O caubói esperava ansioso pela noiva por correspondência — mas quem desceu da trilha empoeirada foi uma forasteira armada, carregando segredos mortais e revelações capazes de virar sua vida de cabeça para baixo.

Wade Langston esperou três meses por uma mulher que nunca chegaria. A carta em suas mãos calejadas prometia Margaret, uma professora de modos suaves e cabelo castanho. A que desceu da trilha empoeirada trazia um revólver no quadril e segredos nos olhos — segredos capazes de arruinar tudo o que ele pensava saber sobre confiança. Ela disse o nome certo, mencionou detalhes que só Margaret conheceria e trazia no pescoço o medalhão que Wade enviara como prova de intenção. Mas, quando sorriu, havia algo perigoso por baixo da superfície, um brilho que fez os instintos dele gritarem que aquela mulher já tinha matado antes.

O mais estranho não era a mentira. Era ela saber coisas que Wade jamais escrevera: o corte antigo no ombro esquerdo, o jeito de tomar café, lembranças do passado que não estavam em papel nenhum. Quando os olhos verdes dela o prenderam, ele não sentiu a companhia tranquila que imaginara com Margaret; sentiu o vento de um penhasco empurrando para a borda. Ao pôr do sol daquele primeiro dia, Wade notou sangue fresco na bota dela — ainda úmido. Ao longe, três cavaleiros avançavam com a firmeza de quem vem fazer cobrança. Fosse quem fosse aquela mulher, o problema chegara à sua porta.

Wade pousou a mão no rifle encostado no corrimão, mas a conteve. Se ela o quisesse morto, já teria puxado a arma. A mulher, que se apresentou como Margaret, acompanhou o olhar dele, viu o sangue e esfregou a sola no degrau como quem limpa lama de domingo. O gesto casual dizia mais do que qualquer resposta. No horizonte, os três se destacaram contra a luz. A mulher mudou de postura sem pensar: a mão direita derivou para o cabo do revólver. Pela primeira vez, Wade viu um lampejo de medo naquele rosto.

— Amigos seus? — perguntou ele, a voz neutra.

— Depende do que você chama de amigos — respondeu, medindo palavras como quem mede distância de tiro. — Persistentes, com certeza.

O vizinho mais próximo ficava a vinte e quatro quilômetros. O xerife, a uma eternidade prática. Ali, cada um resolvia os próprios problemas ou morria tentando. Wade apertou o maxilar.

— Quanto tempo?

— Se tivermos sorte, dez minutos. Menos, se rastrearem melhor do que supus.

Em vez de mandá-la embora, Wade entrou na cabana, voltou com o rifle e uma caixa de munição.

— Então é melhor nos preparar.

Ela ergueu as sobrancelhas, surpresa. Ele ainda não sabia o que eles queriam, mas sabia que vinham armados para sua terra. Enquanto tomavam posição, Wade percebeu outra coisa: a mulher se movia pela propriedade como quem já a estudara. Escolheu, sem hesitar, o abrigo atrás do bebedouro, o mesmo ponto que ele levara três anos para descobrir — cobertura boa e campo de visão limpo.

— Você já esteve aqui — disse Wade, instalando-se no canto da cabana.

Ela não negou.

— Mulher sozinha aprende a mapear lugares seguros.

Os cavaleiros se aproximaram o suficiente para mostrar os rostos. O da frente tinha uma cicatriz do ouvido à mandíbula. Quando sorriu, prometeu dor.

— Dixie Hargrove! — gritou o cicatrizado, a voz atravessando o pátio. — Sabemos que está aí. Saia, e talvez deixemos seu amigo vivo.

Wade gelou. “Dixie”, não “Margaret”. Ela enrijeceu, mas sem surpresa. Aquilo estava escrito havia tempo. Ele falou baixo:

— Quantos você já matou, Dixie?

— Menos do que eles. E nunca alguém que não merecesse.

O líder ergueu a mão e parou a cinquenta jardas.

— Podemos fazer fácil ou difícil, Dixie. De um jeito ou de outro, você vem conosco.

— Eu disse em Kansas City, Crenshaw — respondeu ela. — Acabou para mim.

Crenshaw riu, vidro quebrado.

— Ninguém sai da nossa operação. Você sabe demais. E seu amigo aqui também já viu demais.

Wade entendeu: não era apenas perseguir Dixie; era limpar testemunhas. O sangue na bota ganhou outro contorno.

— A verdadeira Margaret não vem — sussurrou Dixie. — Não pode. Está morta. Mataram-na há três dias porque não disse onde me encontrar.

O mundo de Wade virou poeira. Usaram cartas e esperança como isca. A raiva veio limpa, quente, focada. Ele olhou para Dixie e viu as mãos firmes, a decisão crua de protegê-lo apesar de mal conhecê-lo. Verdade ou mentira, aquela mulher morreria lutando, e isso lhe disse o suficiente.

Crenshaw ergueu a arma. Dixie falou rápido:

— Tem mais. Eles roubam gado e culpam tribos nativas para provocar conflito e lucrar com contratos militares. Vi tudo. Tenho documentos.

Wade sentiu gelo na coluna. Aquilo explicava o tamanho da caçada. Crenshaw se aproximou mais um passo.

— Última chance, Dixie. Saia, e é rápido.

Wade saiu de trás da cobertura com o rifle no peito do cicatrizado.

— Esta é a minha terra. Vocês estão invadindo.

— Olha só, um herói — zombou Crenshaw. — Garotos, nosso caubói quer salvar a testemunha.

— Vocês mataram uma inocente — disse Wade, dedo no gatilho. — Assassinos não são bem-vindos aqui.

— Você não sabe onde está se metendo — devolveu Crenshaw. — Essa mulher tem sangue nas mãos. Mais do que pensa. Conte a ele sobre Denver, Dixie.

Ela prendeu a respiração, mas não abaixou a arma.

— Há coisas que não se desfazem. Ainda assim, tento fazer o certo.

O fio do impasse esticou até quase romper. Então veio outro som: muitos cascos pela trilha leste. Wade temeu reforços. Dixie, pela primeira vez, sorriu.

— No horário.

Os tiros estalaram do leste. Os recém-chegados ignoraram Wade e Dixie e abriram fogo sobre os homens de Crenshaw com precisão de quem conhecia o alvo. As estrelas nas lapelas brilharam.

— Marechais federais — explicou Dixie, sem tirar os olhos de Crenshaw. — Avisei da operação do gado antes de vir. Rastreiam esses homens há semanas.

Crenshaw entendeu a armadilha tarde demais. Com fúria desesperada, avançou mirando Wade.

— Se eu cair, levo alguém comigo!

Dixie se jogou na frente no mesmo instante do disparo. A bala pegou de raspão na lateral dela, girou o corpo, mas o tiro dela atravessou o peito de Crenshaw. O cicatrizado ajoelhou e tombou.

O pátio silenciou, salvo a respiração difícil de Dixie. Wade largou o rifle, pressionou a ferida com as duas mãos.

— Por que fez isso?

— Porque você escolheu ficar do meu lado sem saber tudo — sussurrou, pálida e lúcida.

O chefe dos agentes desmontou. O distintivo dizia: Deputy Marshal Samuel Brooks. Olhou para Dixie com respeito antigo.

— Senhorita Hargrove, foi um risco dos infernos.

— Precisava tirá-los de perto de inocentes — respondeu ela, mordendo a dor.

Brooks se voltou para Wade.

— O nome é Langston? Ela disse que você ajudaria.

Wade sentiu o chão mudar sob os pés.

— Você planejou… isto tudo?

— Não tudo — disse Dixie, apertando os dedos na mão dele. — Vim para afastá-los. Quando vi quem você é, soube que podia confiar a verdade.

Brooks completou:

— A Senhorita Hargrove trabalha conosco há seis meses. Reuniu evidências contra ladrões de gado que provocavam conflitos para lucrar. Arriscou a vida para expor gente grande.

— O sangue na sua bota… — murmurou Wade.

— De Margaret — respondeu Dixie, baixa. — Cheguei tarde demais para salvá-la, mas não para enterrá-la como merecia.

Antes que o alívio assentasse, Brooks retornou à porta, sombrio.

— Faltam dois do bando. Sabem onde encontrar vocês.

Levaram Dixie para a cama de Wade. A bala não pegara órgão vital, mas pedia curativo firme. Ele limpou a ferida com mãos trêmulas. Ela o observou.

— Não vou morrer disso. Já passei por pior.

— Não me consola — disse Wade, amarrando o curativo. — Quantas vezes?

— Três. A primeira me ensinou a abaixar a cabeça. A segunda, em quem confiar. Esta me ensinou por quem vale a pena tomar um tiro.

O vidro da cozinha estourou. Um pedra com bilhete: “A mulher pela nossa fuga. Amanhecer na Pedra do Diabo. Venham sozinhos ou começamos a matar rancheiros.” Wade conhecia o lugar: cobertura perfeita para emboscada.

— Não vão cumprir troca nenhuma — disse.

Dixie tentou se erguer.

— Isso precisa acabar. Muita gente em risco.

— Você não vai a lugar nenhum assim — cortou Wade.

— Então o que sugere? — perguntou Brooks.

Wade olhou o terreno, desenhou a rota na cabeça.

— Há uma picada antiga pelo leito do riacho, pelo sul. Dá para chegar por trás da Pedra. Mas eles precisam acreditar que Dixie vai.

— Usá-la de isca — disse ela, entre raiva e compreensão.

— Usá-la para não morrer mais ninguém — corrigiu Wade.

Ele revelou mais uma peça:

— Conheço Parker. Trabalhou para um vizinho e sumiu com metade dos cavalos. Guarda uma cicatriz na mão esquerda. Vai se posicionar para fugir, provavelmente no lado norte com os animais.

Brooks hesitou, mas assentiu. O plano ganhava forma quando novos cascos cercaram a cabana. Mais agentes federais, vindos do escritório territorial. O comandante — Marshal Thompson — ouviu em silêncio, avaliou rápido.

— Cercamos a Pedra do Diabo por todos os lados. Sem negociação, sem risco a civis.

— Parker não se rende fácil — avisou Wade. — Desesperado faz loucura.

— Então acabamos rápido — disse Thompson. — Senhorita Hargrove, já fez demais. Descanse.

— Eles mataram Margaret porque me seguiam — respondeu Dixie. — Eu vou.

— Se ela for, eu vou — disse Wade. — Conheço o terreno. Vão precisar disso.

Thompson os mediu e cedeu.

— Sem heroísmo desnecessário.

A cavalgada levou meia hora. Os grupos fecharam a malha. Wade guiou Dixie e Brooks pela picada do riacho. Ao vencer a crista, Parker e Voss estavam onde ele previra: fortes contra frente, vulneráveis por trás. Thompson anunciou pelo porta-voz:

— Cercados por marechais federais! Armas no chão!

A resposta foi chumbo batendo pedra. O tiroteio durou pouco. Parker caiu nos primeiros disparos. Voss largou o rifle quando percebeu o cerco sem saída.

Quando a fumaça dissipou, Wade olhou para Dixie e viu algo novo: paz. O peso que a empurrara por territórios começava a sair.

— Acabou — disse ela.

— Esta parte, sim — respondeu Wade. — Agora vemos o que vem depois.

Três semanas depois, Wade a vigiava cultivar um canteiro atrás da cabana. A ferida cicatrizada virara risco fino. Os marechais partiram com Voss algemado e cartas de louvor. A operação de gado se desmanchou em três territórios; oficiais e um juiz territorial foram presos; as manobras para culpar tribos foram expostas.

Toda manhã, Wade acordava com o mesmo temor: e se ela não estivesse mais ali? Nada a prendia além da escolha.

— Você está pensando alto de novo — disse Dixie, sem se virar.

— O Deputy Marshal Brooks escreveu.

— Eu li. Ofereceu vaga permanente. Bom salário. Serviço com propósito.

— É o que você sempre quis.

— Era — disse ela, aproximando-se até ele sentir o cheiro do sabonete de lavanda. — Descobri outra coisa que não sabia que procurava.

— O quê?

— Casa.

A palavra ficou entre eles, simples e enorme. Ela trabalhou as mãos dele entre as suas, as calosidades se reconhecendo.

— Margaret estava certa sobre você. Um homem bom, construindo algo honesto. Quero ajudar, se você quiser.

Wade segurou o rosto dela.

— Tem certeza? Não tem glamour. É cerca, gado e entardeceres quietos.

— Já tive aventura para três vidas. Agora quero o que é real.

Ele a beijou. Quando se separaram, havia um contentamento novo no rosto dela.

— E agora? — perguntou ele.

— Escrevemos ao Brooks agradecendo e recusando. Depois terminamos a horta e consertamos a cerca do córrego. E aprendemos a ser gente comum, com vida comum.

Seis meses depois, casaram-se numa cerimônia pequena, com o Deputy Marshal Samuel Brooks e três famílias vizinhas. Dixie manteve o sobrenome Langston e a terra, e também as competências: ajudou a criar um refúgio territorial para mulheres em perigo. Juntos, construíram algo ordinário e extraordinário: uma vida feita de escolhas diárias, confiança e a certeza de que, às vezes, o melhor chega do jeito mais improvável.

Wade nunca teve sua noiva por correspondência. Teve algo muito maior: uma parceira que o escolheu sabendo exatamente quem ele era. E Dixie encontrou o que não sabia que buscava: um lugar onde pertencer e alguém que a valorizasse inclusive pelas cicatrizes que provavam por que e por quem ela lutou.

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