Ela contrata um motorista… sem saber que é o filho que abandonou há 30 anos.
Aos anos, Madame Élise Quassy era uma das mulheres mais respeitadas de Abidjan. Ela possuía hotéis de luxo em Cocody, prédios em Marcory e até propriedades no exterior. Seu nome aparecia frequentemente em revistas de negócios, e seu sucesso inspirava tanto quanto intimidava. Sempre elegante, sempre impecável, Élise usava tailleurs sob medida e falava com um tom calmo, porém firme.
Vivia numa imensa vila na Riviera III, com empregados que baixavam os olhos sempre que ela atravessava a sala. Para todos, representava sucesso, disciplina, controle absoluto. Mas por trás dessa fachada perfeita, Élise escondia um segredo que a assombrava há mais de 30 anos. Um filho. Uma criança que ela tinha abandonado ao nascer, fruto de um amor apaixonado com um homem que a deixara sem dizer uma palavra.
Desde aquele dia, ela carregava um vazio que nem toda a fortuna do mundo conseguira preencher. Naquela manhã, em seu grande escritório envidraçado com vista para o jardim, Élise folheava uma revista quando sua assistente bateu à porta.

— Madame Élise, o candidato para o cargo de motorista chegou. Ele se chama Ellie Engessan. Tem ótimas referências e é pontual.
— Faça-o entrar, Jamila — respondeu ela, sem levantar os olhos. — Espero que seja mais sério que o último.
Jamila sorriu discretamente e saiu. Segundos depois, a porta se abriu devagar. Um homem entrou. Alto, magro, com pouco mais de trinta anos, vestindo uma camisa elegante e limpa. Seus olhos escuros revelavam uma força tranquila, mas também um cansaço antigo.
Ele segurava o chapéu entre as mãos, humildemente.
— Bom dia, madame — disse ele com voz serena. — Eu me chamo Ellie. Tenho dez anos de experiência como motorista particular. Conheço Abidjan de cor.
— Sente-se — respondeu Élise, observando-o com atenção. — Por que eu deveria contratá-lo?
Ellie respirou fundo.
— Porque sou discreto, pontual e leal. Já trabalhei para famílias exigentes. Sempre disseram que sou confiável, mesmo sob pressão.
Élise acenou lentamente com a cabeça. Havia algo naquele olhar que lhe parecia estranhamente familiar, mas ela afastou a impressão.
— Muito bem. Começa amanhã. Nesta hora exata. O carro deve estar limpo e pronto. Minha assistente explicará o resto.
Ellie se levantou, inclinou a cabeça.
— Obrigado, madame. Não vai se arrepender.
Na manhã seguinte, a Mercedes preta brilhava diante da vila. Ellie já o aguardava, impecavelmente vestido, mãos cruzadas sobre o volante. Quando Élise saiu, usando um conjunto bege e óculos escuros, entrou no banco de trás sem dizer uma palavra.

— Para a sede, em Cocody.
— Sim, madame.
Durante o trajeto, instalou-se um silêncio confortável, quebrado apenas pelo ronco do motor. Ellie dirigia com precisão, evitando engarrafamentos e antecipando cada movimento do trânsito como se lesse o caminho antes que acontecesse. Pelo retrovisor, observava discretamente aquela mulher de postura nobre e beleza fria. Algo nela o atraía sem que soubesse explicar — uma sensação estranha, como um fio invisível.
As semanas passaram. Ellie tornou-se indispensável. Sempre no horário, sempre educado. Parecia entender Élise sem que ela precisasse falar. Às vezes, ela se surpreendia dirigindo-lhe uma palavra a mais que o necessário.
Uma tarde, presos num congestionamento em Adjamé, Élise suspirou alto:
— Estas estradas são um inferno. Como consegue permanecer tão calmo?
— Aprendi a ser, madame — respondeu Ellie com um leve sorriso. — A vida me ensinou que se irritar não muda nada. Melhor pensar em outra coisa.
— E no que pensa nesses momentos? — perguntou ela, quase curiosa.
— Na minha família… ou melhor, naquela que imagino. Cresci sem pais, fui abandonado ao nascer.
O coração de Élise se apertou, mas ela desviou o olhar, escondendo o impacto.
— É triste, mas a vida às vezes dá segundas oportunidades. Você tem uma agora. Aproveite.
Ellie assentiu sem notar as mãos trêmulas da patroa.
Mas havia alguém que observava na sombra.
Cyril Quadio, sobrinho de Élise, um homem ambicioso e ciumento de 37 anos. Vivia com a tia desde a morte dos pais e trabalhava na empresa dela, convencido de que seria seu herdeiro. Mas, desde a chegada de Ellie, desconfiava dele.
— Tia, esse motorista não me inspira confiança. Parece comum demais para este cargo.
— Cyril, pare com as paranoias — respondeu Élise secamente. — Ellie trabalha muito bem. Melhor do que você, às vezes.
Humilhado, Cyril abaixou os olhos, mas seu olhar carregava uma determinação fria. Decidiu investigar.
Dias depois, procurou um amigo antigo, Simon, ex-policial e agora detetive particular.
— Quero que investigue este motorista. Onde nasceu, quem é, tudo.
— Considere feito — respondeu Simon. — Mas cuidado… às vezes encontramos mais do que procuramos.
Enquanto isso, Ellie vivia sua rotina. À noite, voltava para Melissa, sua companheira, uma jovem enfermeira carinhosa e corajosa. Ela o recebia sempre com ternura.
— E então, sua patroa, a grande Madame Quassy? — brincou ela.
— Ela é rígida, mas justa — respondeu ele. — Hoje até perguntou como eu estava.
— Viu? Talvez ela goste mais de você do que imagina — disse Melissa piscando.
Ellie riu.
— Ou talvez só me tolere porque dirijo bem.
Eles riram juntos, sem imaginar que suas vidas estavam prestes a mudar.
Alguns dias depois, Simon voltou ao escritório de Cyril com um envelope grosso.
— Aqui está o que pediu — disse ele, largando o envelope sobre a mesa.
Cyril abriu e começou a folhear.
Certidão de nascimento. Relatórios de orfanato. Arquivos antigos.
Até que congelou diante de uma página.
— Isto… isto não pode ser… — murmurou.
— Pode, sim — respondeu Simon com um suspiro. — O motorista, Ellie… ele nasceu no mesmo dia que o filho que sua tia abandonou. No mesmo hospital. E o nome da mãe biológica listado aqui… combina com o que eu descobri.
Cyril apertou os dentes.
— Então é verdade… Ellie é o filho perdido dela.
Simon assentiu.
— Se for contar isso, cuidado. Uma revelação assim pode destruir ou salvar uma família.
Mas Cyril não pensava em salvar ninguém.
Pensava apenas em si mesmo — e no que perderia se Ellie ocupasse seu lugar no coração da tia.
Na manhã seguinte, Élise entrou no carro. Vestia um vestido azul-escuro e segurava uma pasta de documentos.
— Bom dia, Ellie.
— Bom dia, madame.
Mas hoje havia algo diferente no olhar dele.
E havia algo inquieto no olhar dela.
Enquanto dirigiam pela ponte Houphouët-Boigny, Ellie finalmente falou, com voz baixa:
— Madame… posso lhe perguntar uma coisa?
— Sim, claro.
— A senhora tem filhos?
A pergunta atingiu Élise como um golpe no peito. Ela inspirou profundamente antes de responder:
— Não. Quer dizer… não oficialmente.
Ellie franziu o cenho.
— E… extraoficialmente?
Ela hesitou.
Ele sentiu.
E um silêncio pesado tomou o ar.
— É complicado — disse ela por fim. — Houve uma época da minha vida em que precisei tomar decisões difíceis. E… uma dessas decisões nunca me deixou.
Os olhos de Ellie brilhavam com algo indefinível — esperança? medo?
— Entendo — respondeu ele suavemente. — Às vezes, o passado volta… quando menos esperamos.
Élise o encarou através do retrovisor.
Os olhos dos dois se encontraram por um segundo longo demais.
Ao mesmo tempo, de volta à vila, Cyril abria a porta do escritório de Élise sem bater.
— Tia! Precisamos conversar. Agora.
Ela ergueu as sobrancelhas.
— Cyril, estou saindo. Isso pode esperar?
— Não. É sobre o seu motorista.
— O que tem ele?
Cyril respirou fundo, preparando o golpe.
— Ele não é quem diz ser. Eu mandei investigar. Ele nasceu na mesma data, no mesmo hospital. O mesmo orfanato. O mesmo arquivo. Tia… Ellie é o seu filho.
A pasta caiu das mãos de Élise.
O coração dela disparou.
O ar sumiu.
Ela se segurou na mesa.
— O quê…? Não… isso… isso é impossível.
Mas no fundo do peito, algo antigo — muito antigo — começou a doer.
Cyril continuou, frio:
— Agora sabe por que ele se aproximou? Ele deve ter descoberto tudo antes. Está brincando com você. Aposto que só quer dinheiro, posição… ou vingança.
— Pare! — gritou ela.
Mas a semente da dúvida já tinha sido plantada.
No final do dia, quando Ellie voltou para a vila com o carro, encontrou a porta principal aberta e Cyril o esperando.
— A madame quer falar com você. Agora.
Ellie entrou, confuso. Encontrou Élise no salão, de pé, mãos trêmulas, olhar duro.
— Ellie… preciso que me diga a verdade — disse ela com voz embargada. — Você… por que você realmente veio trabalhar aqui?
Ellie ficou sem reação.
Ele sentiu o chão desaparecer sob os pés.
— Eu… eu vim trabalhar — respondeu. — Só isso. Eu precisava do emprego.
— Mentira! — gritou Cyril. — Você é o filho dela! Achou que podia se aproveitar?
Ellie deu um passo para trás, como se tivesse levado um soco.
— Filho…? Eu… o quê?
— Não se faça de inocente! — Cyril avançou. — Você sabia! Você sempre soube!
— Eu não sabia de nada! — Ellie respondeu, voz trêmula. — Madame… juro… eu não sabia…
Élise respirava com dificuldade. As paredes pareciam girar.
Ellie tentou se aproximar.
— Madame… eu…
— Pare! — gritou ela, recuando. — Saia da minha casa! Agora!
As palavras foram como facas. Ellie ficou imóvel por um instante, como se não acreditasse no que ouvira.
— Madame… por favor…
— Saia! — repetiu ela, com lágrimas caindo. — Saia antes que eu chame a segurança.
O mundo dele desabou.
Devagar, Ellie pegou o chapéu, virou-se e caminhou até a porta.
Antes de sair, olhou para ela uma última vez — uma mistura de dor, confusão e amor não explicado.
E foi embora.
Quando a porta se fechou, Élise levou a mão ao peito e desabou no chão, chorando como nunca antes.
Mas, ao contrário do que Linda pensava, Joe nunca havia sido casado. A igreja e o altar estavam decorados com um buquê de flores muito familiar. Era evidente que o noivo estava esperando pela sua futura esposa para caminhar até ele. A noiva era Linda. Ela nunca havia colocado os pés naquela igreja, mas agora estava parada na entrada, usando um véu branco e tremendo de nervosismo.
O casamento entre Linda e o pai adotivo era considerado uma violação grave nas Filipinas. Mas a verdade é que já fazia muito tempo que Joe sentia algo diferente por Linda, desde que ela era apenas uma criança. Ele acreditava que aquele dia chegaria — o dia em que finalmente poderia se casar com ela.
Linda não conseguia encontrar palavras. Tudo estava acontecendo rápido demais. Mas quando viu o olhar apaixonado de Joe, sua mente ficou completamente em branco. O casamento começou a parecer uma coisa totalmente impossível de acontecer. No entanto, quando o oficial perguntou a ela se aceitava Joe como seu marido, ela respondeu… “Sim.”
O casamento se realizou às pressas, sem convidados. Para Joe, aquilo foi o dia mais feliz da vida dele. Enquanto isso, Linda ainda tentava entender o que sentia. As pessoas na rua olhavam para os dois com confusão, até com certo escândalo. Muitos cochichavam por ver uma jovem assim ao lado de um homem bem mais velho.
Joe recebeu uma ligação dizendo:
— Seu irmão está no hospital. Ele está muito mal, venha imediatamente.
Antes mesmo de desligar, Joe pegou a bolsa e saiu correndo, com Linda indo atrás dele. Quando chegaram ao hospital, a expressão dos médicos não era nada boa. O irmão de Joe estava entre a vida e a morte. Linda se alarmou ao ver o marido chorar ao lado do irmão. Ela só queria que a família dele pudesse se recuperar e ficar em paz novamente.
Cansados, eles voltaram para casa. Mal entraram, Linda soltou um grito — um homem desconhecido estava lá dentro, sentado na sala como se fosse dono do lugar.
— Quem é você? — perguntou Linda.
Joe agarrou o homem pela gola da camisa, exigindo respostas. O intruso sorriu friamente:
— Eu sei de tudo. Você acha que posso ser enganado? Eu sei o que vocês dois estão escondendo.
Linda ficou pálida. Mesmo sem entender completamente, seu instinto dizia que aquele homem não estava brincando.
Joe o empurrou para a porta:
— Saia da minha casa agora!
Mas o homem ergueu a mão, mostrando algo que fez o sangue de Joe gelar: um documento.
— Se você continuar me expulsando… eu vou entregar isso à polícia.
Joe congelou. Linda ficou ainda mais assustada.
— Do que ele está falando? — sussurrou ela.
O intruso se inclinou para mais perto, com um sorriso venenoso:
— Ela… não é sua filha adotiva. Ela é… sua filha biológica.
Linda sentiu tudo ao seu redor rodar.
— Isso… isso não pode ser verdade! — gritou ela.