As luzes do estúdio do Vivement dimanche brilhavam com intensidade. Michel Drucker, figura emblemática da televisão francesa há mais de 50 anos, ajustava sua gravata enquanto os assistentes de produção corriam ao seu redor.
A emissão daquele dia era especial. Karim Benzema, o atacante estrela que havia deixado o Real Madrid pelo Al-Ittihad na Arábia Saudita depois de vencer a Bola de Ouro em 2022, tinha aceitado uma entrevista exclusiva — algo raro para um jogador frequentemente descrito como distante da mídia francesa.
“Estamos ao vivo em 2 minutos”, anunciou o diretor no fone de ouvido de Drucker. A tensão era palpável.
Esta entrevista prometia ser diferente das habituais conversas esportivas. Benzema aceitara falar não apenas de futebol, mas também da sua infância em Lyon — um tema que raramente abordava em público. Nos bastidores, comentava-se que essa entrevista poderia marcar uma virada na relação complicada entre o jogador e parte do público francês.

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O público aplaudiu calorosamente quando Karim Benzema entrou no estúdio. Vestido com um elegante terno escuro assinado por um grande estilista francês, cumprimentou Michel Drucker com um aperto de mão firme.
Os dois se acomodaram nas famosas poltronas vermelhas que haviam recebido tantas personalidades marcantes da cultura e do esporte francês.
“Obrigado por estar conosco hoje, Karim”, começou Drucker, com seu sorriso característico que havia tranquilizado gerações de convidados. “Muitos o conhecem como um dos maiores atacantes franceses, mas poucos conhecem o seu percurso antes da glória. É esse Karim que eu gostaria de apresentar aos nossos telespectadores.”
Benzema baixou a cabeça, seus olhos traindo certa apreensão. O céu parisiense, visível pelas grandes janelas do estúdio, escurecia lentamente. Uma chuva fina começava a cair, criando uma atmosfera propícia às confidências.
O som das gotas contra os vidros formava uma melodia discreta que acompanhava o início dessa conversa diferente de todas as outras.
“Cresci em Bron, na periferia de Lyon”, começou Benzema, sua voz mais suave que o habitual. “Era um bairro difícil, mas foi lá que aprendi o verdadeiro valor das coisas. Os prédios dos Terraillons eram o meu universo, a minha realidade diária.”
Michel Drucker escutava atentamente, percebendo que o convidado estava prestes a partilhar muito mais do que uma simples anedota esportiva. O apresentador, experiente, sabia reconhecer esses momentos raros em que uma personalidade se entrega com sinceridade.
“Meus pais são de origem argelina. Meu pai trabalhava duro como operário. Minha mãe cuidava de nós — meus irmãos, minha irmã e eu. Não tínhamos muita coisa, mas tínhamos o essencial. Eles me transmitiram valores fortes: respeito, trabalho, perseverança. Sem esses valores, eu nunca teria chegado onde estou.”
O estúdio estava agora suspenso em suas palavras. As câmeras captavam o rosto de Benzema de vários ângulos, revelando uma expressão raramente vista nesse atleta geralmente tão reservado com a mídia francesa.
“O futebol”, continuou Benzema, “era nossa forma de escape no bairro. Jogávamos no cimento, com traves desenhadas nas paredes. Não precisávamos de mais nada. Às vezes usávamos roupas como traves ou até como bola quando não tínhamos uma. Era paixão pura, sem cálculo. Eu passava horas jogando, até minha mãe gritar da janela pra eu subir pra jantar.”
Um leve sorriso nostálgico surgiu em seu rosto ao mergulhar novamente nas memórias da infância.
“Aos 8 anos entrei no clube de Bron, depois no Olympique Lyonnais. Aos 10, era outro mundo: campos de grama, equipamentos novos, treinadores formados. Mas o que mais me marcou foi a sensação de ter um objetivo concreto. Para um garoto dos Terraillons, isso já era enorme.”
Capítulo 2 – As confissões de um campeão
À medida que a entrevista avançava, a atmosfera no estúdio mudava. Não era mais apenas uma celebridade esportiva diante de um apresentador, mas dois homens em uma conversa profundamente humana.
“O que pouca gente sabe”, continuou Benzema inclinando-se levemente para a frente, “é que vi vários amigos de infância tomarem o caminho errado. Rapazes talentosos — alguns bem melhores do que eu no futebol. No início da adolescência, as tentações são muitas: droga, pequenos tráficos, dinheiro fácil. Isso tudo parece muito mais atraente do que treinar na chuva às 7 da manhã.”
A chuva ficava mais forte do lado de fora, intensificando a emoção. O estúdio parecia congelado numa bolha de silêncio.
“Malik era provavelmente o mais talentoso de nós. Técnica incrível. Podia driblar cinco jogadores sem esforço. Os olheiros de Lyon e Saint-Étienne o acompanhavam como acompanhavam a mim. Mas ele caiu nas drogas. Primeiro traficante, depois consumidor. Hoje, nem sei onde ele está.”
A câmera mostrava os olhos levemente úmidos de Benzema. Suas mãos inquietas denunciavam a dor de recordar.
“Teve também o Rachid, um goleiro excepcional. Cometeu alguns erros, acabou preso aos 17 anos. A carreira terminou antes de começar. E Sofiane, um meio-campista que poderia jogar tranquilamente na Ligue 1. Abandonou o futebol para ajudar a família depois da doença do pai.”
“Cada um tem sua trajetória, seu destino. Às vezes basta um detalhe para ir para um lado ou para o outro.”
“Meu pai sempre dizia: ‘Trabalha duas vezes mais que os outros e irás duas vezes mais longe.’ Eu acordava às 5 para treinar antes da escola. E voltava a jogar até a noite cair. Nos fins de semana, quando meus amigos saíam, eu me obrigava a fazer sessões extras. Não era fácil, mas eu tinha um objetivo: me tornar profissional e tirar minha família da precariedade.”
Michel Drucker colocou a mão no braço de Benzema num gesto paternal.
Seu percurso impunha respeito.
Mas Benzema respondeu com humildade: “Tive sorte. Pais presentes, educadores que acreditaram em mim, e a oportunidade de entrar no centro de formação do Lyon. Sem isso, quem sabe onde eu estaria hoje?”
Ele respirou fundo.
“O mais difícil”, continuou, “é essa sensação de estar sempre sendo testado. Na França, eu sentia que era visto como francês só quando marcava. Quando errava, virava ‘o árabe da periferia’. Muitos jogadores descendentes de imigrantes passam por isso. Temos que provar nossa legitimidade o tempo todo.”
Um silêncio pesado tomou o estúdio.
“É como se o meu uniforme azul fosse emprestado, nunca realmente meu.”
“E como lidou com essa pressão?”, perguntou Drucker.
“Focando no jogo. Com a bola nos pés, não há política, não há polêmica. Só você e o talento. Por isso sempre deixei o futebol falar por mim.”
Capítulo 3 – As lágrimas inesperadas
A entrevista atingiu um nível emocional que ninguém esperava.
“Quando cheguei ao Real Madrid em 2009”, contou Benzema, “foi muito difícil. Nova equipe, novo país, nova língua, e uma pressão enorme. A imprensa espanhola me chamava de ‘o gato’, insinuando que eu era tímido demais. Alguns torcedores já queriam que eu fosse embora.”
“Mas você persistiu”, observou Drucker.
“Sim. Graças a pessoas como Zidane, que acreditou em mim. E também graças à força interior que ganhei crescendo em Bron. Quando você já passou pela dificuldade, as críticas dos jornalistas parecem pequenas.”
Benzema então tocou no ponto mais sensível:
“O pior momento da minha vida foi quando alguns senadores sugeriram que eu perdesse a nacionalidade francesa. Não por um crime grave, não por traição — mas por questões relacionadas ao esporte e à minha reputação. Foi em 2015, no caso Valbuena. Doeu demais.”
Uma lágrima caiu no rosto de Michel Drucker.
“É muito difícil falar sobre isso”, continuou Benzema. “As pessoas precisam entender que atrás dos jogadores existem homens. Não somos máquinas de marcar gols.”
Ele respirou fundo.
“Senti que meu país me abandonava. Disseram que eu não cantava a Marselhesa com entusiasmo suficiente. Reprovaram minhas origens argelinas como se isso fosse incompatível com ser francês.”
“Eu não sou santo. Cometi erros. Mas nunca reneguei quem sou. Minhas raízes argelinas e minha identidade francesa fazem parte de mim. Quando me pedem para escolher, é como se pedissem para amputar parte da minha identidade.”
“Que mensagem gostaria de deixar aos jovens que o assistem?”, perguntou Drucker.
“Que entendam que o valor deles não depende do olhar dos outros. Que devem ter orgulho de quem são, de suas origens, do bairro de onde vêm. O talento não basta; é preciso perseverança. E a identidade deles é uma força, não uma fraqueza.”
Capítulo 4 – Um novo olhar
O estúdio estava mergulhado numa atmosfera íntima.
“Em 50 anos de TV”, disse Michel Drucker emocionado, “raramente fui tão tocado por um testemunho.”
Benzema sorriu, aliviado.
“É difícil ser constantemente julgado por percepções, por preconceitos. Quando eu era pequeno, me viam como esperança do futebol francês. Quando comecei a ter sucesso, virei o símbolo da integração. Mas quando enfrentei dificuldades, questionavam minha lealdade, minha identidade, como se tudo se resumisse ao que eu fazia em campo.”
“Eu sou francês. Sou de origem argelina. Sou muçulmano. Sou jogador de futebol. Sou pai. Tudo isso me compõe. Por que deveria renunciar a uma parte para agradar os outros?”
Ele então falou de sua volta à seleção em 2021, e do gol contra a Espanha.
“Foi como recuperar uma parte de mim.”
A chuva cessava, deixando entrar um raio de sol.
“Hoje, na Arábia Saudita, vivo um novo capítulo. Não é só dinheiro. É cultura nova, desafio novo. Continuo sendo o menino de Bron que ama jogar bola.”
Michel Drucker concluiu:
“Você inspira muita gente, Karim. Muito mais do que imagina.”
Os dois se abraçaram sob aplausos intensos.
O que deveria ser uma simples entrevista esportiva se transformou num testemunho profundo sobre identidade, pertencimento e humanidade.