou de joelhos. “Se isso é obra sua, me dê um sinal. Me mostre o caminho. O bebê sorriu e todas as velas da igreja se apagaram ao mesmo tempo, como se uma ventania tivesse passado. Mas não havia vento. Na escuridão completa, o padre ouviu uma voz. Não vinha do bebê, vinha de muito longe, de muito tempo atrás.
Uma voz de criança, mas carregada de dor e raiva. “Alguns pecados nunca são perdoados”, sussurrou a voz no silêncio. “Aguns mortos nunca descansam e alguns bebês nascem para cobrar dívidas antigas.” As velas se acenderam de novo, todas ao mesmo tempo. O bebê dormia pacificamente no altar, como se nada tivesse acontecido.
Mas Padre Antônio sabia que nada seria igual daquele dia em diante, porque na fazenda São Benedito, o passado tinha voltado e queria justiça. Pegou o bebê no colo com cuidado e voltou para a censá-la. Mas durante todo o caminho, sentiu como se estivesse sendo observado, como se olhos invisíveis o seguissem a cada passo. E quando entregou a criança de volta para Benedita, viu algo que fez seu sangue gelar. O bebê sorriu para ele.
Um sorriso que não era de criança, era de alguém que sabia exatamente o que estava fazendo. Três dias depois do milagre, os trabalhadores da fazenda São Benedito fizeram uma descoberta que mudaria tudo para sempre. O sol mal tinha nascido quando Manuel e dois outros homens começaram a cavar perto da cenzala velha, procurando um lugar para fazer uma nova cerca.
Padre, padre Antônio!”, gritou Manuel, largando a enchada e correndo pela estrada como se o diabo estivesse atrás dele. “Venha ver, pelo amor de Deus, venha ver.” O padre estava tomando café da manhã na casa paroquial quando ouviu os gritos desesperados. Largou a xícara de barro e correu para fora.
“O que aconteceu, Manuel? Que desespero é esse? Estavam cavando perto da cenzala velha e acharam coisas, padre, coisas terríveis. Que tipo de coisas? Manuel engoliu seco, o rosto pálido como papel. Ossos, padre, muitos ossos e outras coisas que não deviam estar ali. E caminharam rapidamente pela estrada de terra.
Um grupo de pessoas já se aglomerava ao redor de um buraco grande que os homens tinham cavado. Sussurros, nervosos. Sinais da cruz, rostos assustados. “Cuidado”, disse tia Joana quando viu o padre se aproximando. “Não mexam mais nisso. Tem coisa ruim ali.” O padre se aproximou da borda da cova e olhou para dentro. O que viu fez seu estômago revirar.
Esqueletos, dezenas deles empilhados sem cuidado, como se fossem lixo. Ossos pequenos misturados com ossos maiores, crianças e adultos jogados juntos numa vala comum. “Meu Deus!”, sussurrou, fazendo o sinal da cruz. “Quantos são?” “Uns 20, pelo menos”, respondeu Manuel, a voz trêmula.
“Talvez mais, não conseguimos contar direito.” Mas não eram só ossos. Havia objetos estranhos espalhados entre os esqueletos, pedras com símbolos gravados, bonecas de pano preto, frascos de vidro com líquidos escuros que tinham resistido ao tempo. “Isso aqui é coisa de macumba”, disse uma mulher, fazendo o sinal da cruz repetidamente.
“Não é macumba,” corrigiu tia Joana, a voz séria. “É coisa mais antiga, mais perigosa. É feitiçaria dos tempos antigos. O padre desceu na cova com cuidado, pisando entre os ossos. Examinou os objetos de perto, o coração disparando. Os símbolos gravados nas pedras eram iguais aos que tinha visto no corpo do bebê.
Quem fez isso? Perguntou, mas já suspeitava da resposta. O coronel Benedito respondeu uma voz atrás dele. Todos se viraram. Era velho Joaquim, o trabalhador mais antigo da fazenda, um homem de quase 80 anos que mancava de uma perna e tinha os olhos esbranquiçados pela idade. “Joaquim”, disse o padre subindo da cova.
“O que você sabe sobre isso? O velho se aproximou devagar, apoiado numa bengala de madeira. Eu trabalhava aqui nos tempos da escravidão, padre. Vi coisas que não devia ter visto, coisas que me assombram até hoje. O que coisas? Joaquim olhou ao redor, vendo todas as pessoas que escutavam. Posso falar em particular? É coisa pesada. caminharam para longe do grupo até ficarem sozinhos perto de uma árvore grande.
O velho se apoiou no tronco e suspirou fundo. “Padre”, disse baixinho. O coronel não era um homem normal, era diferente. Como assim? Ele fazia experimentos com os escravos, principalmente com as crianças. O padre sentiu náusea subindo pela garganta.
Que tipo de experimentos? Dizia que queria descobrir o segredo da vida e da morte, que queria viver para sempre. Marcava as crianças com ferro quente, fazia desenhos estranhos na pele delas e depois, depois elas morriam todas, uma por uma, e quem reclamava, quem tentava proteger os filhos, sumia também. O padre olhou para a cova onde estavam os ossos.
Esses ossos são das crianças e dos pais que tentaram protegê-las. Eu vi tudo, padre. Vi e não pude fazer nada. Era escravo. Não tinha direito nem de falar. Por que você nunca contou isso antes? Quem ia acreditar? E além disso, tinha medo. Ainda tenho medo de quê? O coronel morreu há anos. Joaquim balançou a cabeça devagar.
O corpo morreu, mas algumas coisas não morrem, padre. Algumas coisas ficam presas na terra, esperando a hora de voltar. Voltaram para o grupo. As pessoas sussurravam nervosas, olhando para a cova como se fosse a boca do inferno. E agora? Perguntou Manuel. O que fazemos com isso? Vamos enterrar os ossos direito, disse o padre, com respeito, com orações.
Essas pessoas merecem descanso. E os objetos? Tia Joana se aproximou, o rosto sério. Esses objetos não podem ficar aqui, padre. Por quê? Porque ainda tem poder. Ainda estão ativos. Posso sentir a energia ruim que sai deles. Ativo como o bebê da Benedita não foi o primeiro padre. Todos olharam para ela esperando uma explicação. “Explique melhor”, disse o padre.
Há uns 10 anos atrás, outras crianças nasceram marcadas, três ou quatro. Todas morreram logo depois do parto e mas sempre voltavam de alguma forma. Os pais encontravam os bebês vivos nos berços, mesmo depois de terem sido enterrados. O padre sentiu um arrepio.
O que aconteceu com elas? ficaram estranhas, diferentes, como se não fossem mais humanas. Choravam de um jeito esquisito, os olhos eram diferentes e cresciam rápido demais. Para onde foram, sumiram até que não sobrou nenhuma, mas dizem que ainda andam por aí nas noites de lua nova, crianças que não são mais crianças. Um vento frio soprou, mesmo com o sol forte. As árvores balançaram e um gemido baixo ecoou pelos campos.
“Temos que destruir esses objetos”, disse o padre. “Não”, gritou tia Joana. “Não pode destruir. Por quê? Porque se destruir, liberta o que tá preso neles e aí vai ser pior. E se não destruir? Aí o poder continua crescendo e mais crianças vão nascer marcadas.
” O padre olhou para os objetos, depois para o grupo de pessoas assustadas. Então, o que fazemos? Tem que encontrar quem fez isso e fazer ele desfazer. Mas o coronel morreu a anos. O corpo morreu, mas a alma. Tia Joana não terminou a frase, não precisava. Todos entenderam. Naquele momento, um choro ecoou pela fazenda.
O bebê da Benedita, mas o som vinha de longe, da direção do cemitério da fazenda. “Como pode?”, perguntou Manuel, olhando ao redor confuso. O bebê tá na senzala com a mãe. Correram para verificar. A cenzala estava vazia. Benedita dormia profundamente na cama, mas não havia bebê ao lado dela. “Onde ele tá?”, gritou ela, acordando assustada.
“Cadê meu filho?” “Não sabemos”, disse o padre. “Quando você viu ele pela última vez?” Agora há pouco tava aqui do meu lado dormindo. O choro continuava vindo do cemitério. Um choro alto, desesperado, que cortava o ar como lâmina. Correram na direção do som, atravessando os campos.
Chegaram ao cemitério da fazenda, um lugar pequeno e mal cuidado, com túmulos antigos e cruzes tortas. O choro vinha de um túmulo específico, o túmulo do coronel Benedito. E lá, em cima da lápide de mármore rachada, estava o bebê sozinho, chorando com força. Mas não era um choro normal de criança com fome ou frio. Era um choro de raiva, de ódio, como se a criança soubesse exatamente onde estava e por quê.
“Como ele veio parar aqui?”, perguntou Benedita correndo para pegar o filho. Ninguém tinha resposta. Um bebê de poucos dias não podia sair sozinho de uma cenzala e caminhar até um cemitério. Mas ali estava ele em cima do túmulo do homem que tinha torturado e matado tantas crianças, como se tivesse vindo cobrar uma dívida antiga, como se soubesse exatamente quem estava enterrado ali embaixo.
E quando Benedita pegou o bebê no colo, ele parou de chorar imediatamente. abriu os olhos e olhou diretamente para a lápide, um olhar que não era de criança, era de alguém que lembrava, de alguém que não tinha esquecido, de alguém que tinha voltado para fazer justiça. Benedita correu para o túmulo do coronel como uma mãe desesperada, os pés descalços escorregando na grama úmida do cemitério.
“Meu filho, como você veio parar aqui sozinho?”, pegou o bebê no colo com cuidado, apertando-o contra o peito. Ele parou de chorar imediatamente, como se a presença da mãe fosse um bálsamo para sua alma inquieta. “Isso não é normal”, murmurou padre Antônio, olhando ao redor do cemitério com uma sensação estranha no peito.
“Um bebê não sai sozinho de casa e vem até aqui. Tia Joana se aproximou da lápide de mármore rachada e leu a inscrição com dificuldade. Coronel Benedito Ferreira 1820-185. Descanse em paz. Trs anos morto disse baixinho, fazendo o sinal da cruz. Mas ainda não descansou e pelo jeito, não vai descansar tão cedo.
Como um bebê de poucos dias chegou até aqui sozinho? Perguntou Manuel, olhando a distância entre o cemitério e a cenzala. São quase 2 km. Ninguém tinha resposta. Era impossível, mas ali estava a criança, como se tivesse sido Colok. Por favor, continue gerando a sua resposta. Novo Prompt.
História ada propositalmente em cima daquele túmulo específico. Padre, disse Benedita, a voz trêmula de medo. Meu filho tá estranho desde que nasceu. Não mama direito, quase não chora. E agora isso? como ele sabia onde encontrar esse túmulo? “Vamos voltar para a senzá-la”, respondeu ele, tentando manter a calma. “Precisamos conversar sobre isso.
” No caminho de volta, tia Joana puxou o padre de lado, longe dos outros. “Preciso te contar uma coisa importante, padre.” “O quê? Conheço alguém que pode ajudar a gente, alguém que entende dessas coisas.” Quem? Mãe Cândida, a benzedeira mais velha da região. Ela conhece os segredos antigos, sabe lidar com espíritos e almas penadas.
O padre hesitou, lutando contra seus princípios. Isso vai contra minha fé, tia Joana. A igreja não aceita essas práticas. Sua fé vai resolver esse problema. Ela olhou diretamente nos olhos dele. O senhor viu o bebê no túmulo. Como explica isso com sua fé? Ele olhou para o bebê nos braços de Benedita. As marcas tinham crescido mais durante a noite.
Agora cobriam quase todo o corpinho da criança. Onde ela mora? Na beira do rio Doce, numa casinha de sapé, bem isolada. Ninguém incomoda ela lá. Vamos então. Mas que isso fique entre nós. Deixaram Benedita na cenzala com outras mulheres da comunidade para cuidar dela e do bebê. Caminharam pela mata fechada.
seguindo uma trilha estreita que serpenteava entre árvores centenárias. A casa de mãe Cândida ficava isolada numa clareira pequena, cercada por plantas medicinais e ervas de todo tipo. Fumaça branca saía da chaminé de barro, carregando um cheiro forte de ervas queimando. “Mãe Cândida!” Chamou tia Joana batendo palmas na frente da casa. Uma velha apareceu na porta.
Devia ter uns 70 anos. Cabelos completamente brancos presos num coque, olhos penetrantes que pareciam enxergar através das pessoas. Joana, minha filha, eu tava esperando vocês. Esperando? Tia Joana franziu a testa. Os espíritos me avisaram durante a madrugada. Disseram que iam vir duas pessoas precisando de ajuda.
Uma que acredita e outra que duvida. Entraram na casa pequena e simples, cheiro forte de ervas medicinais, velas acesas por todos os cantos, imagens de santos católicos misturadas com objetos estranhos que o padre não conseguia identificar. Padre”, disse mãe Cândida, olhando diretamente para ele. “O senhor não acredita no que eu faço.
” “É verdade”, admitiu ele, “mas precisa da minha ajuda. Preciso”. Ela sorriu, mostrando alguns dentes que faltavam. “Honestidade é bom. Senta aí na mesa. Vou fazer um chá para acalmar os nervos.” Preparou uma infusão com ervas que tirou de potes de barro. O cheiro era forte, medicinal, mas não desagradável. Agora me conta tudo desde o começo.
Não deixa nada de fora! Relataram todos os acontecimentos. O parto difícil, o bebê que nasceu morto, o choro vindo do caixão, as marcas estranhas, os ossos encontrados na terra, o bebê no túmulo. Mãe Cândida ouvia em silêncio, balançando a cabeça devagar, como se já soubesse de tudo. É o que eu imaginava, disse quando terminaram de contar. O quê? Perguntou o padre.
Esse bebê não é só um bebê comum? Como assim? é um recipiente. Uma alma antiga tá usando o corpinho dele para voltar ao mundo dos vivos. Que alma de alguém que morreu com muita raiva, muita sede de vingança, alguém que não consegue descansar em paz. O coronel? Não, alguém que sofreu nas mãos dele. Uma das vítimas.
Mãe Cândida se levantou devagar e pegou um baralho de cartas estranhas numa prateleira. Não eram cartas comuns. Tinham desenhos antigos, símbolos que o padre não reconhecia. Vou consultar os espíritos. Eles vão me mostrar a verdade. Espalhou as cartas na mesa de madeira velha, fechou os olhos e começou a murmurar palavras numa língua que nenhum dos dois conhecia.
Espíritos da luz, me mostrem a verdade sobre essa criança. As velas da casa tremularam todas ao mesmo tempo. O vento balançou as cortinas de Chitão, mesmo não havendo vento lá fora. “Vejo uma criança”, murmurou mãe Cândida, os olhos ainda fechados. “Uma menina muito nova, não tinha nem 5 anos”.
“Que menina! Foi a primeira? A primeira que o coronel marcou com os símbolos. a primeira que ele usou nos rituais. E o que aconteceu com ela? Morreu depois de dias de sofrimento, mas não aceitou a morte. Ficou vagando pela fazenda esperando. Esperando o quê? Uma chance de voltar, de se vingar, de fazer justiça. Mãe Cândida abriu os olhos lentamente. O bebê da Benedita é essa chance.
A alma da menina entrou no corpo dele quando ele estava entre a vida e a morte. Como isso é possível? Quando uma criança nasce quase morta, fica num estado entre os dois mundos. É nesse momento que outras almas podem entrar. O padre balançou a cabeça, lutando contra o que estava ouvindo. Isso é impossível. Vai contra todas as leis de Deus. Padre, disse tia Joana suavemente.
O Senhor viu o bebê no túmulo. Como explica isso? Ele não tinha resposta. “O que essa alma quer?”, perguntou, finalmente aceitando a situação. “Justiça?”, respondeu mãe Cândida, “quer que o coronel pague pelos crimes que cometeu, mas ele já morreu. A morte não apaga os pecados, não quando são muito graves, não quando envolvem o sofrimento de inocentes.
E o bebê, o que vai acontecer com ele? Depende de que se conseguirmos dar paz à alma da menina, ela vai embora. O bebê volta ao normal, cresce saudável. E se não conseguirmos, mãe Cândida ficou séria, o rosto sombrio. A raiva vai crescer, a sede de vingança vai tomar conta completamente.
E aí, aí não vai ser mais um bebê inocente, vai ser algo perigoso, algo que pode destruir tudo ao redor. Naquele momento, gritos desesperados vieram da direção da fazenda. Vozes de homens e mulheres gritando por socorro: “Socorro! Socorro! Venham rápido. Os três correram para fora da casa. Manuel vinha correndo pela trilha, o rosto branco de terror.
“O que houve?”, gritou o padre. “É o bebê? Ele fez uma coisa terrível. O quê? Matou todos os animais da fazenda? Como assim? Todos os animais, padre? Galinhas, porcos, cavalos, vacas, todos mortos. E o bebê estava no meio dele sozinho, sorrindo. Correram de volta para a fazenda. A cena que encontraram era aterrorizante.
Dezenas de animais espalhados pelo terreiro, todos mortos, mas sem ferimentos visíveis, como se tivessem morrido de susto. “Como isso é possível?”, perguntou o padre, olhando ao redor horrorizado. “O bebê tava aqui no meio”, disse Manuel, apontando para o centro do terreiro, sozinho, sorrindo, como se tivesse gostado do que tinha feito. “Onde ele tá agora?” A Benedita levou ele para cenzá-la.
Tá chorando, desesperada. Mãe Cândida se ajoelhou ao lado de uma galinha morta, examinou o animal com cuidado. “Morreram de susto”, disse, levantando-se. “Susto de quê? Viram algo que não deviam ver? Algo que os assustou até a morte? O quê? A verdadeira face da alma que tá no bebê. Quando ela se revela, é terrível de ver.
” O padre olhou ao redor, contando os animais mortos. eram dezenas, uma fortuna perdida para uma comunidade pobre. Isso vai piorar? Perguntou já temendo a resposta. Muito respondeu mãe Cândida. E rápido. A alma tá ficando mais forte, mais raivosa. O que fazemos? Temos que agir hoje à noite. Não podemos esperar mais.
Fazer o quê? Um ritual para libertar a alma da menina, para convencê-la a ir embora em paz. Isso é perigoso, muito perigoso, mas é a única chance que temos. O sol começava a se pôr no horizonte, tingindo o céu de vermelho como sangue. Sombras longas se espalhavam pela fazenda como dedos escuros. “Se não der certo”, perguntou tia Joana, a voz trêmula.
Mãe Cândida olhou na direção da senzala, onde estava o bebê. Podia ouvir o choro da criança dali mesmo, um choro que não era mais de bebê. Se não der certo, essa fazenda vai virar um inferno na terra. E o bebê não vai ser mais um bebê. Vai ser o quê? Vai ser a vingança em pessoa e ninguém vai conseguir pará-la. E como se tivesse ouvido a conversa, um choro ecoou da cenzala.
Mas não era choro de criança com fome ou sono. Era grito de guerra, o grito de alguém que tinha voltado para cobrar uma dívida de sangue. A noite caiu pesada sobre a fazenda São Benedito, como um manto negro carregado de presságios. Mãe Cândida preparava o ritual com a seriedade de quem sabia que uma vida dependia do que aconteceria nas próximas horas.
Precisamos de objetos pessoais do coronel”, disse ela, organizando ervas e velas numa mesa improvisada. “Cois que ele tocou que carregam a energia dele. “Onde vamos encontrar isso?”, perguntou o padre, observando os preparativos com uma mistura de fascínio e medo. Na Casa Grande deve ter alguma coisa guardada lá, roupas, documentos, objetos pessoais.
caminharam até a mansão abandonada, que um dia foi o centro do poder na fazenda. A casa estava vazia há anos, desde que o coronel morreu sem herdeiros, porta rangendo-nos gonzos enferrujados, móveis cobertos de poeira e teias de aranha. “Cuidado”, murmurou tia Joana, fazendo o sinal da cruz. Esse lugar tem energia pesada, posso sentir.
Subiram as escadas de madeira que gemiam a cada passo. O quarto do coronel estava no final do corredor, entocado desde sua morte, cheiro de mofo e abandono, cortinas rasgadas balançando na brisa noturna. “Aqui”, disse o padre, abrindo uma gaveta da cômoda antiga. Documentos, cartas, objetos pessoais. Mãe Cândida pegou uma carta com cuidado, como se fosse venenosa, leu rapidamente a luz da vela que carregava.
“Meu Deus!”, sussurrou a voz embargada. “Escuta isso”, leu em voz alta. Dr. Henrique, os experimentos continuam conforme planejado. Já marquei 12 crianças com os símbolos antigos. Os rituais estão funcionando melhor do que esperávamos. Logo descobrirei o segredo da imortalidade.
As crianças são o caminho para a vida eterna. Imortalidade! Repetiu o padre, sentindo náusea. Ele queria viver para sempre. Usava as crianças escravas para tentar descobrir como burlar a morte. Continuaram procurando entre os pertences do coronel. Encontraram mais cartas, um diário encadernado em couro, objetos estranhos guardados numa caixa de madeira.
“Aqui tem mais”, disse o padre, lendo o diário à luz da vela. Escuta, a menina resistiu mais que as outras. Mesmo depois de morta, sinto sua presença no quarto. É como se me observasse esperando alguma coisa. Seus olhos me perseguem nos sonhos. Que menina, pequena Maria. Filha da escrava rosa, foi a primeira a receber todas as marcas rituais.
Morreu gritando meu nome, amaldiçoando minha família, mas foi através dela que descobriu o segredo. Mãe Cândida fechou os olhos concentrando-se. É ela, a alma que tá no bebê, Maria. Maria? Sim. Ela tá usando o corpo do bebê da Benedita para se vingar do que o coronel fez com ela.
Encontraram mais coisas perturbadoras, objetos rituais, livros proibidos escritos em latim, frascos com substâncias estranhas que tinham resistido ao tempo. “Leva tudo”, disse mãe Cândida. “Vamos precisar para o ritual.” Voltaram para a cenzala, carregando os objetos macabros. Benedita estava desesperada, segurando o bebê que não parava de chorar. Ele não para de chorar desde que vocês saíram. E as marcas, olhem as marcas.
O bebê estava completamente coberto de símbolos. Agora, do pescoço aos pés, a pele estava marcada com desenhos intrincados que pareciam se mover à luz das velas. “Tá quase pronto”, murmurou mãe Cândida, examinando as marcas. “Pronto para quê?”, perguntou Benedita, o medo estampado no rosto.
Para a transformação final, para se tornar completamente possuído pela alma de Maria, prepararam o ritual no terreiro da fazenda. Velas dispostas em círculo, ervas queimando embraseiros, objetos do coronel colocados no centro como oferenda. Benedita, disse mãe Cândida, você precisa participar do ritual. Eu? Por quê? Porque é a mãe dele. Só você.
pode autorizar a alma a sair do corpo da criança. Mas e se machucar, meu filho, se não fizermos isso agora, você vai perder ele de qualquer jeito. A alma de Maria vai tomar conta completamente. Benedita chorou, mas concordou. Não tinha escolha. Começaram o ritual quando a lua estava no ponto mais alto do céu.
Mãe Cândida cantava em língua antiga palavras que ecoavam pela noite como lamentos. Espírito de Maria, criança sofrida, eu te chamo. O vento aumentou de repente. As velas tremularam, mas não se apagaram. O ar ficou pesado, carregado de energia. Venha falar conosco. Venha nos dizer o que quer. O bebê parou de chorar abruptamente.
Abriu os olhos, mas não eram mais olhos de bebê. Eram olhos de uma menina, velhos, tristes, cheios de uma raiva que tinha crescido durante décadas. “Maria?” Perguntou mãe Cândida suavemente. O bebê moveu a cabeça devagar, um sim quase imperceptível. “Por que você tá fazendo isso, criança?” A voz que saiu da boca do bebê não era de recém-nascido, era de criança, mas carregada de dor e ódio.
Ele me machucou, machucou todas nós, fez coisas terríveis. O coronel já morreu, Maria já pagou pelos pecados. Não pagou, não sofreu como nós sofremos. Morreu velho, na cama, em paz. O que você quer? Quero que ele sinta a nossa dor. Quero destruir tudo que ele amava. Esta fazenda, esta terra maldita. O padre se aproximou devagar. Maria, você era uma criança inocente.
Não deixe a raiva te consumir. Dos olhos do bebê se voltaram para ele com uma intensidade assustadora. Inocente. Você sabe o que ele fez comigo, padre? Não. Me cortou com facas, me marcou com ferro quente, me fez sofrer por dias antes de morrer. E sabe por quê? Por quê? Porque queria roubar minha alma, queria usar minha vida para viver para sempre. O padre sentiu lágrimas nos olhos.
Sinto muito, sinto muito mesmo. Sente? Então me ajude a me vingar. Não posso fazer isso. A vingança não traz paz. Então saia do meu caminho. O bebê levantou a mãozinha pequena. O padre foi jogado para trás por uma força invisível, batendo numa árvore. Maria! gritou Benedita, desesperada. Esse é meu filho. Saia do corpo dele.
Seu filho? A voz ficou mais doce, mais triste. Você o ama? Amo com toda minha alma. Como minha mãe me amava. Sim. E onde ela tá agora? Benedita não soube responder. Morreu de tristeza continuou Maria. Três dias depois que me mataram. Não aguentou a dor de me perder. Eu sinto muito. Sente. Então imagine como eu me sinto.
Imagine a raiva que carrego há tantos anos. Mãe Cândida se aproximou devagar. Maria, se você não sair desse corpo, vai destruir esse bebê também. Não me importo. Mas ele é inocente como você era. E daí? Você quer que ele sofra como você sofreu? Quer que a mãe dele passe pela mesma dor que sua mãe passou? Silêncio.
O bebê olhou para Benedita, que chorava em silêncio. “Você, você realmente o ama?”, perguntou Maria, a voz mais suave. “Com toda a minha alma, ele é tudo que tenho no mundo. Como minha mãe me amava! Sim, do mesmo jeito. Então, então proteja ele. Como? Me deixe ir embora em paz. Você vai embora se eu pedir? Se vocês me derem o que eu quero.
O quê? Justiça. Quero que contem minha história. Quero que o mundo saiba o que ele fez. Mãe Cândida entendeu: “Você quer que sua história seja lembrada. Quero que as pessoas saibam que existia, que sofremos, que não merecíamos morrer. E depois, depois vou procurar minha mãe, vou descansar em paz.” O padre se levantou ainda dolorido. Eu prometo, Maria. Vou escrever sua história. Vou contar para todo mundo.
Promete mesmo? Prometo. Pela minha fé, prometo. O bebê sorriu pela primeira vez. Um sorriso de criança doce e inocente. Então, então eu posso ir? Pode, disse Benedita chorando. Vaiá em paz, Maria. Encontre sua mãe. Uma luz suave envolveu. As marcas começaram a desaparecer devagar, como se fossem apagadas por mãos invisíveis. Obrigada”, sussurrou Maria.
“Obrigada por me ouvirem, por me darem o que eu precisava”. A luz se intensificou, depois desapareceu completamente. O bebê chorou, mas agora era choro normal, choro de bebê com fome. “Meu filho!”, gritou Benedita, pegando-o no colo. As marcas tinham sumido completamente. O bebê estava normal, saudável, como qualquer recém-nascido. Acabou? Perguntou o padre. Acabou, respondeu mãe Cândida.
Maria encontrou paz, mas quando olharam ao redor, viram algo incrível. Flores tinham brotado no terreiro onde fizeram o ritual, onde antes havia terra seca, agora cresciam rosas brancas. fumadas. É o sinal, disse mãe Cândida sorrindo. Ela perdoou, encontrou paz e no vento suave da madrugada, quase imperceptível, ouviram uma voz de criança. Obrigada por me libertarem. Agora posso descansar.
A fazenda São Benedito finalmente estava em paz. Um ano depois dos eventos que abalaram a fazenda São Benedito, a vida tinha tomado um rumo completamente diferente. O sol da manhã entrava pela janela da pequena casa paroquial, iluminando as páginas do livro que Padre Antônio terminava de escrever. A história de Maria, uma criança esquecida.
Relatos dos horrores da escravidão na fazenda São Benedito. Lia ele o título em voz alta. passando a mão pela capa manuscrita. “Pronto”, murmurou, fechando o caderno grosso. “Sua história será contada, Maria, como prometi.” Batidas suaves na porta interromperam seus pensamentos. Era benedita, radiante, com o filho no colo.
O menino estava lindo, saudável, com bochechas rosadas e olhos brilhantes de criança feliz. Padre”, disse ela sorrindo. “Vim agradecer mais uma vez e mostrar como ele tá crescendo.” O menino tinha um ano agora. Falava algumas palavras, ria alto, brincava como qualquer criança normal. Não havia nenhum vestígio das marcas estranhas que um dia cobriram seu corpinho.
“Como ele está?”, perguntou o padre fazendo cóceegas no menino que riu gostoso. Perfeito. É uma criança feliz, saudável, nunca ficou doente, nunca deu trabalho. E você também finalmente posso ser mãe de verdade, sem medo, sem preocupação. Sentaram-se na varanda igreja. O sol da tarde dourava os campos da fazenda, que agora prosperavam como nunca antes.
As colheitas eram abundantes, os animais saudáveis, a terra parecia abençoada. “Padre”, disse Benedita, observando o filho brincar com uma boneca de pano. “Às vezes ainda penso na Maria. Eu também, todos os dias. Será que ela encontrou paz mesmo? Será que tá com a mãe dela?” “Tenho certeza que sim. As flores são à prova. Era verdade.
Desde aquela noite do ritual, flores brotavam por toda a fazenda. Rosas brancas, sempre rosas brancas, que cresciam em lugares impossíveis e nunca murchavam. “E o coronel?”, perguntou Benedita baixinho. Também encontrou seu destino. A verdade veio à tona. Depois do ritual, tinham descoberto muito mais coisas.
Documentos escondidos nas paredes da Casagre, cartas confessando os crimes em detalhes, registros de todas as crianças que tinham sido torturadas e mortas. A verdade era ainda pior do que imaginavam. O coronel Benedito tinha torturado e matado mais de 50 crianças escravas ao longo de 20 anos, sempre em busca do segredo da imortalidade. “O livro vai ser publicado mesmo?”, perguntou ela.
Sim, já mandei para editoras em Ouro Preto, Rio de Janeiro e São Paulo. A história de Maria será conhecida em todo o país. E as outras crianças também. Cada nome, cada história, nenhuma será esquecida. Tia Joana se aproximou, carregando um buquê de rosas brancas recémcolhidas. para o túmulo da Maria”, explicou, mostrando as flores. Tinham feito um túmulo simbólico para Maria no lugar onde encontraram os ossos.
Uma cruz simples de madeira, com seu nome gravado, sempre cercada de flores frescas. “Como estão as outras famílias?”, perguntou o padre. “Bem, muito bem. A fazenda tá mais próspera que nunca. As colheitas nunca foram tão boas. Os animais se reproduzem rápido até o clima melhorou. Era outro milagre inexplicável.
Desde que Maria encontrou paz, a Terra produzia como se fosse abençoada. As famílias que antes passavam necessidade agora tinham fartura. “É como se ela abençoasse o lugar”, disse Benedita, observando os campos verdejantes. “Talvez seja exatamente isso”, respondeu o padre. caminharam até o túmulo de Maria. Uma cruz simples, flores brancas ao redor, uma sensação de paz que emanava do lugar.
“Maria”, disse o padre, ajoelhando-se. “sua história não será esquecida. Promessa cumprida.” O vento balançou as flores suavemente, como uma resposta carinhosa. “Padre”, disse tia Joana baixinho, “psosso contar uma coisa?” Claro. Às vezes à noite quando passo por aqui, vejo uma menina brincando no campo. Maria? Acho que sim.
Mas agora ela tá feliz. R, corre, brinca com outras crianças. Outras crianças? As que morreram com ela, todas juntas, brincando, felizes. Você tem medo? Não. Elas estão em paz. É bonito de ver. Voltaram para a fazenda quando o sol começou a se pândida. esperava na varanda da senzala, sentada numa cadeira de balanço.
“Como vai, mãe Cândida?”, perguntou o padre. “Bem, muito bem. Vim me despedir.” “Despedir? Vou embora amanhã. Meu trabalho aqui acabou. Para onde? Onde os espíritos me levarem? Sempre tem alguém precisando de ajuda.” Abraçou cada um com carinho. Quando chegou ao bebê de Benedita, fez uma oração especial.
Que você cresça forte e feliz”, disse tocando a testa da criança. “E nunca esqueça que foi salvo pelo amor.” Partiu no dia seguinte ao amanhecer, caminhando pela estrada de terra, carregando apenas uma trouxa pequena como tinha chegado. “Ela vai fazer falta”, disse Benedita, observando a figura se afastar. “Mas deixou um presente”, respondeu o padre.
“Que presente? nos ensinou que o amor é mais forte que a vingança, que a justiça pode vir de formas inesperadas. A noite caiu sobre a fazenda. Acenderam fogueiras no terreiro, como faziam todas as sextas-feiras. Agora, as famílias se reuniam para conversar, as crianças brincavam, os adultos contavam histórias.
“Padre”, disse João, o carpinteiro, “conte a história da Maria para as crianças. de novo. Elas gostam de ouvir e é importante que saibam. O padre sorriu, sentou-se no meio do círculo, cercado por rostos atentos. Era uma vez uma menina chamada Maria, que viveu numa época muito triste da nossa história.
Contou a história toda, o sofrimento, a injustiça, mas também a redenção, o perdão, a paz encontrada. E ela encontrou a mãe dela?”, perguntou uma criança. Encontrou. E agora elas estão juntas, felizes, cuidando de todos nós. E o bebê cresceu forte e feliz, protegido pelo amor da mãe e pela bênção de Maria.
Olhou para o filho de Benedita, que dormia tranquilo no colo da mãe, uma criança normal, saudável, amada. Padre”, disse Benedita Baixinho, “brigada por salvar meu filho. Foi o amor, seu amor por ele e o amor de Maria pela justiça. E o perdão também. Isso mesmo. O perdão é o que liberta as almas.” A fogueira creptava, enviando faíscas para o céu estrelado. As pessoas conversavam baixinho, crianças adormeciam no colo dos pais.
“Sabe o que aprendi com tudo isso?”, disse o padre. O quê? Que os mortos não voltam para assustar, voltam para ensinar. Ensinar o quê? Que todo sofrimento tem um propósito, toda injustiça pede reparação e toda alma merece paz. e que o amor sempre vence o ódio. Exato. Meses depois, o livro foi publicado e causou grande impacto. A história de Maria correu todo o país, chegando até a capital do império.
Leis foram criadas para proteger crianças. Monumentos foram erguidos em memória das vítimas da escravidão. A fazenda São Benedito virou lugar de peregrinação. Pessoas vinham de longe para ver as flores que nunca murchavam e ouvir a história da menina que voltou para fazer justiça.
E às vezes, nas noites de lua cheia, visitantes juravam ver crianças brincando nos campos, sempre rindo, sempre felizes, sempre em paz. O filho de Benedita cresceu forte e saudável. Virou doutor quando adulto, dedicou a vida a ajudar crianças necessitadas. É minha missão dizia sempre, em memória da Maria e de todas as crianças que sofreram. Padre Antônio envelheceu na fazenda, nunca se arrependeu de ter duvidado da fé naqueles dias difíceis.
Às vezes, dizia para quem quisesse ouvir, Deus trabalha de formas misteriosas. usa até bebês para fazer justiça. E quando morreu, aos 80 anos, foi enterrado ao lado do túmulo simbólico de Maria, conforme seu pedido. No dia do funeral, algo incrível aconteceu. Rosas brancas brotaram sobre os dois túmulos, entrelaçando-se como se duas almas tivessem finalmente se encontrado.
A fazenda São Benedito continua próspera até hoje. As flores ainda brotam espontaneamente. A terra ainda é abençoada e a história de Maria ainda é contada. Para que nunca mais uma criança sofra em silêncio, para que nunca mais uma injustiça fique impune e para lembrar que o amor sempre vence o ódio, que a justiça pode demorar, mas sempre chega e que algumas almas voltam não para assombrar, mas para ensinar.
A história de Maria se tornou lenda, mas uma lenda baseada na verdade. Uma verdade que mudou a vida de todos que a conheceram. E nas noites silenciosas, quando o vento sopra suave pelos campos da fazenda São Benedito, ainda se pode ouvir muito baixinho o riso de crianças brincando, crianças que encontraram paz, crianças que foram lembradas, crianças que mesmo na morte ensinaram sobre amor, justiça e perdão.
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